Zagor Gigante – O Castelo no céu

Por Sílvio Raimundo

Série – Zagor Gigante
Título – O Castelo no Céu
Argumentista – Moreno Burattini
Desenhador – Marco Torricelli
Capa – Gallieno Ferri
Tradução – Júlio Schneider
Adaptação – Dorival Vitor Lopes
Letras – Sílvia Lucena

Sinopse: Em Darkwood, enquanto Drunky Duck tenta acender uma fogueira, Chico lê um caderno há pouco encontrado na floresta, contendo um romance capa e espada. Zagor, ao seguir as pegadas do cervo que está caçando, depara-se com o escritor e dono do caderno, Wilbur Macken, que fora aprisionado no alto de uma montanha, por uma espécie de pterodátilo gigante.

Considerações – Desenhos

A capa, desenhada pelo idealizador gráfico da personagem, do alto dos seus 82 anos, é dinâmica, e mostra Zagor correndo, indo ao encontro às sombras de uma horda, que pode muito bem simbolizar a sua entrada triunfal na série gigante da SBE.

A arte do miolo desse primeiro e histórico “Zagorone” é do veterano Marco Torricelli, que estreou na SBE em 1986, exactamente com o Zagor #253 – La rivolta dei Mohawks, ainda inédito em Portugal e no Brasil. Ele é dono de um estilo detalhista, com um domínio pleno do “chiaro scuro”.

Dentre as suas técnicas de arte finalização, estão a utilização de pontinhos e tracejos que dão volume e meios-tons aos desenhos, e também as reticulas. Isso tudo pode ser visto no volume #17 da série italiana da personagem Dampyr, que ele desenhou com maestria. Porém, neste álbum de estreia da nova série do Zagor, o artista emula à exaustão o Ferri.

Comummente os artistas inspiram-se nos medalhões de um staff para conceber uma personagem crível para os ávidos e críticos leitores. Ticci é frequentemente usado nesse sentido pelos novos desenhadores Texianos, mas, esse não é o caso do Torricelli, que faz o Zagor, o Chico e tudo o mais, exactamente como o Ferri, isso aconteceu também no Tex #503, que marca a estreia do artista no staff do Tex, ali ele desenha Tex e Carson, igual ao que fazia o Galep. Há quem veja nisto uma homenagem, eu não discordo, mas, afirmo categoricamente que sinto falta do Torricelli.

O artista cometeu alguns lapsos que passaram despercebidos na revisão:
Página 81, segunda vinheta – Ao correr para salvar o filho do ataque da centopeia gigante, a Mãe está com um par de botas de couro, ao reaparecer na quarta vinheta da página 81, no pé esquerdo aparece um mocassim e no direito uma bota.
Página 138, terceira vinheta – Ao surpreender o “vilão” escondido, Zagor segura a sua machadinha e ela não tem a empunhadura clássica, com o X entalhado.
Página 197, primeira vinheta – As tiras de couro da bota esquerda do Zagor não aparecem.

Considerações – Roteiro

Zagor é uma personagem que se adapta bem a qualquer tipo de história, cabendo aos seus leitores definirem aquelas que mais lhes agradam. Esta, que marca a estreia da série gigante, é uma fantasia surreal, com direito até a centopeias gigantes. Ela mistura em um só lugar três dimensões: A do escritor Wilbur Macken, a do vilão Koontz e de Zagor e, gera a dúvida de qual delas é real e qual é fantasia?

Burattini, que de leitor zagoriano passa a argumentista em 1991 com o álbum #310 – I malefici di Diablar, publicado no Brasil pela Mythos no Zagor Extra #58, tece uma história que em uma leitura descompromissada é diversão barata e rápida, mas, que se nos demorarmos um pouquinho mais, iremos ver alguns pontos que em nada são fantasiosos.

Logo que é salvo por Zagor, Wilbur narra as suas vicissitudes de escritor que quer ter a possibilidade de ser publicado e levado a sério, ao escrever sobre mundos e seres que só existem na sua imaginação. Ele fala do como os editores descartam os seus textos e lhe impõem regras. Alguém aí conhece a história de perseverança do Burattini, até ter um texto aceito pelo Bonelli? No decorrer da leitura o texto mostra-nos a força que um escritor tem. Ao nos impor as suas ideias ele transforma a nossa realidade, invadindo-a com o seu mundo irreal, mas crível. Paradoxal isso, não? O facto, é que tanto o escritor quanto o leitor, pactuam da ideia de se permitirem acreditar naquilo que escrevem e lêem e isso altera a realidade, pois sentimo-nos naqueles lugares e com aquelas “pessoas” que estão presas na diagramação das páginas, enquanto nos deliciamos no solitário mundo da leitura. Metaforicamente é isso que o Burattini nos mostra, ao alterar a “realidade” de Darkwood com a chegada de Koontz caído das páginas do romance de Wilbur Macken.

Por fim, ele descreve a luta do escritor consigo mesmo, ao enfrentar diariamente as suas personagens. O que fazer para que um não se transforme no outro e assuma o seu lugar? Quem era real, o criador Wilbur Macken, ou a criatura, Koontz? Zagor e a sua Floresta Negra a gente sabe que são reais, não é?

O único deslize que posso apontar do Burattini foi fazer o Zagor perder o revólver nas páginas 44/45 e, fazê-lo reaparecer sem nenhuma explicação na página 55. De onde a arma caiu seria impossível encontrá-la novamente.

Este álbum, diferentemente daqueles da série Texiana, não traz uma entrevista com o desenhador. Traz um pedido de desculpas de Sergio Bonelli, por ter deixado o seu “filho” por tanto tempo sem uma edição gigante e, ele quase que oficialmente elege o Burattini como o tutor da sua cria, ao descrevê-lo não apenas como roteirista, mas, como curador, com direito a intervenções técnicas, seja com os desenhadores quer com os escritores e, também ao defini-lo como o mais preparado para lidar com os leitores, que hoje em dia são muito mais exigentes. Burattini também nos brinda com um texto situando o leitor na vida editorial da personagem, ao longo dos seus primeiros cinquenta anos.

Seria coincidência, que poucos meses à frente deste lançamento que marca meio século de vida do Espírito com a machadinha, exactamente no dia 26 de Setembro de 2011, o Sr. Sergio Bonelli, também conhecido por Guido Nolitta e criador do Zagor, deixe a sua única personagem ainda em publicação, órfã?

Não sou um Zagoriano, tenho uns poucos números especiais da Mythos, alguns outros italianos e espanhóis, um livro temático que foi presente de um grande Zagoriano, um boneco de chumbo e um pin. Tanto é que não achei justo figurar na lista publicada pela Mythos, mas, diante de tudo que este álbum representa, principalmente depois da morte de Sergio Bonelli, eu estaria imensamente arrependido de não tê-lo adquirido.

Só pelo seu marco histórico, em uma escala de uma a cinco, eu lhe daria cinco machadinhas.

10 Comentários

  1. Oi ZR!

    Vindo de vc, posso crer que realmente escrevi algo bom. Fico feliz!
    Ah, sabes quem é o Zagoriano que me presenteou com o livro temático do Zagor, não?

    Abraços,

    Sílvio Introvabili

  2. Parabéns, excelente postagem!!
    Creio que muit@s Zagorian@s como eu, virão curtir essas palavras e o destrinchamento do álbum Zagor Gigante #01 que fez, ficou excelente!
    Parabéns!
    Valeu por compartilhar conosco mais algumas visões do alto do mosteiro, o que nos circunda em Darkwood!

  3. A 1ª vez que li uma HQ do Espírito da Machadinha corria 1987, então com meus 11 anos de idade e, graças a um primo que me emprestou aquele formatinho, já pela RGE, fui apresentado ao universo zagoriano, quando o nosso herói enfrentava as vilanias do pirata Capitão Serpente, a sequência da edição anterior e que também continuava na seguinte (isso é o que eu chamo de pegar o bonde andando, hein?). Na época, nunca soube como aquela história terminava. Só vim a descobrir há alguns anos atrás, quando consegui finalmente completar minha coleção de Zagor da RGE (tenho toda a da Record e uma boa parte da Mythos). A partir daí, Zagor passou a ser apenas uma lembrança, de um herói como eu nunca tinha visto outro igual (mal sabia eu do que ele era – e é – capaz…), até que, no início do século XXI, me deparei nas bancas com Zagor # 10, da Mythos – Os Cavaleiros do Santo Graal – e, fã de Indiana Jones e de Camelot 3000 como sempre fui, nem sequer pisquei e comprei aquela edição no ato. Era a oportunidade que estava me aguardando pra que eu voltasse ao Mundo de Darkwood, dessa vez, sem volta ou nem sequer o mínimo “intervalo”. Daí pra cá, não parei mais de ler (nem de colecionar) os fantásticos épicos de terror/fantasia/ficção científica/western/e sabe-se Manitu o que mais, daquele que, pra mim, é o protótipo definitivo do que significa a palavra Herói. E essa conclusão a que eu cheguei só se confirmou ainda mais quando pus meus olhos naquela que considero uma das aventuras mais memoráveis de Zagor, a da edição # 8 – “A Última Vítima”, também da RGE (agosto/1985), continuação de uma aventura que já vinha se estendendo desde a edição # 6 (Mensagem de Morte), quando Zagor assume o papel de guia de uma caravana de nobres europeus que estavam praticando a caça predatória de bisontes e que, com isso, ficaram sob a mira da tribo kiowa, para quem os animais eram sua principal fonte de alimento, liderada pelo cruel Winter Snake. A certa altura, Zagor se oferece como refém aos indígenas, na condição de que a caravana pudesse retornar em segurança a território civilizado, num ato de altruísmo que, por si só já o classificaria como um homem acima da média. Mas, o que nunca me esqueço é a sequência em que, depois de ser amarrado no poste de tortura, ele é chicoteado inúmeras vezes, até que Winter Snake convoca seus maiores guerreiros para que comecem a usar o punhal na sua carne. Então, a cada um que se aproxima para tão sangrenta tarefa, Zagor os chama pelo nome e vai dizendo como salvou um deles de se afogar e a outro de ser morto pelo ataque de um puma ou de uma tribo rival, e assim, um a um, todos hesitam e desistem de seu intento, pois nenhum tem coragem de agredir aquele que sempre foi um amigo, um homem honrado e um defensor dos peles vermelhas. Juro que, muito mais do que qualquer monstro, ameaça sombria ou vilão bizarro que ele tenha enfrentado em sua carreira de protetor dos povos da floresta, essa história me fez engolir em seco. Se esse não é o maior exemplo do que realmente representa um verdadeiro herói, na mais pura concepção dessa palavra, então não sei qual pode ser. São histórias assim que nos fazem perceber que vale a pena ser fã de quadrinhos. E o mesmo se aplica ao Zagor Gigante (tardio, mas não falho! hehehe). Não tenho outra palavra pra descrever essa edição além de uma verdadeira “viagem”! Juro que fiquei tão absorvido por essa história de um jeito que, em nenhum momento, percebi absolutamente nada das falhas que você cita na matéria (que, ao contrário, ficou irretocável, diga-se de passagem, Silvio. Imagina se você fosse um zagoriano expert, hein?). E, pra fechar com chave de ouro, ainda tenho o meu nome registrado para a posteridade na capa! O que mais um fã de carteirinha do Espírito da Machadinha poderia querer?

  4. Olá Darthmaul!

    Bom, acho que um fã de carteirinha do Espírito com a machadinha só poderia querer – o mais rápido possível – o segundo volume da série Zagorone, estou errado? Bom, posso apenas lhe dizer que, soube de uma fonte segura, que o próximo nos trará uma história mais clássica. Isso mesmo, “nos”, pois, apesar de não ser um zagoriano, eu farei esse coleção com certeza.

    Obrigado pelo elogio à resenha, confesso ficar muito contente, pois, demonstra que consegui tornar válida a minha análise do álbum.

    E depois de ler o ser relato emocionado de a última vítima, acho que irei procurá-la nos sebos, pois fiquei bem curioso.

    Forte abraço e um maravilhoso Natal!

    Sílvio Introvabili

  5. Oi Wilson!

    Obrigado pela postagem!
    Espero mesmo, que mais zagorianos vejam-na e corram às bancas para adiquirirem o seu exemplar, isso nos ajuda a manter o Zagor, e não apenas ele, sendo editado, pois é isso que todos nós Bonellianos queremos, não é?

    Abraços e Feliz Natal!

    Sílvio Introvabili

  6. Tem coisas que parece que só acontecem com nós leitores… Eu comprei esse Zagor Gigante do Gervásio quando o visitei UM DIA ANTES da morte de Sergio Bonelli, comprei e saí para viajar de volta para casa, onde cheguei a noite. No outro dia, abri a revista e li de primeira mão as considerações do mestre Sergio, e juro por tudo que é mais sagrado que pensei comigo mesmo: “Ele já está com quase 80 anos, qualquer dia nos deixa“. Li a história, fui fazer meus afazeres e a tarde quando abro o portal fiquei pasmo com a notícia de sua morte.
    Caramba, por Deus que me deu um calafrio naquela hora, parecia pressentimento, jamais iria imaginar que quando pensei aquilo quase na mesma hora ele estava nos deixando, chego a arriscar a dizer que deve ter sido aquela hora aproxidamente. Eita ano brabo… Um mês e alguns dias depois perco meu pai, mas vida que segue!!!
    Parabéns pela resenha, Sílvio, um abraço a vc e a todos os zagorianos. E que todos tenham um feliz Natal e um 2012 cheio de realizações!!!

  7. Olá Neimar!

    Realmente, um ano “brabíssimo”, a nível pessoal ou a nível mundial, aconteceram coisas que nos abalaram a todos, mas, parafraseando você mesmo, a vida segue.

    Eu nunca acreditei em coincidências, acho melhor pensar que as coisas acontecem com algum propósito, assim, quero crer que a ida do nosso Sergio Bonelli no momento que o Zagorone chega às bancas tem um sentido todo especial, o que torna esse álbum no mínimo essencial a todos nós amantes de fumetti.

    Obrigado por apreciar a resenha, fico feliz e motivado a escrever outras.

    Que tenhas também você e os seus, um Natal abençoado!

    Forte abraço,

    Sílvio Introvabili

  8. Parabéns pela resenha!
    Para quem diz ser um leigo em relação ao nosso Zagor-te-nay, demonstrou bastante conhecimento sobre o universo da personagem!

  9. Oi Bruck!

    Obrigado meu caro!
    Com o Zagor a coisa é meio engraçada, eu não gosto de ler, mas, tenho um certo interesse pelo universo dele e sempre achei as capas do Ferri muito bonitas.
    A semana passada eu adquiri uma preciosidade, o número 1 da Vecchi em excelente estado de conservação. Acho esta uma das melhores, se não a melhor origem já escrita para um personagem.

    Abraços,

    Sílvio introvabili

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