Texto da Revista “Sábado Popular” (suplemento do jornal Diário Popular) nº 72, de 7 de Dezembro de 1985
História e Teoria BD
Por Carlos Gonçalves, numa colaboração do Clube Português de Banda Desenhada
Um «herói» chamado TEX WILLER
Tex Willer continua ainda a ser um dos mais famosos «heróis» da Banda Desenhada, no campo do «western», quer a nível da Itália quer mesmo internacionalmente. Com cerca de 600 000 exemplares de tiragem nas suas edições italianas, fora a republicação de números antigos, é traduzido em: francês, espanhol, grego, dinamarquês, sueco, jugoslavo, norueguês, finlandês e holandês. Quanto à língua inglesa não existem edições, mas, pelo menos na portuguesa, sim. Encontra-se em publicação uma edição brasileira, que há já alguns anos vai surgindo nos escaparates das livrarias e bancas de jornais portugueses. Também no Brasil se fazem reedições, que vão no n.º 115. A normal, tem o n.º 187 publicado. Existe por detrás desta personagem também uma grande linha de produtos: bonecos, jogos, espingardas e «T-shirts», com a sua figura. Alguns produtores já tentaram adquirir os direitos para a adaptação desta história ao cinema, mas sem sucesso.
O primeiro número de Tex surgiu em Itália, no dia 30 de Setembro de 1948, com uma tiragem de 45 000 exemplares. Era semanal e em formato diferente do actual, com 32 páginas. As histórias eram de continuação, num estilo de revista que já não se encontra hoje. Em Portugal, este formato nunca foi adaptado. As páginas tinham as dimensões de uma única tira e a brochura podia ser guardada no bolso.
Em Itália haviam algumas revistas deste género, que acabaram por ser publicadas no Brasil: «Xuxá» («Sciusciá») e «O Pequeno Xerife» («Il Picollo Sceriffo»), das quais falaremos oportunamente.
Tex é hoje o único sobrevivente de todas estas personagens, dos quais, talvez, o melhor tenha sido «Nat dos Sete Mares» («Nat il Grumete»), cujas aventuras chegaram a alcançar um excelente nível de qualidade.
Tex é escrito por Giovanni Luigi Bonelli e desenhado por Aurelio Galleppini (Galep), na maior parte das suas aventuras, embora hoje sejam já vários os desenhadores que se dedicam à série, de modo a poder cumprir com as necessidades editoriais: Guglielmo Letteri, Francisco Gamba, Mario Ugerri, Giovanni Ticci, Ferdinando Fusco, Erio Nicolò, Virgilio Muzzi (embora neste último o rosto do «herói» seja desenhado por Galleppini), Guido Zamperoni, Lino Jeva e Giolitti.
É difícil saber o «porquê» do sucesso de Tex… talvez pela sua simpatia, pela falta de preconceitos (mesmo raciais), pelo seu alto teor de violência, que chega a ultrapassar os antigos filmes do Oeste, realizados por directores italianos, pela qualidade dos seus enredos, pelos traços dos artistas que o desenham, etc.
O criador de Tex, apesar de ser um grande admirador do Oeste americano, nunca se deslocou à América. Tem hoje mais de 70 anos (precisamente 75) e possui uma vasta biblioteca sobre o assunto, que lhe serve de base para a criação de todas as histórias do seu «herói».
Bonelli prepara o roteiro para Tex da seguinte forma: além do respectivo texto, cada desenhador recebe também a sequência das vinhetas, já esboçadas, reduzindo o trabalho do artista. Embora possa limitar um pouco a criação do desenhador, teremos que considerar que a unidade gráfico-visual de cada prancha será maior, já que a série tem sido desenhada por vários autores, ao longo da sua existência.
Tex é um homem rude, que não abdica da violência pura, quando precisa de conseguir qualquer confissão a um dos bandidos e desde que esta possa vir a salvar outras vidas. Possui um sangue-frio extraordinário e enfrenta, sem pestanejar, as maiores e mais perigosas situações, com um sorriso cínico nos lábios. Para dar maior veracidade aos enredos, ele e os seus amigos são às vezes feridos. Nas suas aventuras é ajudado por três companheiros – o «mito» Kit Carson, seu filho Kit Willer e o índio Jack Tigre. Tex percorre todos os Estados Unidos, enfrentando na sua procura de justiça os mais variados criminosos, quer os comuns quer os sobrenaturais. Destes são exemplos típicos: Mefisto e Yama, seu filho. O Bruxo Mouro é hoje seu amigo.
As suas histórias, às vezes chegam a ter cerca de 300 pranchas. Mas são excepcionalmente bem escritas, criando no leitor a ânsia de «devorar», cada vez mais depressa, as páginas que lhe vão passando pelos olhos. Como factor curioso, recordamos só que as primeiras páginas de Tex chegaram a ter 8/9 desenhos (devido ao seu formato inicial, por tira) e hoje possuem unicamente 5/6 vinhetas.
Tex era um bandido que acabou por se regenerar, tornando-se «ranger» do Exército americano. Mais tarde, ao casar-se com Lírio Branco, que lhe dá um filho antes de morrer, tornando-se Águia da Noite, chefiando então a nação dos índios Navajos.
Ainda que acusado de alguma violência, Tex vê-se obrigado muitas vezes a usá-la no contexto social onde se encontra inserido, pois acaba por descobrir que onde há lei, normalmente ela protege o forte e o poderoso, em detrimento do fraco. E este, mesmo às vezes com a sua coragem, não consegue ultrapassar as situações que lhe criam. É então que aparece Tex, que tenta preservar o direito do cidadão comum, no emaranhado do sistema burocrático e governamental.
Bonelli diz-nos a respeito da sua personagem que «em Tex prevalece um eficaz sentido de justiça, que aprofunda suas raízes num espírito libertador, originado pelo respeito aos valores humanos e às aspirações de o homem viver livremente, ao que se junta um natural senso de justiça, para cada violação destes valores, seja por obra de um indivíduo, seja por obra do poder público».
Bonelli nasceu em Milão, em 22 de Dezembro de 1908. Começou a escrever poesias para a revista «Il Corrieri dei Piccoli», colaborando a seguir para o «Giornale Ilustrato di Voaggi», editado por Lonzagno. Dirigiu uma série de revistas de Banda Desenhada importantes, editadas pela Saev, de Milão, onde colaborou também como argumentista: «Jumbo», «Rintintin», «Primarosa», «L’Audace», «Pinocchio», «Robinson» e «Vittorioso».
Bonelli também chegou a ser pugilista amador. Com a passagem de «L’Audace» para a Mondadori, Bonelli também mudou a sua colaboração, tendo em 1940 adquirido os direitos daquele título. Depois da guerra, associa-se ao editor genovês, Giovanni de Leo, com o qual lançou «Cow-Boy», tendo divulgado as personagens francesas Fantax e Robin Wood, nas suas páginas.
Várias são as personagens que criou durante a sua vida de argumentista: Ipnos (1947), Tex (1948), La Patuglia Degli Senza Paura (1948), Plutos (1949), Yorga (1949), Il Cavaliere Nero (1954), Yuma Kid (1954), I Tre Bili (1955), El Kid (1955), David Crockett ou Big Boy (1956), Hondo (1958) e Kociss (1958). Em 1962 retoma Un Ragazzo del Farwest, criando a seguir Judok, com desenhos de Ticci, e Lobo Kid.
Mais recentemente, retomará Yuma Kid, mas a personagem a quem dará mais atenção será Tex. Ele baptizou a sua personagem inicialmente como Tex Killer, mas devido à censura, resolveu mudá-lo para Tex Willer. Bonelli confessa que criou o seu «herói», inspirando-se na leitura de Jack London e Zane Grey e no estilo dos filmes de John Ford.
Foi Galleppini quem criou o verdadeiro rosto de Tex, mas com o êxito da história, viu-se obrigado a escolher um ajudante, pois já não conseguia cumprir com os prazos necessários para cada edição. O primeiro foi Guido Zamperoni que, entre 1950 e 1951, esboçou a lápis, cerca de 70 pranchas. Mais tarde foi a vez de Mario Uggeri, que desenhou centenas de páginas.
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Posteriormente seria a vez de Francisco Gamba, que passou a desenhar as histórias na íntegra. Jeva também colaborou com 50 pranchas, nos primeiros anos da década de 50. Nos anos 60, com o crescimento da segunda série de Tex Gigante, Galep não conseguia já ter condições materiais de aguentar o ritmo intenso da produção, passando o nosso «herói» a ser desenhado, ao mesmo tempo e por turnos, por vários artistas. Virgilio Muzzi, em Abril de 1960, foi um deles.
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Em Julho de 1964 foi a vez de Erio Nicolò, em «Drama na Pradaria». Em Dezembro do mesmo ano, Guglielmo Leterri inicia a sua actividade para o «herói».
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Em Janeiro de 1966 temos Giovanni Ticci. Ferdinando Fusco aprofundou-se na execução da personagem, conseguindo fazer-se admirar pelas cenas de acção e pelos efeitos claros-escuros que produz, com o seu trabalho intenso e de excelente nível artístico..
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Copyright: © 1985 Sábado Popular; Carlos Gonçalves
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