A GRANDE MOSTRA DOS 70 ANOS DE TEX

Por Thiago Gardinali*

Entre e sente-se numa típica carruagem de comboio da segunda metade do século XIX. Observe com atenção as imagens através das janelas e perceba quanta coisa aconteceu nos últimos 70 anos.
Mês a mês, Tex foi testemunha ocular da História. É bem assim que começa a visita ao Museo della Permanente de Milão, onde foi montada, em 2018, a grande mostra “70 anos de um mito”, organizada pela Sergio Bonelli Editore e comissariada pelo especialista em fumetti Gianni Bono. O enorme acervo da editora foi organizado com ajuda de recursos tecnológicos que permitem uma total imersão no universo das aventuras do Ranger. Grandes emoções para leitores e aficionados, com itens nunca antes exibidos.

Ao sair do comboio, cujas janelas projetam imagens da História de Itália, com as correspondentes capas de Tex de cada período, o visitante depara-se com um enorme Gianluigi Bonelli, pronto para abrir os seus arquivos secretos. A sala conta com a sua lendária máquina de escrever (cheia de rabiscos de caneta que ele mesmo fazia enquanto datilografava), roteiros originais das aventuras que ele criava e depois entregava para Aurelio Galleppini fazer a arte (com interessantes detalhes de esboços de figuras para facilitar a compreensão), o roteiro original do filme de Tex de 1985, e o seu chapéu de cowboy. Além disso, um aplicativo permite a consulta, através de uma grande tela em touch screen, das fichas utilizadas por Gianluigi para arquivar dados e informações sobre os temas utilizados nas histórias aos quadradinhos. Há, por exemplo, termos da linguagem voodoo para as tramas de feitiçaria, referências de tribos indígenas, da geografia do velho oeste e muitos outros assuntos.

A visita prossegue através de uma sala que homenageia Sergio Bonelli e Aurelio Galleppini, com alguns dos originais do desenhador. Ao lado, a reprodução de uma edicola, a tradicional banca de jornal italiana, onde são projetadas capas de Tex e dos demais títulos Bonelli, juntamente com as manchetes dos jornais de cada década. Deste modo, é possível saber, exatamente, o que acontecia na Itália e no mundo no momento em que cada título era lançado.

No salão principal da Mostra, toda a vida editorial de Tex contada através de páginas e artes originais, infografias e centenas de objetos raros. É, sem dúvida alguma, a área na qual o visitante despenderá o maior tempo de apreciação. Isso, porque o espaço foi dividido por décadas, de 1948 aos dias de hoje, cada uma delas com um grande mural e uma enorme vitrine. As emoções para o leitor começam com os originais de “O Totem Misterioso”, a primeira aventura de Tex, em tiras.

Como é fascinante observar os detalhes da tinta no papel, as anotações de referências feitas a lápis, e as marcas de fita adesiva nos cantos das folhas. É apenas o início de uma sequência de itens raros que fizeram parte dos 70 anos de existência da personagem. O original do frontispício, usado até hoje na abertura de cada história de Tex, também está lá. Dezenas de originais de páginas, dos mais variados desenhadores que já emprestaram o seu talento ao Ranger, estão expostos de acordo com os critérios de datas, por todo o salão. Isso permite, aos mais detalhistas, permanecer por horas observando as diferenças de estilos, traços e finalização. Permite, ainda, uma viagem na própria memória, relembrando cada aventura, o momento no qual ela foi lida e as recordações de sentimentos que cada uma delas traz. Um verdadeiro show de arte gráfica, que nos transporta à atmosfera dos Estados Unidos do século XIX, e comprova como a editora soube escolher sempre muito bem os desenhadores que fizeram parte da sua equipa nas últimas sete décadas.

O sucesso de Tex ultrapassou as páginas das revistas aos quadradinhos e a paixão dos fãs fez com que inúmeros itens passassem a ser arduamente disputados. Álbuns de cromos, brinquedos, roupas, estatuetas e pins estão entre alguns deles. O que dizer de uma fantasia completa do Ranger, de uma bela saia com as suas tiras aos quadradinhos, ou de uma coleção de bonecos de plástico no estilo “Forte Apache”? E que tal uma espingarda de brinquedo com 25 tiros, para que as crianças dos anos 1970 pudessem brincar aos combates com os inimigos, assim como o seu ídolo dos quadradinhos? Nos tempos atuais da patrulha chata do politicamente correto, esse brinquedo dificilmente teria espaço nas lojas. Artigos raros, que poucos leitores pelo mundo possuem nas suas coleções.

As paredes do museu chamam a atenção por um detalhe especial: estão repletas de informações sobre o universo de Tex. A começar pelos amigos e inimigos mais conhecidos dos 70 anos de aventuras. Depois, todos os argumentistas e desenhadores que já assinaram as edições, com o número de histórias produzidas por cada um. Porém, o mais surpreendente diz respeito a dados e curiosidades da vida editorial da personagem. Qual é a história mais longa? Quantas páginas Galep desenhou? Quem foi o desenhador mais jovem? E o mais velho? Quantas vezes Tex já ofereceu bebida a alguém? Quantas vezes Tex se sentou para comer um bife de três dedos com uma montanha de batatinhas fritas? Quantas janelas Tex e os seus pards já quebraram? Acredite, há respostas para estas e muitas outras perguntas! Além disso, dois infográficos destacam-se. Um deles mostra quantas vezes Tex já foi ferido e em quais partes do corpo (braços, pernas, ombros e por aí vai), e o outro mostra quantas vezes Tex já salvou cada um dos seus pards e quantas vezes já foi salvo por cada um deles. Informações para fazer inveja aos mais aficionados leitores de todos os tempos!

Seguindo em frente, chegamos até à sala que reúne as publicações de Tex por todo o planeta, incluindo coleções ainda ativas e as que foram descontinuadas. Grande parte dessa vitrine abriga publicações em língua portuguesa das editoras Mythos e Polvo. Nesse mesmo espaço, vários tablets estão à disposição dos visitantes para que possam observar as ruas de Milão sob a ótica do velho oeste. Trata-se de um aplicativo de realidade aumentada que transforma a vista da grande sacada do museu no cenário das aventuras de Tex. A tecnologia também permite, numa outra sala, que o visitante entre no cenário dos quadradinhos, tire uma foto com Tex, e escolha falas para serem inseridas nos balões. Tudo é acionado através de um totem e a fotografia é imediatamente enviada por e-mail. Num outro dispositivo, o visitante seleciona a sua data de nascimento e visualiza a capa da edição de Tex daquele mês e ano.

Um dos ambientes do museu reserva uma grande surpresa. Uma grande maquete revela o lançamento de Tex Willer World, um parque temático que será construído em Montegrotto Terme, província de Padova, no norte de Itália. Imagine um ambiente que reproduzirá o ambiente western com saloon, hotel, restaurante, estação de comboios, forte militar, além de espaços emblemáticos como a casa de El Morisco, o teatro de Mefisto, a aldeia Navajo, o quarteirão mexicano, e muitos outros cenários que conhecemos dos quadradinhos. O empreendimento é da responsabilidade de Giorgio Bonelli, irmão de Sergio, e deve começar a ser construído já em 2019. Os leitores de Tex terão destino certo para passar as férias!

Por onde quer que o visitante olhe, encontrará algo para se surpreender. É assim, por exemplo, na enorme redoma de vidro que reúne o maior (1m x 1,4 m) e o menor (9cm x 7cm) álbum de Tex já publicado. Uma sala de cinema exibe entrevistas com autores e gravações realizadas na redação da Sergio Bonelli Editore. Uma enorme linha do tempo mostra, além de Tex, todos os demais títulos já publicados pela editora desde 1948. A última galeria expõe pranchas da nova série Tex Willer, que retrata a juventude da personagem. Na saída, um corredor com diversas edições penduradas, como se estivessem flutuando, e uma loja com produtos oficiais da Bonelli para ir embora de sacolas cheias.

O verdadeiro fã de Tex gastará um dia todo para visitar a Mostra, por isso vale chegar cedo e aproveitar cada detalhe. Escritores e desenhadores fazem sessões especiais de autógrafos, conforme a programação disponível no site. O acesso ao museu é muito fácil, fica ao lado da estação Repubblica do metro. A Mostra esteve aberta todos os dias das 9h30 às 20h, custava apenas 12 euros e ficou montada até 27 de janeiro de 2019.

* Texto de Tiago Gardinali publicado originalmente na Revista nº 9 do Clube Tex Portugal, de Dezembro de 2018.

(Para aproveitar a extensão completa das imagens acima clique nas mesmas)

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *