Por Sandro Palmas*
Nascido em Roma em 1955, Massimo Rotundo apresenta-se perante nós como um artista eclético. Classificamo-lo como ilustrador para o teatro e para o cinema, fundador e docente da prestigiada Scuola Romana del Fumetto e, obviamente, como incomparável desenhador de banda desenhada e capista. O desenho é para si uma paixão inata e cultivada ao longo dos anos com o rigor absoluto do trabalho.
Recentemente, os leitores de língua portuguesa tiveram oportunidade de o descobrir através das páginas da excelente e luxuosa edição de Tempestade sobre Galveston, editada pela Polvo, o trigésimo Speciale de Tex, com texto de Pasquale Ruju, originalmente publicado em Itália em junho de 2015.
Mas vamos por ordem cronológica. Depois de ter concluído os estudos académicos de Belas Artes, o desenhador dá os seus primeiros passos, experimentando no estúdio de Mangiarano os vários meios da animação, do desenho satírico e da pintura. Se no início se manifesta em si uma compreensível indecisão, em 1978, com a primeira colaboração com a Eura Editoriale, a banda desenhada já prevalecia sobre a sátira e a pintura, artes com as quais, no entanto, o artista continuará ainda por vários anos a dividir-se (ainda hoje, Massimo Rotundo é um apreciado pintor que, curiosamente, assina as suas obras com o pseudónimo de Max Grecoriaz). O semanário Lancio Story representa para si um verdadeiro território que lhe vai permitir desenvolver a sua arte e encontrar um estilo, mas esta colaboração teve também o mérito de o aproximar, pela primeira vez, ao género western, quando realizou esboços para uma história, posteriormente passada a tinta por Saudelli.
Os anos oitenta e noventa, que o separam da primeira colaboração com a Sergio Bonelli Editore, são um período estimulante e experimental, extremamente rico em colaborações, como por exemplo em revistas prestigiadas como L’Eternauta e Orient Express, ou as francesas Heavy Metal e L’Echo des Savanes. Se Massimo Rotundo é um dos desenhadores mais apreciados no mercado francófono, também em Itália não faltam os elogios ao seu trabalho, o que lhe permitiu, por exemplo em 1990, obter merecidamente o ambicionado prémio Yellow Kid como melhor desenhador italiano.
E é no final dos anos noventa que recebe a chamada de Maria Baitelli da Sergio Bonelli Editore para desenhar o primeiro álbum da nova série pós-apocalíptica Brendon, da qual realizará também as capas a partir do número 45. Sucessivamente, veremos o desenhador a trabalhar também nas capas das séries de Gianfranco Manfredi Volto Nascosto e Shangai Devil, construindo e caraterizando também as respetivas personagens.
No Outono de 2012 chega finalmente a oportunidade para desenhar o Speciale Tempesta su Galveston. Marcheselli contacta Massimo Rotundo, que recentemente tinha feito as capas das reedições de Il Piccolo Ranger. O western é um género com o qual o autor tem pouca confiança e apenas a experiência adquirida com as edições If, que editaram as reedições da gloriosa personagem nascida em 1958 do lápis de Andrea Lavezzolo, permite a Rotundo enfrentar com mais serenidade as pranchas de Águia da Noite.
Para Massimo Rotundo, Tex é um companheiro de viagem desde há muito tempo, quando começou a ler as suas aventuras com cerca de doze anos de idade, quando Águia da Noite começava a tornar-se no fumetto mais popular nas famílias italianas e não só. As aventuras escritas por Gianluigi Bonelli (e mais tarde por Claudio Nizzi), recordam-lhe o tão amado Emílio Salgari, um dos mais populares escritores italianos de aventuras. As histórias de Giovanni Ticci, como Giubbe Rosse ou Cheyennes, permanecem ainda como as suas preferidas. E é com o desenhador de Siena, tal como com o imprescindível Claudio Villa, que Rotundo vai documentar-se.
O resultado é sem dúvida original, com um Tex desenhado de instinto, sem insistir muito no tratamento, com os olhos cerrados, muitas vezes parecem fissuras, e um queixo quadrado, estereótipo da beleza masculina, cujos traços, nostalgicamente, recordam o Tex dos seus primeiros anos, visivelmente com o estilo de Virgilio Muzzi. Por outro lado, a personagem de Carson (os outros dois pards estão ausentes nesta aventura) recorda em certas passagens a de Francesco Gamba, outro dos históricos colaboradores de Aurelio Galleppini, um autor com quem Rotundo teve que se confrontar ao redesenhar as capas de Il Piccolo Ranger. Em ambos os casos, os pards são representados como dois colossos! Se bem que em termos gerais permaneça uma caraterística mais ou menos específica das personagens construídas pelo autor, a sua imponência é certamente um dos aspetos mais importantes a sublinhar na caraterização dada por Rotundo aos dois inseparáveis amigos.
Desenhar Tex também significa ilustrar o oeste. Não apenas as ilustrações no papel, como também o “celulóide”, fornecem ao desenhador o material necessário para trabalhar. Enquanto realiza as pranchas da aventura, a grande cultura cinematográfica de Rotundo permite-lhe atenuar o pouco à vontade com o western. Ao delinear as personagens, o desenhador inspira-se livremente nas faces de grandes nomes do cinema. O coronel Patrick Woodlord recorda Orion Wells, a sua criada e amante negra Clementine assemelha-se a Josephine Baker, a frágil, mas enérgica Eleanor Hood, tem os traços de Vívian Leigh. Não há como negar, todos eles grandes nomes de estrelas de cinema e das tiras.
Enquanto apaixonado pelos grandes e amplos espaços abertos, por exemplo aqueles que são apresentados no belíssimo filme Dança com Lobos, Rotundo teve, no entanto, que confrontar-se com os ambientes essencialmente citadinos deste trigésimo Speciale. Nesta prestigiada coleção, não foi por acaso que lhe agradou sobretudo Patagónia, indiscutível obra-prima de Mauro Boselli e Pasquale Frisenda. Ao escrever para si o texto de Tempesta su Galveston, Pasquale Ruju não parece à primeira vista ter ido ao encontro da predisposição natural do desenhador. Para esta aventura, o argumentista sardenho escolheu contar, do ponto de vista histórico, a manutenção da escravidão nos estados do sul após o final da Guerra de Secessão. Ambientada na cidade costeira de Galveston, a história também ilustra a catástrofe causada pelo furacão que se abateu na costa do Texas em 1900, o que permitiu a Rotundo provar toda a sua arte em ilustrar a dramática devastação provocada pela natureza enfurecida. Tudo somado, pouco espaço é deixado para as cenas em campo aberto, que se reduzem às que são ambientadas nas plantações ou mesmo para as que são representadas nas páginas finais, que decorrem numa zona árida e desértica e onde a história encontra o seu dramático e rápido epílogo.
Ao longo das páginas desta história, não se pode deixar de notar o extremo cuidado de Massimo Rotundo na reconstituição histórica da cidade de Galveston, com os seus típicos edifícios, a mal afamada zona portuária, os caminhos que a atravessam e que parecem esconder na sombra todo o tipo de ameaça iminente. Mesmo os interiores, estatisticamente um dos ambientes que os desenhadores suportam com mais dificuldade, são extremamente cuidados. Em particular, não escapa a sua predileção por ambientes mais espaçosos, ricos em detalhes arquiteturais e sobretudo ricos em mobiliário que já não se usa, sinal de uma procura contínua de documentação e de um gosto refinado do artista pela composição da prancha, que, contudo, mantém-se sempre airosa e brilhante.
Massimo Rotundo termina este Speciale em abril de 2015, justamente em tempo útil para a sua publicação. Os prazos de trabalho são respeitados, com cerca de uma dezena de páginas realizadas por mês. O autor confia num planeamento preciso e numa documentação, a qual, se a definirmos como maníaca, é pouco. O seu estilo mantém-se realista, mas não um realismo obsessivo, o desenhador prefere a linha clara, um desenho de traço sinuoso e sempre polido, nunca pesado, muitas vezes apenas mencionado, quase a querer sugerir antes de contar, um traço que não pode deixar de ser apreciado pelos leitores de Tex.
Que Massimo Rotundo tenha conseguido atingir os seus objetivos, disso é prova o facto de ter sido recentemente chamado para a série mensal de Tex, devendo ser publicada uma nova aventura, por si desenhada, dentro de aproximadamente um ano, com uma nova história de 330 páginas, escrita desta vez por Gianfranco Manfredi, autor com quem já colaborou no passado, como acima referido. A história, provisoriamente intitulada Sulle rive del Mississipi, será uma aventura fluvial que decorre no Louisiana e que certamente todos nós leitores de Tex estaremos ansiosos em ler.
* Texto de Sandro Palmas publicado originalmente na Revista nº 6 do Clube Tex Portugal, de Junho de 2017.
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