TEX de José Ortiz em grande destaque no Diário As Beiras: 11 de Março de 1995

Texto do jornal Diário “As Beiras” de 11 de Março de 1995
João Miguel Lameiras

Um espanhol no velho Oeste

Um espanhol no velho OesteContrariando um pouco (os justos) lamentos daqueles leitores que se queixam do cada vez menor número de edições brasileiras de interesse que conseguem atravessar o Atlântico e aterrar nas bancas dos quiosques portugueses, foi recentemente distribuída em Portugal uma edição da Globo que dá a conhecer uma diferente versão  de um herói clássico dos “fumetti”. “Tex”, o personagem mais emblemático das Edições Bonelli, já foi objecto de referência nesta coluna, aquando da distribuição da colectânea que a Editora Globo consagrou às criações da casa Bonelli (ver DIÁRIO AS BEIRAS de 23/7/94) e é um velho conhecido dos leitores portugueses pois as suas aventuras têm sido distribuídas em Portugal nos últimos 15 anos.

Criado por Giovanni Bonelli e Aurelio Galleppini, este herói foi publicado pela primeira vez em 1948, mantendo-se em publicação ininterrupta até à actualidade, com a dupla criadora a ter que assegurar uma média de 110 páginas mensais, um ritmo de produção industrial que, logicamente, se reflectiu na qualidade e originalidade das historias. Esse ritmo alucinante de produção condicionou igualmente o trabalho gráfico dos mais de dez desenhadores que se ocuparam da série, condenados a um estilo funcional, sem quaisquer requintes estéticos. Daí que estes álbuns especiais (com um ritmo de produção muito mais lento do que as edições mensais) permitam outro tipo de voos, sendo muitas vezes usados para permitir que desenhadores consagrados transmitam o seu cunho pessoal ao herói do Oeste. Foi o que sucedeu com a edição comemorativa do 40° aniversário da série, desenhada pelo recém falecido Guido Buzzelli, ou com o álbum que motiva este texto, com desenhos do espanhol José Ortiz.

Desenhador veterano, com uma carreira construída entre os EUA e a Europa, Ortiz começou a ganhar estatuto internacional graças aos seus trabalhos para as revistas de terror “Creepy” e “Eerie” que, em 1975, lhe valeram o prémio “Waren” para o melhor   desenhador. Quando, após a morte de Franco, voltou a Espanha, inicia então uma duradoura colaboração com o argumentista António Segura, de que resultaram, entre outras, as séries “Hombre” e “Burton e Cyb”, uma comédia de ficção científica publicada na revista “Animal”. Em todos estes trabalhos é visível o talento e a eficácia de Ortiz, o seu domínio do claro-escuro e o grande dinamismo que imprime às cenas de acção.

O Grande RouboEste álbum de Tex não foge à regra, com Ortiz a fazer um excelente trabalho, embora um pouco menos pormenorizado do que é habitual, não abdicando no entanto dos enquadramentos dinâmicos e do trabalho semi-caricatural das feições, que são uma característica do seu estilo. Outro trabalho interessante do seu trabalho, são as referencias cinematográficas que enchem a história e que vão desde o tratamento fordiano dos cenários de Monument Valley, até à presença de um bandido com as feições de Lee Van Clef, actor-fetiche de alguns “Westerns Spaguettï” de Sergio Leone.

Quanto ao argumento de Claudio Nizzi, o escritor que substituiu Bonelli a partir de 1988, este é bastante eficaz, sem ser brilhante, com uma série de sequências passadas no comboio que ajudam a salientar o talento de José Ortiz para os enquadramentos dinâmicos. Uma história de ganância e traição, suficientemente complexa para aguentar 240 páginas, mas que pouco tem de original, cumprindo, no entanto, a sua função de proporcionar uma leitura agradável.

A edição da Globo, enriquecida por um vasto dossier que inclui um texto do filho de Bonelli, uma entrevista com Ortiz e um interessante artigo de Mauro Boselli sobre os assaltos aos comboios nos Westerns (na BD e no cinema), só peca por estar impressa em péssimo papel, que faz com que as pranchas mais escuras de Ortiz saiam algo empasteladas. De qualquer modo, pelo modesto preço desta edição, não se podia exigir muito mais.
Mais do que uma amostra da série “Tex”, cujo nível médio é bastante inferior ao deste álbum, esta edição é uma boa iniciação à obra de José Ortiz, um grande desenhador ainda pouco conhecido em Portugal.

Arte de José Ortiz

(“Tex”: O Grande Roubo por Claudio Nizzi e José Ortiz, Editora Globo, 242 pags, 750$00)

Copyright: © 1995 Diário “As Beiras”; João Miguel Lameiras
(Para aproveitar a extensão completa das imagens acima, clique nas mesmas)

Um comentário

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *