Por Rui Cunha (texto) e Margarida Cunha (fotografias)
Quantas vezes é que já se ouviu, em inúmeros eventos de arte, a frase “Uma imagem vale mais que mil palavras”? Muitas, certamente! E também, principalmente na Banda Desenhada, conhecida como a Nona Arte, esta frase adquire, muitas vezes, tal como na Fotografia, um destaque, assaz importante.
Vem esta frase a propósito dum momento que acontece na história “Retorno a Culver City” onde Tex Willer, o Ranger do Texas mais famoso do oeste, na companhia de seu filho Kit, num regresso ao seu passado, contempla as campas de seus pais (pág .30 e 31). Trata-se duma sucessão de quadros onde não há um único balão de diálogo (a não ser uma breve frase que Tex pronuncia no primeiro quadro da página 31), apenas um silêncio que se repente nos quadros subsequentes da referida página, como que para não interromper aquele momento de respeito e saudade que nos é transmitido pelo desenho, também ele respeitoso, de Fabio Civitelli.
Em “Retorno a Culver City”, Tex é chamado pelo Juiz Harvey T. Henderson, de San Antonio, no Texas, para ajudar numa situação em que, nas próprias palavras do magistrado, “está enrascado e que só Tex pode resolver”. O Ranger acede e vai ao encontro do Juiz que lhe pede para encontrar o seu filho adoptivo que se encontra preso em Culver City por tentativa de assassinato. Para o Juiz, que quer provar a inocência do filho mas não o pode fazer porque se encontra doente às portas da morte, será uma espécie de última vontade vê-lo e abraçá-lo. Para Tex será um regresso ao passado já que foi lá que viveu parte da sua infância e juventude e foi em Culver City que Sam, o seu irmão, foi assassinado. O Ranger aceita a missão e parte com o seu filho, Kit.
História originalmente publicada em Itália nos números 511 e 512 (Maio/Junho de 2003) com o título de “Ritorno a Culver City” e no Brasil, pela Mythos Editora, no “Almanaque Tex nº25” (Fevereiro de 2005). Escrita por Claudio Nizzi e desenhada por Fabio Civitelli, onde, uma vez mais, o passado do Ranger é referido e esmiuçado porque não se trata do passado de um qualquer cowboy, mas sim de um Ranger do Texas e esse mesmo passado serve, em alguns momentos, como mote para a acção surgir como solução para resolver determinado problema. Sendo os dois autores nomes de peso no mundo de Tex e dentro da Editora Bonelli, cedo se percebe que estamos prestes a iniciar mais uma viagem dentro dum universo aventureiro único, criado em 1948 por G. L. Bonelli e Aurelio Galleppini.
Aventura feita de memórias, para as quais somos transportados aos primórdios de Tex ainda antes deste se tornar no Ranger famoso, no início quando enfrentou e desmantelou sozinho o poder na cidade de um bando de pistoleiros chefiados por Tom Rebo que lhe tinham assassinado o irmão. O princípio da lenda em que Tex se havia de tornar.
O argumento de Nizzi, além de estar muito bem escrito e bem estruturado, com princípio, meio e fim,assume uma qualidade quase operática, onde não faltam homenagens mais ou menos discretas, outras descaradas, aos westerns clássicos da Sétima Arte como é referido na página nº226 por Júlio Schneider, habitual colaborador das edições da Bonelli, que terão certamente feito as delícias de Nizzi e Civitelli, como fizeram (e ainda fazem) as nossas e que nunca é demais referir como “Aconteceu no Oeste” (1968), “Duelo de Fogo” (1958), “A Quadrilha Selvagem” (1969), “Tombstone” (1993). O mais interessante disto tudo é tentar encontrar essas (e outras) referências no meio da história, a que a arte de Civitelli se encarrega de dar forma em magnificas sequências como a já supracitada sequência; ou aquela que começa no último quadro da página 150 (o grande plano da diligência a ser perseguida pelos bandidos, melhor demonstração da verdadeira paixão pelo oeste não se consegue mostrar!) e que só termina na página 181; ou todas as sequências de tiroteio nocturno (Civitelli é um verdadeiro mestre na criação destas cenas), a que começa na página 86 e se prolonga até à página 109, ou ainda aquela que começa na página 196 e continua quase até ao final da história e que culmina naquele que será talvez o melhor momento de toda a aventura: o primeiro quadro da página 213, é tão perfeito, tão pormenorizado que mais parece que estamos perante uma fotografia a preto-e-branco, o impacto do desenho das silhuetas no chão é tão grande que a nossa atenção é logo desviada para aí ainda antes de nos apercebermos da grandeza daquele momento em termos de arte, é caso para se dizer que quem desenha, desenha! (parabéns a Fabio Civitelli por nos presentear com tão belos desenhos).
As páginas atrás referidas são momentos de acção contínua e movimentada como se de um filme se tratasse. Algumas páginas antes tínhamos assistido, mais uma vez, a mais um momento da grandeza de Tex, enquanto Ranger: uma das razões que o tornaram numa lenda do oeste (último quando da página 192) e o seu senso de justiça, quando coloca ao peito o distintivo de Ranger do Texas (primeiro quadro da página 193), são dois momentos que importa igualmente reter ou não estivéssemos a falar sobre uma aventura de Tex.
O único senão nesta magnifica (mais uma!) aventura do Ranger mais famoso do oeste, na minha (modesta) opinião prende-se com a capa da edição, não me parece (e digo-o do ponto de vista de quem nada percebe de desenho) das melhores escolhas para uma aventura de Tex.
Li algures que a concepção das capas é feita a partir duma qualquer cena (quadro) da aventura e que depois é trabalhada com grande mestria e saber por Claudio Villa, desde o número 400 da edição italiana. Aqui, pareceu-me que a escolha não foi a melhor e uma aventura deste calibre merecia uma capa melhor (e dentro da aventura existem cenas tão boas que dariam uma excelente capa!). Esta escolha (e não estou sequer a pôr em dúvida a qualidade do desenho, nem me atreveria a tal!), parece-me desarticulada da narrativa, simplesmente banal, uma capa como já vimos em tantas outras histórias texianas, mas que nesta aventura, pouco terá a ver com ela. Foi pena.
A edição de “Retorno a Culver City” , são 226 páginas (223 de história e mais três de curiosidades sobre Tex e sobre a concepção e criação da história que fazem uma leitura interessante antes de entrarmos na aventura propriamente dita), onde o argumento inteligentemente escrito por Claudio Nizzi, aliado ao belíssimo traço de Fabio Civitelli, onde nunca nos cansamos de ver (e rever) Tex e os seus pards cavalgaram planícies imensas, enfrentar inimigos (sejam eles quem forem!), ajudar quem precisa e aplicar a justiça quando necessário, porque Tex há-de sempre ser um justiceiro e é disso que se gosta.
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