Resgatando o passado: Diário de uma viagem de sonho (2002)

Por José Carlos Francisco

Dia primeiroSábado, 14 de Setembro de 2002

Numa manhã chuvosa e melancólica, desembarcou no aeroporto da Portela em Lisboa, um trio brasileiro muito especial. Tratava-se do editor de Tex no Brasil, Dorival Vitor Lopes, que veio acompanhado de sua esposa e também do Júlio Schneider, tradutor das revistas Bonellianas e colaborador da Mythos Editora.

Diplomaticamente obrigados a fazer escala na capital portuguesa para apanhar este que vos escreve, os ilustres brasileiros traziam junto, muitas revistas do nosso Águia da Noite para os fervorosos fãs portugueses, que felizmente contam com a ajuda do editor brasileiro para continuar a ler as aventuras deste fabuloso herói de papel, sempre vivo nas páginas dos livros de banda desenhada e que continua a cativar milhares e milhares de leitores por todo o mundo.

A banda desenhada vive muito dos seus heróis, figuras que têm ajudado a preencher os sonhos e o imaginário de gerações de apaixonados leitores e visionários. Tex Willer é um desses heróis, símbolo de generosidade, coragem e abnegação. Os seus criadores, Gian Luigi Bonelli e Aurelio Galleppini, enriqueceram-lhe a personalidade de forma inteligente e subtil: colocaram a seu lado personagens carismáticas e humorísticas, como o “velho” Kit Carson.

À espera de tão ilustres visitantes, estavam para além de mim, a minha esposa Fátima e a pequena Andreia, acompanhados do fervoroso texiano Paulo Silva. Após a respectiva apresentação do Paulo Silva ao Júlio, resolvemos fazer um pequeno tour por Lisboa, para que Júlio Schneider pudesse conhecer esta bela cidade europeia, até porque a viagem para Milão só seria efectuada da parte da tarde.

O nosso destino foi a Igreja de Stª. Maria de Belém, integrada no Mosteiro dos Jerónimos, mandado erigir por D. Manuel I, no séc. XVI.
Ali se encontram os túmulos de Luís Vaz de Camões, imortal poeta português, que escreveu a magnificente obra “Os Lusíadas” e Vasco da Gama, navegador que ficou famoso depois de descobrir o caminho marítimo para a Índia. Duas das personalidades mais importantes da História portuguesa.

E sabendo que ir a Lisboa e não comer pastéis de Belém pode ser considerado um crime, levamos o Júlio Schneider até à Pastelaria de Belém, onde nos aguardava o texiano português, Orlando Santos Silva. No interior do número 84 da Rua de Belém, na fábrica fundada em 1837, é possível ver painéis de azulejos do século XVIII, quase tão famosos como os doces pastéis que ali se vendem. Azulejos esses que, como não poderia deixar de ser, o Júlio fotografou.

Os pastéis de Belém são uma espécie famosa de pastéis de nata, em que a base é de massa folhada e o recheio de leite, nata, baunilha e… não se sabe que mais. É isso mesmo: a receita destes famosos pastéis é a história mais bem guardada da doçaria portuguesa. Ninguém sabe ao certo como são feitos, apenas dentro da fábrica, um café em Belém, perto do Mosteiro dos Jerónimos, e que se tornou um ponto de romaria todos os dias. Não há nada a fazer, não há voltas a dar: o problema é comer um só pastel, porque eles são tão bons que apetece comer muitos…

Os pastéis de Belém tornaram-se um verdadeiro ícone turístico: são vendidos diariamente mais de 10 mil pastéis, acompanhados de açúcar e canela devidamente empacotados, que acompanham a caixa de pastéis. O Júlio adorou os pastéis, assim como o Dorival e a sua esposa que já lá tinham estado na última visita a Portugal.

De seguida fomos visitar o Castelo de São Jorge, conquistado por D. Afonso Henriques, em 1147. O passeio existente nos lados poente e norte do Castelo permitiu-nos um passeio agradável e desfrutar de uma deslumbrante vista sobre a cidade. O que se vê é a magnífica Lisboa inteira aos seus pés. Mas como o tempo passava depressa, chegou o momento de retornarmos ao aeroporto para apanharmos o avião para a Itália.

Depois das despedidas, seguimos os três para Milão, numa viagem de cerca de duas horas e meia num avião da TAP. Aterramos em Malpensa, distante 45 km do centro da cidade e através do excelente sistema de transporte ferroviário, chegamos até à cidade em cerca de 40 minutos.

Logo dirigimo-nos para o Hotel Berna, localizado em De Napo Torriani, 18, já previamente reservado e onde fomos muito bem recebidos pelo pessoal. Além de uma excelente localização, o hotel possuía quartos impecáveis, os quais acolheram os fatigados viajantes após um dia longo de viagem.

Dia segundoDomingo, 15 de Setembro de 2002

Depois de uma noite bem dormida, acordamos com disposição de conhecer a cidade, já que o Sergio Bonelli se encontrava ausente de Milão, só chegando ao anoitecer. Dirigimo-nos de metropolitano até o centro de Milão, onde espantou-nos a beleza exuberante do Duomo, a maior catedral gótica da Itália: ela é realmente de tirar o fôlego. A sua construção, que durou 500 anos, começou no séc. XIV e objectivava abrigar toda a população da cidade, àquela época em torno de 40.000 pessoas. Daí chamar-se “Duomo” de Milão, que significa Casa de Milão. É possível passar uma tarde toda no seu interior apreciando as obras de arte.

Saindo da Piazza del Duomo (acompanhando o lado esquerdo da catedral) encontramos a Galleria Vittorio Emanuele, uma bela construção com tecto de vidro (1865) que marca o ponto máximo do esplendor da Belle Epoque. Os milaneses chamam a galeria de salotto (sala de estar); com os seus cafés, escritórios e lojas, esse é um óptimo lugar para ver e ser visto pelas pessoas. Vale a pena pagar uma pequena fortuna por um café ou uma cerveja só para ficar sentado numa das mesinhas, apreciando o movimento.

Atravessamos a galeria e saímos na Piazza Scala, endereço do famoso teatro lírico La Scala. Também conhecemos a internacionalmente estátua de Leonardo da Vinci, que recorda o maestro na sua actividade de pintor, arquitecto, hidráulico e escultor.
Milão é uma cidade com muito charme!! E ter a oportunidade de conhecê-la vale a pena (mesmo que o seu preço seja alto!).

Como já era tarde, retornamos ao hotel para um banho demorado e renovador. Passado algum tempo, tivemos o telefonema da recepção do hotel: o grande Sergio Bonelli aguardava-nos. Neste momento um frio na espinha se apoderou de mim por saber que a partir daquele momento estava a um pequeno passo de conhecer o mais famoso editor de fumetti da Europa e ídolo meu desde criança.

Descemos com o coração saindo pela boca e fomos entusiasticamente recebidos pelo Sergio, que nos cumprimentou a todos efusivamente. A seguir fomos tomar uns aperitivos no bar do hotel, enquanto aguardávamos a chegada de um táxi para nos levar a um restaurante, já que o Sergio nos convidou para o acompanharmos à refeição.

Foi um jantar delicioso e prazeroso em que o tempo passou muito depressa, pois tantos foram os motivos de conversa, muitas as curiosidades a saber por nós e também pelo Sergio. Foi um momento inesquecível e registado para todo o sempre na nossa memória, estar ali lado a lado com o grande editor italiano fazendo perguntas e ele dispondo-se a responder de forma muito simpática e prolongada, perguntas relacionadas com a sua história de argumentista e editor, com a razão de ser da sua editora, ou até com pormenores que poderiam ser insignificantes, mas que muito nos honraram.

E ele próprio fazendo-nos perguntas aos três… falando das edições Bonelli na Itália, no Brasil e até em Portugal, dos seus argumentos, dos seus colaboradores na editora, onde se incluem principalmente os argumentistas e os desenhadores, da obra de seu pai, enfim foi uma noite de sonho…

Um momento engraçado aconteceu quando o Sergio não se recordava do nome de alguma personagem ou de algum facto histórico da editora e o Júlio prontamente lhe recordava, até que ele emendou, brincando: “Mas você sabe tudo, não vou falar mais nada!“, e o Dorival, gentil e imediatamente, retrucou: “Não, é mais interessante ouvir de você, continue!“.

Após o jantar, o Sergio levou-nos a passear a pé pelas ruas do centro, um passeio nocturno muito agradável no qual revelou a história daquela parte da cidade, onde estão concentradas as principais lojas e escritórios de moda. Conhecemos as ruas Sant’Andrea, Spiga, Borgospesso e Monte Napoleone que formam o Quadrilátero de Ouro, onde estão localizadas as mais famosas e caras lojas de griffes italianas, como Armani, Valentino, Versace, Fiorucci e outras. A nossa viagem de sonho era mais que um sonho, era real e, ainda por cima, estávamos tendo um momento ímpar e exclusivo: ter o Sergio Bonelli como guia num passeio nocturno em Milão. E mal sabíamos nós que o melhor ainda estava por vir!!!

Dia terceiroSegunda-feira, 16 de Setembro de 2002

Outro grande dia aguardava por nós: o dia em que iríamos conhecer a Casa dos Sonhos e o sonho de qualquer fã, conhecer os desenhadores e os argumentistas das revistas que coleccionamos. Lá fomos a caminho do número 38 da Via Michelangelo Buonarroti, onde tivemos a primeira grande surpresa: tratava-se de um edifício habitacional que foi convertido em editora no andar térreo e no primeiro andar e onde trabalhavam cerca de 40 pessoas.

Assim que fomos anunciados, fomos encaminhados para a sala do Sergio, onde, após breves instantes, fomos recebidos pelo próprio. Que histórias maravilhosas aquelas paredes nos contariam se pudessem falar! … Entrar naquela sala foi um momento mágico: o clima do velho Oeste, mesclado com o clima do Brasil, estava presente em virtude das muitas lembranças das viagens que o Sergio Bonelli fez pelo mundo, com destaque para os inúmeros objectos oriundos do Brasil, disputando taco a taco o espaço com todas aquelas obras do velho Oeste de sua biblioteca temática…

Conversamos agradavelmente durante uma hora mergulhados naquele ambiente cheio de revistas, de cartas, de desenhos originais, um local sagrado e de culto para qualquer fã do mundo Bonelli. Trocamos presentes, entregamos correspondência de coleccionadores que tinham pedido para entregar em mão e folheamos revistas brasileiras, as quais Sergio Bonelli muito elogiou, dizendo que eram a melhor edição internacional de Tex.

O editor italiano felicitou a Mythos Editora, na pessoa do seu editor Dorival, pelo enorme sucesso e prestígio que a editora estava a granjear com as publicações Bonelli, não somente por Tex, mas também pelas outras publicações bonellianas que estão nas bancas do solo brasileiro.

Tivemos o enorme prazer de conhecer também o filho de Sergio, Davide Bonelli, que trabalha na editora com o pai, seguindo as pegadas do seu progenitor e imbuído de preservar o futuro da editora, consolidando-a cada vez mais como a maior editora de banda desenhada da Europa. Davide é um dos responsáveis pela parte administrativa da Editora SBE e mostrou-se muito simpático e humilde para connosco, mostrando que saia ao pai na difícil arte de bem receber.

Também conhecemos o director administrativo da editora, Giulio Terzaghi, o homem que comanda verdadeiramente a editora. A seguir, Sergio levou-nos a conhecer a editora e as pessoas que lá trabalhavam. Fomos apresentados ao Decio Canzio, o director geral e editor de Tex, Mauro Boselli, editor de Zagor e de Dampyr, assim como argumentista de Tex e Dampyr, que se deslocou à editora especialmente para nos receber, o que demonstra a importância que a Sergio Bonelli Editore deu a esta delegação.

Também fomos apresentados ao Mauro Marcheselli, editor e argumentista de Dylan Dog, um sucesso de vendas na Itália, estando neste momento em segundo lugar na lista de vendas, mas que chegou a ultrapassar o próprio Tex no número de exemplares vendidos  tempos atrás, pois Dylan Dog é uma figura singular dentro da indústria dos quadradinhos italiana.

Conhecer ainda o simpático Graziano Frediani, o editor da série Ken Parker e que também faz excelentes matérias para os Texoni, e também nos álbuns gigantes coloridos da Editora Mondadori por exemplo. Neste dia inesquecível conhecemos ainda Maurizio Colombo, o criador, conjuntamente com o Mauro Boselli, da série Dampyr, para a qual também produz histórias, assim como matérias fabulosas sobre faroeste nos Almanaques Tex.

Fomos apresentados também a Luca Crovi, que trabalha na editora desde 1991, responsável por belas matérias também nos Almanaques, dos quais é o editor, e nos Texoni. Luca convidou-nos para assistir no dia seguinte ao lançamento do seu último livro: “Tutti i colori del giallo“, na mais famosa livraria de Milão.

Diante de todas estas fantásticas personalidades, foi curiosa a caça aos autógrafos que encetei com todos eles, os quais me brindaram com belas dedicatórias alusivas ao momento que vivia na presença deles.

No meio da visita, o Sergio Bonelli pessoalmente foi à sala central de arrecadação e distribuição das revistas e apanhou para mim os Tex mais recentes, assim como todos os Maxi Tex, incluindo o célebre Oklahoma e vários Texoni, autografando um Tex 500.

Após conhecermos toda esta gente ilustre fui convidado a assistir a uma reunião de trabalho com a presença de Sergio Bonelli, Decio Canzio, Mauro Boselli, Mauro Marcheselli e da simpática secretária administrativa Ornella Castellini, além de Dorival Vitor Lopes e Júlio Schneider. Durante uma hora e meia foram debatidos assuntos do mais alto nível, com ênfase na estratégia das revistas Bonelli no Brasil e também na Itália, tiragens no Brasil e na Itália, o porquê dos números das várias personagens Bonelli escolhidas para sair no Brasil, etc…

Nessa reunião, todo o staff Bonelli deu os parabéns ao Dorival e ao Júlio pela explanação e estratégia seguida no Brasil para as revistas Bonelli e mostraram-se muito interessados e agradados com tudo o que ouviam, prova disso foram as inúmeras perguntas postas na mesa. Também foi felicitado no final o Júlio, pela forma exemplar como falou italiano.

Mas quanto a mim, o momento alto dessa reunião foi ver as gargalhadas da directoria quando o Júlio inventou de fazer piadinhas na reunião! Piadinhas excelentes que desanuviaram ainda mais o clima. Um detalhe importante na reunião, que não posso deixar passar em branco, foi quando Mauro Marcheselli perguntou como o Júlio fazia para traduzir os jogos de palavras que ele escreve para Groucho, quando não teriam o mesmo efeito em português. O Júlio respondeu que, nesses casos, ele próprio criava as suas próprias frases espirituosas.

Após a explicação do Júlio, tanto Mauro Marcheselli quanto Decio Canzio e Sergio Bonelli aprovaram e deram os parabéns, pois os jogos de palavras do Groucho na língua portuguesa ficam igualmente excelentes!

Dia quartoTerça-feira, 17 de Setembro de 2002

Começamos o dia visitando o Castelo Sforzesco, um dos outros símbolos de Milão. Construído na segunda metade do século XIV e destruído durante a República Ambrosiana, a sua reconstrução ficou completa já no inicio da segunda metade do século XV, tomando-se o castelo uma residência luxuosa, um património artístico e esplendoroso.

Depois passeamos um pouco pela cidade e, após o almoço, dirigimo-nos de novo até à editora, onde desta vez fiquei a conhecer outra pessoa maravilhosa: Mario Faggella, responsável pelo site da Editora e actualmente também argumentista, já que um roteiro de Dampyr foi aprovado e ele está a trabalhar no segundo, prova do seu empenho e qualidade que possui, pois não é fácil entrar no staff de argumentistas da Sergio Bonelli Editore. Mario fez-me uma surpresa maravilhosa: ofereceu-me três Tex Gigantes Coloridos da Mondadori.

Também se encontrava na editora o Moreno Burattini, um dos responsáveis pelo sucesso de Zagor nos últimos anos. Junto com Boselli, ele comanda as novas sagas do Espírito da Machadinha. Passamos uma tarde muito agradável na editora e recebemos várias revistas de Tex e Zagor, assim como algumas edições especiais de Águia da Noite. Aproveitamos para recolher autógrafos de pessoas que ainda não tínhamos.

Ao findar do dia fomos ver a apresentação do livro do Luca Crovi, acompanhados pelo Sergio. Imprescindível dizer que o lançamento foi um sucesso, a ponto do auditório estar completamente cheio, o que muito orgulhou Sergio Bonelli, em virtude de ele adorar o simpático Luca Crovi, que ainda assim não perde a sua modéstia, mesmo com sua fama já enorme.


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Como não poderia deixar de ser, Sergio Bonelli teve que ir à mesa de honra dizer umas palavras, que devido à sua maneira de ser, em muito animaram o auditório e fizeram todos rir. Aí também ficamos a conhecer o único Tex de carne e osso que existiu até hoje: o famoso Giuliano Gemma, que interpretou o nosso herói no filme “Tex e o Senhor dos Abismos“, o único filme de Tex já realizado. Apresentava o seu mais recente trabalho “Giovanna la pazza” no mesmo auditório.


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Após esse evento, fomos jantar novamente na companhia do editor italiano, mas agora acompanhados por Moreno Burattini, que como nós, ouviu da boca do Sergio histórias passadas por ele na Amazónia, onde chegou até a estar preso, aventura contada por ele num português excelente, num encanto fabuloso. Ficamos a saber das tentativas angustiadas que ele fez à época para conseguir ligar para Milão, ligações telefónicas que, por passarem por centrais de fios de diversas cidades, demoravam horas e horas para serem completadas!

E o que dizer de ouvir do Sergio, a forma como ele presenciou o nascimento de Tex, quando partilhava o seu quarto com o grande Galep? Já tinha lido essa história, mas agora posso dizer que ouvi da boca dele…
Engraçado também foi recordar com ele a final da Taça dos Campeões Europeus de 1964 realizada em San Siro, onde o Inter de Milão dele venceu o meu Benfica, final essa que o Sergio se lembra perfeitamente, já que ele assistiu a esse jogo e recordou as várias peripécias desse jogo histórico para ambos os clubes…

Após o jantar deixamos o Moreno Burattini na sua residência em Milão e o Sergio levou-nos no seu carro até o hotel. Aí chegados,  enquanto conversávamos com o Sergio, este pediu ao recepcionista do hotel um documento de boas vindas da casa, e brindou-nos, a mim e ao Júlio, com uma dedicatória muito especial, escrita com letras bonitas, além de um autógrafo. Foi uma noite muito, mas mesmo muito agradável e que jamais esqueceremos.

Dia quintoQuarta-feira, 18 de Setembro de 2002

Este dia começou com uma visita ao depósito das revistas da Sergio Bonelli Editore, situado em Turate, província de Como, na Via G. Puecher, 30, guiados pelo Davide Bonelli e pelo Giulio Terzaghi. No depósito, que tem dez mil metros quadrados, existem milhões de revistas que fazem a delícia de quem tenha a felicidade de ali entrar. Ali estão 300 exemplares de cada número, de todas as edições produzidas pela editora até hoje. Exemplares esses que não estão à venda e estão guardados em estantes totalmente vedadas, para ninguém poder retirar um único exemplar.


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Nesse depósito também conhecemos a sala do Tesouro, ou seja uma caixa (sala) forte fechada a sete chaves, onde estão guardadas todas as capas originais assim como desenhos que os desenhadores deixaram com a editora. Também vimos a sala onde estão todos os originais que foram para a gráfica, que servem para fazer as ristampas (reedições), igualmente numa sala de acesso restrito.

Numa arrecadação, encontramos as personagens Bonelli em tamanho real, feitas de madeira e pintadas, sempre prontas para se deslocarem para as várias exposições que se realizam por toda a Itália de vez em quando. Aproveitei para tirar uma fotografia entre Tex e seu arqui-inimigo Mefisto, para registar esse momento.

No depósito de Turate funciona todo o processo de vendas de revistas para os quatro cantos do mundo e, a julgar pelo número de pessoas que trabalha na expedição e nos escritórios, é um negócio que vai de vento em popa, pois chegam muitas encomendas de números atrasados todos os dias. Na final da visita, fomos presenteados com alguns souvenirs, onde se destacam mais algumas revistas de Tex, alguns pins e também dois puzzles de Tex compostos de 250 peças cada um.

Retornando à editora, Moreno Burattini mostrou-se uma vez mais uma pessoa maravilhosa quando me presenteou com uma prancha original feita por Alessandro Chiarolla para uma aventura de Zagor e alguns desenhos avulsos de Tex também, destacando-se um desenho totalmente inédito do Carlo Raffaele Marcello, que deveria ter saído no Tex nº 418 italiano, Morte sul fiume, de Agosto 1995 e não foi aproveitado. Na edição brasileira este desenho deveria aparecer na página 58 do Tex nº 330, Marcados para morrer. Ou seja uma autêntica preciosidade!

E finalmente chegou a hora de nos despedirmos de toda aquela gente, e principalmente de Sergio Bonelli, que foi um encanto de pessoa, surpreendendo-nos a cada instante. Cordial, despediu-se de nós com um longo e forte abraço, esperando que um novo encontro se propicie em breve.

Após o almoço fomos buscar o carro, já devidamente alugado, para nos deslocarmos até Chiavari, onde o desenhador Ivo Milazzo nos aguardava. Pelo caminho entramos e paramos na belíssima cidade de Génova, de tão grandes tradições marítimas e, por isso, ligada há séculos a Portugal. Seguimos caminho e paramos desta vez em Rapallo onde está o Ristorante U Giancu do simpático aficionado Fausto Oneto, que infelizmente não tivemos a felicidade de conhecer, pois apesar de tirarmos umas fotos no exterior o famoso restaurante estava fechado.

Somente ao entardecer entramos em Chiavari e lá encontramos o Ivo Milazzo à nossa espera no local combinado. Mais um momento histórico desta viagem: abraçar o grande Milazzo. Fomos tomar um chopinho e uma coca-cola na sua companhia.

De seguida fomos jantar e mais uma vez passamos uma noite memorável regada a muita conversa. Além de conhecer melhor este grande homem dos fumetti, ficamos a par de muitas novidades e projectos de Milazzo, que se mostrou também uma pessoa muito simpática e atenciosa, o que parece provar que toda a gente que trabalha neste ramo é assim.

Findo o jantar, Milazzo levou-nos a conhecer Portofino, incrustada em uma baía dominada pelo Monte Portofino, criando uma das mais atraentes paisagens da Costa Liguria. No meio do verde, as casas policromáticas que formam este delicioso porto de pescadores, criam um alegre contraste com o mar transparente e azul.

Milazzo confidenciou-nos que Portofino é um dos mais belos portos da Europa, e é uma cidade que qualquer um que visite, quer por lá ficar, porém poucos podem, devido à sua beleza incomum como podemos constatar, mas também por ter um padrão de vida muito elevado.

Dia sextoQuinta-feira, 19 de Setembro de 2002

A alvorada estava marcada para as oito horas, já que tínhamos uma longa viagem até Pisa, passando por Florença. À hora marcada lá estava o Ivo Milazzo esperando-nos na recepção do hotel para nos oferecer o pequeno almoço. Fomos andando e conversando até ao local escolhido por ele, quando de repente Ivo Milazzo entrou numa papelaria, comprou uma folha de papel e uma caneta de filtro.

Sem titubear, dirigiu-se para a esplanada de um bar em frente ao esplêndido Mar da Liguria e desenhou o Ken Parker com uma dedicatória muito especial e ofereceu-me… foi um dos momentos mais emocionantes desta viagem. Um desenho do próprio Milazzo… de certeza que este desenho vai ser devidamente emoldurado…

Após esse momento ímpar, mais uma despedida aconteceu e seguimos caminho até Florença, cidade da cultura e da arte, onde viveram Leonardo da Vinci e Galileu Galilei, entre outras personagens importantes. Prosseguimos caminho e chegamos à cidade de Pisa, que é conhecida por ter a torre mais famosa da Itália, um dos monumentos mais conhecidos do mundo ocidental.

Visitamos a famosa torre inclinada, situada na Praça do Campo, conhecida também como “Campo dos Milagres”, que contém também a sumptuosa Catedral e o Batistério. A Catedral de Pisa fica ao lado da torre. A igreja tem portões de bronze, decorados com relevos esculpidos que contam histórias religiosas e das conquistas da cidade. Além da catedral e da torre, existe ali o Batistério, onde as crianças são baptizadas ainda hoje.

Quanto à sua inclinação, podemos constatar ao vivo que ela é impressionante, ronda sensivelmente cinco metros no total dos seus 58,5 metros de altura e é um autêntico mistério ela ainda estar de pé e recebendo visitas com total segurança segundo nos disseram.

À noite tivemos o prazer de encontrar-nos com Marco Gremignai, responsável pela secção internacional do site UBC e amigo pessoal do Júlio, que nos convidou para um jantar numa cantina de comida tipicamente toscana, que muito apreciamos e onde a conversa também foi muito agradável e interessante.

Após o jantar, o Marco levou-nos a apreciar a vista nocturna da torre, mostrando-se ainda mais bela toda iluminada.

Dia sétimoSexta-feira, 20 de Setembro de 2002

Pela manhã, tempo livre para conhecermos a cidade e fazermos as últimas compras. Conhecemos melhor esta cidade universitária de grande interesse histórico e cultural, no coração da Toscana. Além da famosa Torre e da Piazza do Duomo, Pisa é berço de numerosas obras de artes que a fazem ser uma das cidades mais interessantes da região.

À hora do almoço, Marco Gremignai, voltou ao nosso encontro no hotel e assim desfrutamos mais um pouco da sua agradável companhia. Após essa refeição, eu e o Dorival despedimo-nos do Marco e do Júlio Schneider, o qual ficaria mais uma semana em Itália, passando o resto do dia com o Marco indo no dia seguinte iria para Florença, mais precisamente para casa do Moreno Burattini, onde, segunda-feira, dia 23 regressaria a Milão na sua companhia, para novamente desfrutar do convívio com o Sergio Bonelli e com todo o pessoal da editora.

Chegamos a Milão ao anoitecer e mais uma bela surpresa nos aguardava para fechar com chave de ouro esta viagem. Tínhamos à nossa espera no hotel Berna, uma mensagem de Gianni Petino, dizendo que estava de regresso a Milão, após a sua viagem à Turquia e que estaria à nossa disposição.

De imediato o contactamos e acertamos mais um encontro texiano internacional para depois do jantar entre eu e o Gianni, com o testemunho e a participação do Dorival. Ficamos no quarto aguardando a chegada deste amigo que passamos a admirar através dos imensos contactos e mensagens que o mundo maravilhoso da Internet nos proporciona.

Assim que o Gianni chegou, descemos e um forte abraço marcou este encontro igualmente histórico e importante nas nossas vidas. Conhecer o grande Kit Carson do grupo BonelliHQ, o nosso querido amigo Gianni, era um sonho que se tornara realidade também e felizmente tudo se conjugou para isso.

Ficamos fascinados com a simpatia deste amigo, que tem um espírito jovem e alegre que a todos contagia e que fala um português fluente, para espanto nosso, pois já não tinha contacto directo com a nossa língua há uns vinte anos. Igualmente o Dorival adorou ter conhecido este italiano carinhoso que conquistou os nossos corações com a sua simpatia.

E temos a certeza que também o Gianni Petino adorou este encontro que estávamos ambos com receio de não se realizar por motivos imponderáveis, mas felizmente tudo deu certo. Para a despedida ainda estava reservada mais uma bela surpresa. O Gianni tinha trazido um Tex da sua viagem à Turquia e presenteou-me com esse exemplar turco, tendo feito uma dedicatória muito especial para registar este momento para todo o sempre.

Dia oitavoSábado, 21 de Setembro de 2002

Dia de regresso. Eu voltaria a Portugal e o Dorival ao Brasil. Tínhamos de estar no aeroporto de Linate logo cedo, pois o avião partia às sete da manhã. Aí aconteceu o único ponto negativo desta magnífica viagem: na hora de despachar as malas rumo a casa, tal como prevíamos, levávamos excesso de bagagem, motivado pelas generosas ofertas de que fomos alvo nesta visita à Sergio Bonelli Editore.

No total, nada mais nada menos do que dezassete quilos a mais… porém, felizmente para nós, o funcionário da TAP no aeroporto mostrou-se muito compreensivo para connosco e fez-nos pagar apenas cinco quilos de peso extra. Pagamos pelo excesso, mas ainda assim com um certo prazer, em virtude do tesouro que estávamos levando nas nossas malas. A viagem aérea decorreu sem incidentes e aproveitamos para pôr o sono em dia, pois o despertador acordara-nos às 5 horas da madrugada.

No aeroporto, à nossa espera, lá estavam as nossas esposas que nos esperavam ansiosamente, assim como a pequena Andreia, que nunca se tinha visto sem o pai por um único dia e pela primeira vez, foi logo uma semana de ausência!! Mas o tempo para as despedidas e para os agradecimentos por este sonho realizado era pouco, porque o avião rumo a São Paulo partia em breve.

As despedidas foram custosas porque passamos uma semana muito agradável e o Dorival, assim como o Júlio foram dois magníficos companheiros de viagem e ficou prometido um novo reencontro em breve. O editor brasileiro seguiu rumo a São Paulo e nós rumo ao nosso lar, doce lar, com todos os brindes que trouxe desta viagem de sonho…

(Para aproveitar a extensão completa das imagens acima, clique nas mesmas)

2 Comentários

  1. De fato uma viagem de sonho, da qual, mesmo sem estar presente participei, quando ganhei, através de você, Zecão, o Texone do Brindisi (I predatori del deserto) devidamente autografado pelo Sergio Bonelli.

    Abraços,

    Sílvio

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