As Resenhas de Rafael*
Dylan Dog nº 3 – As Noites da Lua Cheia
Roteiro: Tiziano Sclavi
Arte: Guiseppe Montanari e Ernesto Grassani
100 páginas
Editora: Record
Dylan Dog nº 31 – A Última Lua Cheia
Roteiro: Tiziano Sclavi e Mauro Marcheselli
Arte: Guiseppe Montanari e Ernesto Grassani
100 páginas
Editora: Mythos
“Dylan Dog” é uma série marcada pelo subtexto e pelas alegorias fantasmagóricas em suas tramas, muitas vezes fazendo uso do sobrenatural para refletir sobre a humanidade falível de seu protagonista, questionamentos filosóficos, temáticas sociais relevantes, entre outros assuntos.
No entanto, o terror simples e direto, às vezes, assume as rédeas também, dando um sentido literal à alcunha de Dylan como “detetive do pesadelo”. Logo em sua terceira aventura, publicada originalmente em 1986 na Itália e editada 5 anos depois no Brasil, pela Record, o personagem deparou-se com um clássico do gênero: o lobisomem.
Em “As Noites da Lua Cheia”, escrita por Tiziano Sclavi, Dylan e Groucho se deslocam de Londres para o interior da Alemanha, onde pretendem investigar o desaparecimento de uma estudante, a pedido de sua família. Logo em sua chegada, nos arredores da Floresta Negra, nosso protagonista avista um homem nu, a correr por entre as árvores. Como seria possível viver em tamanho isolamento?
Na sequência, ele se dirige para a escola onde Mary Ann Price estudava, sendo recebido bruscamente pela diretora, Helga Blucher. Madame Blucher se incomoda com a presença de Dylan no local, ainda que reconheça não haver qual rastro do paradeiro de Mary Ann. Esse desconforto, por sinal, paira sobre Wolfsburg, vilarejo próximo para onde ele vai se abrigar à noite.
Nesse ambiente tenebroso e hostil, onde é recebido à bala, Dylan ouve os rumores sobre os “forasteiros”, estranhos que aparecem em Wolfsburg nas noites de lua cheia, sequestrando mulheres e partindo para a floresta. Com a ajuda de Alexandra, uma aluna de madame Blucher, Dylan Dog vai juntando as peças do quebra-cabeças, intuindo suspeitas que o aproximam perigosamente da verdade.
Não por acaso, os envolvidos no episódio macabro dão as caras e decidem eliminar a ameaça que a investigação do nosso protagonista representa. Atraído pela súbita aparição de Mary Ann, como que vinda direto das trevas da Floresta Negra, Dylan descobre a verdadeira natureza de Helga Blucher: uma maga, que se serve da obediência dos lobos transformos para realizar experiências que levem a licantropia a um novo patamar, infundindo na relação das criaturas com as jovens de Wolfsburg sequestradas, incluindo Mary Ann.
O embate entre a bruxa e Dylan é feroz e marcado pela manifestação intensa de poderes demoníacos, mas se encerra com a morte de Helga e o resgate da jovem estudante de volta para Londres. Mas o mistério é sugerido nas páginas finais, com a imagem de um bebê, vivendo entre lobos na floresta. É esse o gancho que Sclavi, co-escrevendo com Mauro Marcheselli, retoma em “A Última Lua Cheia”, editada pela Mythos em 2022, no número 31 da 2ª série regular do personagem.
O cenário é Londres, mais especificamente, em Hyde Park, onde a presença de um lobisomem tem levado o terror à população. Dylan recorda o caso passado na Alemanha, e tenta desvendar o mistério, ainda que seja “distraído” pela companhia de Dea, uma protetora dos animais que critica o uso de cães farejadores pela polícia e que involuntariamente se envolve na investigação.
A ideia de um lobisomem à solta na capital inglesa é interessante, tendo inclusive gerado um dos clássicos cinematográficos do gênero (mencionado no roteiro), mas aqui é mal executada. O texto não encontra seu tom, oscilando entre uma pretensa comédia romântica, com os diálogos espirituosos e cheios de humor entre Dea e Dylan, e o terror tradicional, ao mostrar a verdadeira identidade da fera e suas táticas de ataque, espalhando a morte por Londres.
Mesmo com o retorno de Mary Ann, aqui retratada como uma mulher traumatizada pelos eventos na Alemanha, a história não avança de forma satisfatória. Ainda que o ato final amarre as pontas soltas,esclarecendo a relação entre as duas tramas, fica a impressão de um enredo irregular, algo raro na longeva série de Dylan Dog.
* Rafael Machado é professor, escritor e jornalista. Publica suas resenhas no perfil do instagram “Leituras do Exílio“, além de colaborar com o sítio “Quinta Capa”.
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