Por Júlio Schneider*
Um dos símbolos de poder usados por Tex Willer quando a situação exige que se apresente como chefe de todos os navajos, nas suas vestes de Águia da Noite, é uma faixa usada na cabeça e que contém vários pictogramas. Esse símbolo sagrado é chamado pelos índios de wampum, garante ao seu portador a acolhida e o respeito devidos aos chefes em todas as tribos da América do Norte, e dele Tex lança mão para apresentar-se como emissário, especialmente quando deve dirigir-se a tribos hostis.
Essa, em síntese, é a descrição de tal objeto no maravilhoso mundo texiano criado pela mente fértil de Gianluigi Bonelli que, entre outras invenções, também deu fama à palavra pards, vocábulo por ele usado para referir-se aos parceiros Tex Willer, Kit Carson, Kit Willer e Jack Tigre, como forma de imediata identificação e também para distingui-los de outros grupos de parceiros comuns.
No mundo real, a palavra wampum tem um significado diferente e designa contas de conchas marinhas usadas pelos índios do nordeste norte-americano, sobretudo como ornamento, transformando-se em objeto sagrado ao entretecer-se as contas com fibras vegetais e animais para criar os chamados cintos wampum, usados para comemorar eventos históricos e datas especiais como casamentos. Em tempos antigos algumas tribos também usavam esses cintos ornados como uma forma de comunicação, em que a disposição das conchas representava uma mensagem específica. E, na época da colonização do continente, era comum os europeus usarem o wampum como moeda de troca ao negociar com os ameríndios. Seja como for, não se pode negar que era um objeto de prestígio.
Mas voltemos ao mundo de Tex, bem mais interessante que o por vezes sem graça mundo real: Águia da Noite recebeu o wampum das mãos do sogro Flecha Vermelha na aventura A Mão Vermelha (imagem que abre este texto, extraída do volume 7 da série brasileira Tex em Cores, da Editora Mythos), para que fosse bem recebido pelas tribos dakotas que iria visitar, e a partir daí o símbolo passou a estar presente em muitas histórias do nosso herói. Desde a sua primeira aparição, com o passar dos anos o cinto sofreu várias modificações, como se vê pelas imagens desta página, todas extraídas de capas das revistas de Tex. A primeira vez que o cowboy ostentou o wampum numa capa foi numa edição em tiras de 1960, da história O Signo da Serpente, e depois o objeto voltou várias vezes, até em edições recentes, e as imagens coloridas permitem observar que o wampum (além de já ter sido confeccionado em pano entrelaçado e em couro) já teve as cores castanho, amarelo, branco, vermelho ou cinza, e que já foi ornado com variados símbolos indígenas em preto e branco e coloridos, e até com letras do alfabeto!
Essa variedade na representação indica que os desenhadores criam novos símbolos cada vez que se põem a desenhar, mas algumas imagens são mais presentes, como o triângulo (certamente a indicar os teepees, as tendas), o raio (o poder do chefe), o olho (o saber, a visão privilegiada) e a águia estilizada (Águia da Noite, claro). Por fim, de se destacar que o cerimonial do uso do wampum não prevê um traje específico, visto que Tex já o usou com a camisa de pele (o seu traje de Águia da Noite), com a famosa camisa amarela (por vezes com colarinho, bolsos e punhos vermelhos em desenhos antigos de Galep) e até com o peito desnudo. Seja como for, é uma delícia para o aficionado texiano correr os olhos pelos magníficos retratos do wampum nas capas das revistas, como as aqui se veem nos traços de artistas como Galep, Ambrosini e Civitelli.
* Texto de Júlio Schneider publicado originalmente na Revista nº 4 do Clube Tex Portugal, de Junho de 2016.
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