Texto da secção Banda Desenhada de 29/04/2022
F. Cleto e Pina
Roberto Diso: “Mister No herdou algumas das minhas características físicas e psicológicas”
* Desenhador italiano teve exposição patente em Anadia neste último fim de semana, mas presença foi cancelada à última da hora.
Natural de Roma onde nasceu há exatos 90 anos, Roberto Diso é um veterano dos quadradinhos italianos e um dos autores mais amados pelos apreciadores dos fumetti Bonelli, as edições populares de BD italiana protagonizadas por Tex, Zagor, Martin Mystère, Dylan Dog ou… Mister No.
A este último, a quem dedicou grande parte da sua carreira, legou “os meus cabelos de então, que eram escuros com as têmporas grisalhas. Foi o próprio Sergio Bonelli que me pediu para destacar esse detalhe em Mister No” revelou o autor em entrevista exclusiva ao Jornal de Notícias, realizada a pretexto da exposição que tem patente na 7.ª Mostra do Clube Tex Portugal, que decorreu nos dias 30 de Abril e 1 de Maio, no Museu do Vinho Bairrada, em Anadia.
Forçado a cancelar a sua presença no evento por razões pessoais, alheias à sua vontade, o desenhador confidenciou que, para além das parecenças físicas cada vez maiores entre ele o ex-piloto americano da II Guerra Mundial que vive as suas aventuras na Amazónia, este último também assumiu “algumas características psicológicas que eu e Sergio tínhamos em comum”.
Antes de chegar à Sergio Bonelli Editore, Roberto Diso, após uma passagem pela Faculdade de Arquitetura, iniciou-se na BD em 1954, na revista “Il Vittorioso”, trabalhando igualmente para a editora britânica Fleetway, como fizeram o seu compatriota Hugo Pratt ou o português Vítor Péon, entre muitos outros desenhadores da época. A sua carreira passou igualmente por França e Alemanha, até que, em 1974 conheceu o editor italiano Sergio Bonelli, com quem estabeleceu uma amizade forte e duradoura e com quem passou a trabalhar.
Ao fim de pouco tempo estava a desenhar Mister No, tendo assumido igualmente as capas das revistas mais tarde. Foram tantas as histórias desta personagem a que deu vida, que não consegue destacar nenhuma em especial, “porque haveria mais de uma e a resposta seria longa”. Mas entre os livros que desenhou, aproveita para evocar “Mohican”, “um romance romance gráfico de 2010, com argumento de Paolo Morales”, por se tratar de “uma história com personagens intrigantes, possuidoras de várias facetas psicológicas e que atuam em territórios diversos”.
E justifica com o facto de isso “ter permitido abordar graficamente ambientes sempre diversificados, sem um momento sequer de aborrecimento, o que por vezes pode ocorrer quando os protagonistas permanecem no mesmo cenário ao longo de muitas pranchas”. Não esconde que repetição inerente à profissão de desenhador pontualmente “provocou algum cansaço”, mas “nunca se tornou um pesadelo”.
Olhando para quase 70 anos a fazer banda desenhada, Diso lamenta “não ter pintado tantos quadros quanto gostaria” bem como não ter “podido explorar mais a personagem de “Rodo, o Cavaleiro”, um projeto mais pessoal “para quem fiz argumento e desenhos”.
Sempre para a Sergio Bonelli Editore, desenhou aventuras de personagens tão diferentes como Volto Nascosto, Dragonero, Nathan Never ou o próprio Tex, dentre estes o seu “favorito, naturalmente”. E explica porquê: “isso deve-se, sobretudo, ao facto de gostar imenso de desenhar cavalos e cenários de western” e, sem dúvida, Tex é a série ideal para isso.
Apesar da idade, o final de 2021 ficou marcado pelo regresso ao “seu” Mister No, em “Regalo di Natale”, uma história escrita por Luigi Mignacco, em que o protagonista, em plena quadra natalícia, tem de se embrenhar na selva amazónica para encontrar um jovem desaparecido.
Senhor de um desenho realista, ligeiramente caricatural, dinâmico e facilmente identificável, Roberto Diso deixa um conselho aos aspirantes a autores da Sergio Bonelli Editore: “Dedicar toda a atenção possível à anatomia de seres humanos e de animais para entender bem como se movem e também às expressões faciais de homens e mulheres, muito importantes porque transmitem emoções”.
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A 7.ª Mostra do Clube Tex Portugal, patente em Anadia no fim-de-semana passado, após uma interrupção de dois anos devido à pandemia da Covid-19, apresentou exposições de Laura Zuccheri e Roberto Diso, autores dos cartazes do evento, e o programa incluiu conversas com a autora, sessões de autógrafos e a apresentação dos livros “Tex: Justiça em Corpus Christi”, de Mauro Boselli e Corrado Mastantuono, e “Rattlesnake”, do português João Amaral.
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