As Leituras do Pedro: Tex Edição Histórica #96 – El Muerto

As Leituras do Pedro*

Tex Edição Histórica #96 – El Muerto
Guido Nolitta (argumento)
Aurelio Galleppini (desenho)
Mythos Editora
Brasil, Maio de 2016
135 x 175 mm, 184 p., pb, capa mole
R$ 19,90 / 6,00 €

Introdução

A presença, actualmente, nas bancas e quiosques nacionais de Tex Edição Histórica #96, com a história completa El Muerto, é o pretexto para evocar uma das mais emblemáticas e apreciadas histórias do ranger.

Segunda história escrita por Guido Nolitta (pseudónimo de Sergio Bonelli), foi desenhada por Aurelio Galleppini e está agora disponível na colecção Tex Edição Histórica, que republica, completas, as histórias originalmente publicadas em Tex Colecção – que por sua vez publica as histórias de Tex pela mesma ordem cronológica que saíram em Itália.


Resumo

Esta aventura começa quando Jack Tigre e outro navajo regressam de uma viagem com cobertores e provisões para a tribo. Aproximam-se de um pequeno acampamento onde aparentemente são recebidos com hospitalidade mas rapidamente o grupo mata o indígena e espanca violentamente Tigre. No final, o chefe, uma personagem com a cara toda retalhada, que se intitula El Muerto, diz-lhe para transmitir um recado a Tex: se quer saber a razão do ataque, terá que se encontrar com ele no cemitério de Pueblo Feliz, daí a uma semana. Dias depois, uma diligência que transporta Kit Willer para se encontrar com o pai, é assaltada e o jovem baleado para transmitir o mesmo recado.

Tex não tem qualquer lembrança de se ter cruzado com a estranha personagem, mas dispõe-se a comparecer ao encontro.


Desenvolvimento

Considerada uma das melhores histórias de Tex, El Muerto, originalmente datada de Agosto/Setembro de 1976, faz jus à sua fama.

Como quase sempre acontece nestes casos, apresenta um Tex menos infalível – por isso mais humano – que tem que correr atrás dos acontecimentos, desconhecendo quem orquestra tudo e porque o faz. E dando a ideia que chega sempre um pouco tarde ou que não consegue virar o rumo aos acontecimentos, mesmo quando consegue antecipar os movimentos do seu misterioso adversário, como na chegada a Sunsetville. Nessa “falibilidade”, Tex vê os seus amigos serem feridos espancados ou mesmo mortos, sem conseguir inverter as situações, algo raro nas suas histórias.

Mesmo a forma como, a caminho do lugar do encontro final, consegue derrotar os capangas de El Muerto – apenas cinco… -, após a emboscada que eles lhe prepararam, precisando para isso da ajuda providencial de Tigre, apenas reforça esse (estranho e incomum) lado humano do ranger e cria mais expectativa para o duelo final, aumentando a estranha aura de El Muerto.

Este, é uma personagem bem delineada, um dos mais marcantes vilões que Tex enfrentou, não tanto pelos seus actos, mas pela forma como se impõe ao ranger quase até final. Um vilão movido por um insano (?) desejo de vingança, que nem as explicações do ranger, no cemitério, conseguem demover. O que só contribui para acentuar o seu lado trágico e, surpreendentemente, para lhe dar consistência e credibilidade.

A tensão acumulada ao longo das pranchas, aumenta ainda mais quando Tex e El Muerto finalmente se encontram cara a cara no cemitério que este escolheu para se desvendar e ao segredo que há anos carrega. De uma forma (invulgarmente) leal e correcta, posicionando-se no capítulo moral no patamar que (apenas) Tex costuma ocupar, o que reforça ainda mais o seu impacto. Só dessa forma, aliás, seria possível o longo flash-back, em que um e outro vão completando a história – e em que finalmente são desvendadas as razões que motivam o bandido.

E se a explicação é longa, que dizer do duelo final que ocupa três (demoradas) pranchas e finalmente possibilita o aliviar da tensão acumulada. Pelo menos para o leitor, porque Tex, se obtém o esperado resultado final, ainda precisa de se libertar dela contra o relógio que testemunhou o dramático confronto…

Guido Nolitta, construiu com mestria a trama, que prima em conduzir num crescendo, sem pontas soltas nem incongruências, encaixando nela perfeitamente a narrativa “antiga”, afastando quase completamente o Tex heróico e infalível que tantas vezes custa a “engolir”.

A seu lado, esteve um Galep na posse de todas as suas (muitas) qualidades, com um traço vibrante e dinâmico como sempre, especialmente detalhado e completamente à vontade cenários interiores ou nas paisagens do velho oeste, no retrato de homens ou animais, de cenas calmas ou de acção intensa.


A reter

– A manutenção do mistério da identidade de El Muerto ao longo de 130 das quase 200 páginas da narrativa.

– A forma como Tex é desta vez um peão na história, seguindo o curso dos acontecimentos, não o impondo como é habitual.

– A consistência e a credibilidade de El Muerto.


Menos conseguido

– A história ganharia ainda mais se a presença de Paço Ordoñez na fatídica cabana fosse revelada apenas no final da narrativa em flashback.

– A reprodução a partir de uma versão colorida.

– A infeliz capa, que desvenda o final (apesar de tudo espectável) de uma história que tem no suspense um dos seus grandes trunfos.

Curiosidade

– Existe uma versão semi-animada desta banda desenhada que pode ser vista de seguida:

*Pedro Cleto, Porto, Portugal, 1964; engenheiro químico de formação, leitor, crítico, divulgador (também no Jornal de Notícias), coleccionador (de figuras) de BD por vocação e também autor do blogue As Leituras do Pedro

(Para aproveitar a extensão completa das imagens acima, clique nas mesmas)

2 Comentários

  1. A ideia do relógio de bolso a tocar durante o duelo decisivo é claramente inspirada no western-spaghetti “Por Mais Alguns Dólares“, de Sergio Leone.

  2. Essa é uma história adorada por muitos leitores, talvez até pela maioria, mas em minha opinião é uma história normal, que “entrega” o final logo na capa.

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