MOURA BD, VÍTOR PÉON e TEX

Por Ezequiel Guimarães *

MOURA BD, VÍTOR PÉON e TEX

– Vocês viram? Tex esteve no MouraBD 2011.
– O quê? De jeito nenhum, Tex não esteve nesse evento. No MouraBD ele esteve em 2007 e não em 2011.

O diálogo acima (ou melhor, parte dele) ocorreu entre mim e outros dois amigos texianos quando falávamos sobre os belos eventos portugueses de banda desenhada (histórias em quadrinhos no Brasil), sobre a participação de Fabio Civitelli no mais recente (Salão de Viseu 2011), e relembrávamos os demais, e… bem, vamos começar do “início” para ficar claro do que estávamos falando.

(Antes uma explicação – já que para algumas pessoas que podem estar lendo agora esta matéria, o termo “MouraBD” não faça nenhum sentido. “MouraBD” é um dos mais importantes eventos de BD – HQ no Brasil – em Portugal, sendo oficialmente chamado de Salão Internacional de Banda Desenhada – Moura BD, e é coordenado pelo competentíssimo e simpaticíssimo Carlos Rico, filho ilustre da cidade alentejana que abriga o festival – e premiado cartoonista e ilustrador, com várias obras publicadas).

A presença do mítico Ranger Tex Willer tornou-se comum nos eventos lusitanos dedicados à banda desenhada a partir de 2005. Obviamente com o apoio total (e autorização) da casa-mãe de Tex, a gigante europeia “Sergio Bonelli Editore” através do seu saudoso editor Sergio Bonelli, que infelizmente nos deixou recentemente, partindo para as pradarias celestiais onde já cavalga ao lado de seu pai, o genial Giovanni Luigi Bonelli (criador de Tex). Mas essa participação deve-se (e muito) ao trabalho incansável em prol da causa texiana do fã português José Carlos Francisco. Que de tão fã, entrou em contacto com a casa brasileira de Tex (Mythos Editora) aquando da “mudança de bastão” da editora Globo para a editora da fogueirinha, pois nesse período Tex havia sumido dos quiosques (“bancas” no Brasil) portugueses, e o fã luso estava desesperado pois não tinha mais as aventuras da sua personagem favorita.

De lá para cá, muita coisa aconteceu, entre elas, é que ele se tornou o representante da editora tupiniquim em Portugal, criou junto com Mário Marques este conceituado blogue (referência na Internet), e passou a empenhar-se para levar Águia da Noite (como Tex é conhecido entre os indígenas norte-americanos em suas aventuras) para ser exposto e divulgado nos concorridos eventos portugueses (eventos que eram o motivo do assunto entre mim e os meus amigos). Já é público e notório que ele conseguiu o seu intento: a participação texiana ocorreu em vários eventos lusos a partir de 2005 (na cidade de Viseu); e nos eventos a partir de 2007 inclusive conseguiu levar autores italianos de Tex ! E ainda não satisfeito com o resultado, em 2011 José Carlos ainda conseguiu a façanha de conseguir a participação de Tex em dois eventos num só ano: em Beja, com a participação do fantástico criador de Ken Parker: Ivo Milazzo, e em Viseu, com a presença do “embaixador” de Tex, Fabio Civitelli. E o fanático português também conseguiu atingir a “quadra de ases” dos eventos portugueses, pois colocou TEX nos eventos das cidades da Amadora, Beja, Moura e Viseu, que são exactamente os 4 principais eventos ligados à BD na terra de Camões. Haja fôlego!!!

Mas, voltando ao diálogo do início do texto, eu falava com os meus amigos sobre essas participações texianas em eventos em solo luso, e afirmei que Tex tinha estado em 2011 em Moura. Infelizmente Tex não esteve no evento MouraBD 2011, apenas disse aquilo para ´provocar´ (no bom sentido) a curiosidade dos amigos texianos com quem eu falava (e por outro motivo que explico a seguir). Mas de todo o modo, Tex não esteve presente na forma tradicional de se estar, com autores, com exposição e com palestra, mas esteve de outra forma: esteve na bela revista especial do evento, pois há citações sobre o Ranger no belíssimo trabalho do renomado editor e autor de banda desenhada: Jorge Magalhães.

A revista em questão é “Vítor Péon e o ´Western´ de Denver Bill a ´Tomahawk` Tom”, edição da Câmara Municipal de Moura, com tiragem especial limitadíssima: apenas 300 exemplares (especialmente feita para a 17a. edição do Salão, esta de 2011).

É a segunda vez (e consecutiva) que Jorge Magalhães produz um belo trabalho sobre o género onde as aventuras do Ranger se desenrolam (o Western) para o Salão MouraBD. Na vez anterior, tinha mostrado o seu competente trabalho na edição 2007 do Moura BD – a 16a. edição do Salão, na (também) revista especial “O ´Western´ na BD Portuguesa” (uma edição magnífica) . Apesar de ter sido há 4 anos atrás (2007), citei ´trabalho consecutivo´ pois houve um hiato e o evento retornou agora em 2011.

Vítor Péon e o ´Western´ de Denver Bill a ´Tomahawk` Tom” é um exaustivo e detalhado trabalho de pesquisa, altamente informativo e fartamente ilustrado, com belíssimas ilustrações tanto em preto e branco, como também a cores. Detalha-se e comenta-se nas suas 48 páginas toda a fecunda carreira profissional do prolífero artista luso Vítor Péon (nascido em Luanda, em 3 de Abril de 1923; e que deixou-nos em 1991), desde os primórdios tempos d´O Mosquito até o final da carreira onde tornou-se seu próprio editor. Além d´O Mosquito, Péon também trabalhou para O Pluto, Diabrete, Mundo de Aventuras, Condor, Audácia, Tintin, Titã, Valente, Cavaleiro Andante, Camarada, e para editoras na Grã-Bretanha e na França.

Vítor Péon era apaixonado pelo Western (abordou o género diversas vezes), tanto que a sua maior criação é “´Tomahawk` Tom” uma série passada no mítico oeste norte-americano – sua estreia foi em 19 de Outubro de 1950, no número 62 da 1ª série do Mundo de Aventuras. O seu primeiro trabalho integral também é do género Western: “Falsa acusação”, que tinha o herói Denver Bill (trabalho sob nítida influência de Reg Perrott, notável artista da época). Quando foi lançado, “Falsa acusação” entusiasmou os leitores d´O Mosquito à época (1943), sendo a primeira aventura de cowboys no estilo realista-sério de um desenhador português. Vítor Péon foi um dos artistas mais talentosos da sua geração, ao lado de outro gigante: E. T. Coelho.

“Péon tinha um sentido inato da acção e do ritmo narrativo e soube também recriar o genuíno ambiente do Western, dosando com mão de mestre todos os ingredientes que fizeram, nas primeiras décadas do século passado, a glória do género e a delícia dos seus apreciadores”, sintetiza Jorge Magalhães, sobre a forma de trabalhar do grande artista luso.

E como esta revista especial do Salão MouraBD fala de Western, ela não podia deixar de fazer referência à mais longeva personagem desse género no mundo (falando-se em BD) …TEX WILLER ! Isso mesmo, ele também é citado no texto. Portanto, de uma forma ou de outra, Tex também esteve no evento MouraBD 2011. Não da forma que queríamos, mas esteve na revista especial do evento.

Enfim, “Vítor Péon e o ´Western´ de Denver Bill a ´Tomahawk` Tom” não deve faltar na BiblioTEX dos aficionados pelo justiceiro, pois além de fazer referência ao herói da BD italiana, também trata do género sob o qual desenvolvem-se há mais de 60 anos, as espectaculares aventuras do valoroso justiceiro bonelliano: o mítico, aclamado e cultuado Western. Imperdível!

Esperamos que o próximo MouraBD veja o regresso do Ranger a Portugal.

(Mas independente de Tex estar ou não no próximo evento, lembre-se: o Salão MouraBD também é imperdível! Sempre tem artistas e exposições, portugueses e internacionais, todos de altíssimo nível, da altamente interessante arte sequencial; contando também com diversas outras actividades para os visitantes).

*Agradecimentos especiais ao Carlos Rico.

(Para aproveitar a extensão completa das imagens acima, clique nas mesmas)

14 Comentários

  1. O meu obrigado ao Ezequiel Guimarães pelas referências que muito me sensibilizam aos dois trabalhos que fiz sobre o “western“, com o patrocínio da Câmara Municipal de Moura. Mas se não fosse o precioso incentivo e a generosa amizade do Carlos Rico, principal organizador do MouraBD, desde o seu início, talvez esses trabalhos nunca tivessem visto a luz do dia.
    Ele tem sido um dos mais dinâmicos divulgadores da Banda Desenhada neste país e com uma perspectiva abrangente, fazendo pontes entre gerações, pois não é lícito exaltar os valores actuais e as promessas do futuro renegando a herança do passado, na qual se inclui Vitor Péon e a sua vasta obra.
    Portanto, devo-lhe a oportunidade de ter publicado estes trabalhos sobre o género que mais aprecio, tanto na BD como na literatura e no cinema. Uma dívida de gratidão que só posso saldar com a minha amizade e apreço pelo Carlos Rico, quer como confrade bedéfilo quer como artista e pessoa de óptimas qualidades.
    Quanto a Tex era absolutamente obrigatório que, num ensaio sobre o “western“, ele e os seus geniais criadores não fossem esquecidos, tanto mais que, curiosamente, um dos mais populares heróis de Péon (que também era amigo de Kit Carson) chamava-se Texas Moore e nasceu um ano antes de Tex Willer!
    O meu reconhecimento é extensivo ao José Carlos Francisco pelo apoio que tem dado neste blog a tudo o que se relaciona com o “western” e com os autores nacionais, pois também ele, além de ser um grande fã do género, tem uma noção abrangente da banda desenhada como meio artístico e de comunicação de massas.

  2. Caro Jorge:
    Os seus elogios são, naturalmente, exagerados pois, por mais mérito que me queira dar, não fora o rigoroso e excelente trabalho de investigador e de pesquisa do Jorge nenhum dos trabalhos que a Câmara de Moura lhe publicou teriam visto a luz do dia.
    No fundo, tudo se deve à conjugação entre dois factores: ao trabalho de grande qualidade do Jorge (reconhecido por todos) e à vontade da Câmara Municipal de Moura em editar esses textos! Essa é que é a pura verdade!
    Quanto à amizade que nos une, se bem se recorda ela começou em 2000, quando o Jorge visitou o Moura BD pela primeira vez, num ano em que o tema do salão era o… “Western” (pois claro!). A partir daí, comecei a descobrir que o Jorge tinha gostos muito parecidos aos meus, no que à BD diz respeito. Isso tornou-se claro logo nas primeiras conversas, onde falávamos de personagens como Garra D’Aço, Sargento Jim Canadá, Cariboo, Kalar, Rory MacDuff, Ogan, Major Alvega ou Gringo (personagens hoje completamente esquecidos pelas novas gerações mas que ainda perduram na memória de muita gente da geração do Jorge e da minha). Falávamos também de alguns autores (ingleses, americanos, espanhóis e italianos, sobretudo) que fazem as nossas delícias enquanto leitores. E, em determinado ponto das conversas, começámos a falar da possibilidade de se fazerem pequenas edições com o material que o Jorge tinha na gaveta ou até com material que o Jorge preparasse propositadamente para nós.
    Foi assim que começámos uma parceria que já leva mais de uma década e que continuará, certamente, no futuro, como parece ser o caso em 2012 (posso dizer que estamos neste momento a começar um novo projecto – que não posso revelar por não estar ainda completamente aprovado – que promete ser mais um êxito).
    Grande abraço, Jorge!
    Já agora, um abraço também para o Ezequiel Guimarães, cuja simpatia e detalhe nos seus artigos é bem evidente! Mais um artigo de grande qualidade a provar que este blogue do Tex reúne os melhores especialistas na área da BD, do colecionismo e do “Western“. Parabéns ao Zeca por saber rodear-se das pessoas mais capazes para colaborar no blogue!

  3. Claro que não me esqueço, amigo Carlos, desse nosso primeiro encontro, nem de todos os convívios que desfrutei em Moura, cidade que até então não conhecia e à qual eu e a Catherine voltamos sempre com prazer, como aconteceu este ano.
    Em 2000 eu começava já a sentir o “stress” da crise que a Meribérica atravessava e temia pelo futuro das “Selecções BD”, a revista que coordenei desde o 1º número da 2ª série. Mal sabia que o próprio futuro da editora estava em risco. Foi mais uma experiência traumática, depois de ter assistido também (parece que já é sina!) ao fim da Agência Portuguesa de Revistas e da Futura.
    Portanto, a colaboração consigo e com o Salão de Moura ajudou-me, e muito, a vencer o desânimo e a apatia provocados por essa crise e pelo fim de uma carreira profissional já com 30 anos quase completos à data em que saí da Meribérica.
    Claro que nunca me desliguei totalmente da BD, continuando a escrever, a traduzir e a editar alguns fanzines, mas entre os trabalhos que mais satisfação me deram, até pela forma como foram apresentados a partir de determinada altura, contam-se os que a Câmara Municipal de Moura já editou. E é com o mesmo entusiasmo (embora o vigor intelectual e físico, infelizmente, vá diminuindo de ano para ano) que continuarei a colaborar, dentro do possível, com o Carlos Rico e o Moura BD. Projectos não faltam, assim os fados nos sejam propícios, não é, amigo Carlos?
    Também tenho de recordar aqui que quem falou ao Carlos Rico da minha predilecção pelo “western” foi o José Pires, assim surgindo a ideia, que se concretizou nesse ano 2000 de boa memória (no que à BD diz respeito) de um trabalho sobre os “cowboys” na BD portuguesa, inserido no tema do Salão. Trabalho esse publicado de forma ainda modesta, mas que não tardou a esgotar-se, dando azo a que em 2007 saísse uma nova edição revista e aumentada e com uma apresentação fora de série, que até deu nas vistas pelas bandas da Amadora.
    Ora o que me faz sentir uma grande dívida de gratidão para com o Carlos Rico e o Moura BD é este facto que me parece tão evidente como o custo de vida que nos aflige cada vez mais: ter-me-ia surgido alguma vez a oportunidade de publicar esses trabalhos noutro lado e com a mesma qualidade gráfica? Claro que não. E fico muito satisfeito por haver quem os aprecie, mesmo leitores de outras gerações que, em muitos casos, pouco sabem sobre esses heróis do passado referidos pelo Carlos, que hoje, de facto, estão esquecidos, mas que tantos e tantos momentos de diversão proporcionaram à rapaziada que leu o “Mundo de Aventuras“, o “Jornal do Cuto“, o “Tintin“, “O Falcão“, num tempo em que não faltavam revistas nas bancas para promover o gosto pela Banda Desenhada e pelas personagens que povoavam a nossa fantasia, heróis populares e sem preconceitos, que apreciávamos pelo seu valor intrínseco e não pela aura artística dos seus autores, muitos deles desconhecidos. Bons tempos… mas, entretanto, a BD evoluíu de forma notável noutros sentidos, e ainda bem. Só que, como eu sempre defendi, a herança do passado não pode ser desprezada nem esquecida. E sei que o Carlos é um dos que comungam comigo nessa defesa.
    Um grande abraço para ele e outro para o Zeca!

  4. Legal, o ranger está em todas. Parabéns ao responsável do evento, ao autor da revista, e ao autor da matéria aqui no blog.

  5. Muito boa matéria. Pena que nos eventos no Brasil não se tenha os mesmos tipos de materiais e revistas que são comuns em Portugal, e olha que lá Tex nem é publicado. A editora de Tex no Brasil deveria tratar melhor os eventos do ranger.

  6. Gostei muito dessa matéria! Os eventos em Portugal devem ser realmente muito bons. Concordo com o Pedro, já está na hora de termos eventos como este no Brasil.

  7. Prezado Jorge Magalhães, muito obrigado pelas suas palavras e seus interessantes e esclarecedores comentários aqui no blog. Todos nós, admiradores do western, temos que agradecer, e muito, seu competente trabalho. Quanto ao Carlos Rico, realmente é uma pessoa especial, e sempre tem que ser parabenizado pelo eficiente trabalho que realiza em diversas áreas.
    Grande abraço.

  8. Prezado Carlos Rico, fico muitíssimo grato pelas suas palavras. Fico contente que meus pequenos e simples textos tenham agradado um profissional de alta estatura, como você. Agradeço também seu interessante e informativo comentário aqui, e agora fiquei curioso (e ansioso) para que 2012 chegue logo.
    Grande abraço e obrigado pela amizade e atenção para comigo.

  9. Prezados Nelson, Pedro e Marcos, agradeço os elogios e vossa participação aqui no blog. Obrigado.

  10. Vi hoje essa revista do Western na BD portuguesa e gostei muito. Muito bem pesquisado, parabéns ao autor.

  11. Esse tipo de material faz parte de alguma série? Tem mais fora esses dois volumes que vocês falam aqui?

  12. Interessante essa edição, deveria ter mais material desse tipo sobre faroeste. E deveria ser publicado no Brasil.

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