As Leituras do Pedro – Deadwood Dick: Negro como la noche, rojo como la sangre

As Leituras do Pedro*

Deadwood Dick: Negro como la noche, rojo como la sangre
Baseado na novela Soldierin, de Joe R. Lansdale
Michele Masiero (argumento)
Corrado Mastantuono (desenho)
Panini Comics
Espanha, 26 de Setembro de 2019
195 x 259 mm, 144 p., cor, capa dura
ISBN: 9788491678885
17,00 €

Negro, bem negro

Num catálogo celebrizado pelo western – com Tex à cabeça, claro, mas também com Ken Parker, Zagor, Mágico Vento… – a Sergio Bonelli Editore propôs mais recentemente Deadwood Dick – agora em edição da Panini espanhola – que, aparte a temática comum, difere em tudo das restantes séries citadas, ou não fosse protagonizado por um negro, sendo negro também o humor que a caracteriza.

Deadwood Dick é uma adaptação das novelas do escritor norte-americano Joe R. Lansdale, objecto de uma longa entrevista publicada no dossier que encerra este livro.

A sua acção decorre no período subsequente à Guerra Civil norte-americana, que terminou com a vitória do Norte sobre o Sul e – teoricamente… – com o fim da escravidão e da discriminação dos negros e inspira-se – muito livremente –  em acontecimentos da vida de Deadwood Dick, aliás Nat Love, alguém que viveu  naquela época.

O seu protagonista é um negro – com plena consciência do seu estatuto e das consequências que tal facto lhe acarreta – que, após um mal-entendido, é obrigado a fugir para não ser sumariamente linchado (por brancos). Após um encontro com Cullen, outro negro em busca de rumo para a sua vida, acabam por se alistar no exército, num esquadrão inteiramente composto por negros – embora comandado por um branco…

A aprendizagem do novo ofício, entrecruzada com acontecimentos do passado e pesadelos recorrentes, que no seu conjunto ajudam a definir o momento presente e a conhecer a personalidade de Deadwood Dick, vai-nos sendo apresentada numa narrativa feita muitas vezes em off, na primeira pessoa, de forma mordaz e irreverente, não se furtando o protagonista a comentários provocadores ou mesmo a questionar o leitor. Este tom (negro) bem-humorado que o livro assume, não inibe os autores de incluírem sexo e (principalmente) violência sempre que acham necessário, o que contribui para acentuar um tom mais pesado da narrativa.

Magnificamente desenhado por Corrado Mastantuono – cuja arte, soberba no uso de fortes contrastes a branco e negro merecia ser apreciada sem cores, tal como foi inicialmente publicada (e mostro abaixo) – e com a questão do racismo sempre em fundo – o que não significa que esta seja uma leitura para levar demasiado a sério – vamos acompanhando o quotidiano fastidioso daquela companhia militar, numa zona deserta e pacífica, onde os índios raramente se deixam ver. Em termos de construção, uma referência para a boa gestão do ritmo imposta ao livro que, pelo facto de abrir com uma situação limite, em que o protagonista está prestes a ser morto por um pele-vermelha, e cujo desfecho apenas conheceremos dezenas de páginas mais tarde, provoca uma maior apetência pela leitura, durante a qual Deadwood Dick dificilmente deixará de conquistar os leitores, sejam eles apreciadores ou não de bons westerns.



*Pedro Cleto, Porto, Portugal, 1964; engenheiro químico de formação, leitor, crítico, divulgador (também no Jornal de Notícias), coleccionador (de figuras) de BD por vocação e também autor do blogue As Leituras do Pedro

(Imagens coloridas disponibilizadas pela Panini Comics Espanha; imagens a preto e branco disponibilizadas pela Sergio Bonelli Editore; clicar nelas para as apreciar em toda a sua extensão)

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