CENSURA NOS QUADRADINHOS (inclusive em Tex)

“Selo” MG Garanzia Morale – Itália

“Selo” Comics Code – USA

Por João Marin*

No início dos anos 50 nos Estados Unidos, o aumento da delinquência juvenil levou o Senado norte-americano a estudar e promover debates sobre o assunto. Denúncias que chegavam à comissão do Senado sugeriam que, dentre outros, os “comics books” (revistas de Histórias em Quadradinhos) eram uma das responsáveis pela degradação moral dos jovens, que tinha se acentuado desde o final dos anos 40.

Artigos publicados pela imprensa condenavam os “comics” e contavam com o apoio de grupos de pais, educadores, igreja e psiquiatras. Começava uma era muito difícil para as revistas de histórias em quadradinhos, especialmente para as do género de “terror/crime” como: Tales from the Crypt, The Vault of Horror, Crime SuspenStories que eram publicadas pela EC Comics (Enterteiment Comics).

Um dos piores momentos foi quando o psiquiatra alemão (naturalizado americano) que trabalhava com jovens problemáticos, Dr. Frederic Wertham, lançou o livro “Seduction of the Innocent” (Sedução do Inocente). Na publicação o Dr. Wertham cita casos de jovens que supostamente teriam sido influenciados pelos “comics” a cometerem crimes, roubos e a adotarem comportamentos reprováveis moralmente.

A opinião pública foi conduzida e uma parte se solidificou contra os “comics”. As publicações passaram a ser perseguidas e eventos públicos de “queima” de revistas aconteceram em várias cidades. Temerosas, as editoras se uniram e formaram, em 1954, a CMAA – Comics Magazine Association of America (Associação Americana de Revistas em Quadrinhos) com o objetivo de definir parâmetros morais a serem aplicado às revistas para garantir uma qualidade aos leitores. Assim surgiu o “Comics Code” que definiu “padrões” a serem seguidos.

Collana del Tex nº 16 – Janeiro/1949 – Itália. Imagem original (não censurada). Marie Gold está
com um revólver e o vestido tem decote acentuado.

Collana Tex Gigante nº 2 – 2ª série – Abril/1964 – Itália. Reimpressão censurada. Marie Gold
aparece sem revólver e com vestido alterado e Tex é quem está atirando.

Segundo as editoras, as revistas que ostentassem o “Comics Code” (uma espécie de “selo” colocado na capa) estariam de acordo com o padrão definido pela associação (tratava-se na realidade de auto-censura aplicada na produção). Essa onda de censura nas histórias em quadradinhos também ocorria em várias parte do mundo.

Capa na versão original (sem censura) e na versão censurada (o revólver na mão de Tex foi retirado)

Na Itália, também em meados dos anos 50, deputados tentaram, por alguns anos, aprovar uma lei que obrigaria os editores a submeterem suas publicações a um controle prévio de uma comissão especial, antes de serem lançados. A proposta não chegou a ser convertida em lei mas deixou as editoras em estado de alerta. Algumas delas, incluindo a “Bonelli”, resolveram adotar um código de auto-censura para suas publicações. As edições de Tex passaram a trazer, na capa ou na sua parte interna, o rótulo de “Garanzia Morale” – MG – que identificava que a publicação estava de acordo com um código, o qual determinava padrões de moralidade a serem observados.

Desenho original – Collana del Tex 25 – tira 13 – 31 de Março de 1949: O vestido da “Estrella Miranda” apresenta-se bem decotado e com grande abertura na perna

Collana Tex Gigante nº 2 – 2ª série – Abril/1964 – Itália. Reimpressão censurada: Aqui o vestido foi alterado para cobrir melhor o corpo.

Com isso as histórias novas passaram a ser produzidas respeitando o “código”, e as que eram republicações tiveram que sofrer alterações em algumas imagens ou nos textos. Quadros que sugeriam nudez ou consideradas de extrema violência ou desrespeitosas para o padrão moral da época, eram alteradas. Isso fez com que um mesmo número da publicação tivesse mais de uma versão (a censurada e a não censurada).

Imagem de cima: Collana del Tex nº 42 – Julho/1949. No tiroteio Tex mata três homens (que
aparecem no 3º quadro). Imagem de baixo: Collana Tex Gigante nº 3 – 2ª série – Maio/1964. Itália.
Reimpressão censurada. Os três homens mortos foram substituídos por mãos e revólveres.

Foi o que aconteceu, por exemplo, com a “Tex Gigante” 2ª série. Os primeiros 14 números originais saíram “sem censura” e as reimpressões posteriores seguiram o código, ou seja, tiveram imagens e/ou textos alterados para se adequarem e ostentarem o selo “MG”.

Rodeo nº 104 Abril/1960. Editions LUG França. Capa censurada (As informações da data da publicação foram intencionalmente colocadas sobre o revólver de Tex para ocultá-lo).

Tex 1ª edição nº 48 Fevereiro/1975 Editora Vecchi BRASIL. Capa não censurada originária do Tex Gigante 2ª série nº 39 italiano

Tex Albo D’Oro nº 8 – 5ª série – 1958 ITÁLIA. Capa na versão original (sem censura)

Tex nº 243 Janeiro/1990 Editora Globo Brasil. Capa na versão censurada (o revólver do Tex encontra-se no coldre e o do cavaleiro foi substituído por uma espécie de “chicote”)

* Texto de João Marin publicado originalmente na Revista nº 10 do Clube Tex Portugal, de Junho de 2019.

(Para aproveitar a extensão completa das imagens acima clique nas mesmas)

Um comentário

  1. Excelente matéria!
    Mas eu não diria que a criação do Comics Code se deu por causa de delinquência juvenil. De acordo com livros sobre o tema, Wertham ficou curioso porque tantos jovens liam tantas dessas “revistas ilustradas”. Resolveu analisar, e chegou a conclusão que os jovens estavam lendo material inadequado que podiam ser “perniciosos e pecaminosos podendo desvia-los do bom caminho”. Assim surge “A Sedução do Inocente”.

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