Tex português: SINGELO???

Por Sérgio Madeira de Sousa [1]

Tex contra Mefisto - Edição portuguesa14 de Agosto de 2005, uma data histórica para os admiradores de Tex Willer, especialmente os  portugueses. Nesse dia de Verão, em que milhares de lusitanos gozavam as merecidas férias, foi finalmente possível encontrar uma edição de Tex produzida em Portugal.

A publicidade à colecção “Série Ouro – Os Clássicos da Banda Desenhada”, à qual pertence a referida edição, havia se iniciado largos meses antes, no jornal “Correio da Manhã”, pelo que a expectativa era enorme. Esta colecção, muito semelhante à que a “Panini” lançou em Itália, numa parceria com o periódico “La Repubblica”, sofreu apenas algumas adaptações relativamente aos personagens a publicar.

Publicidade ao volume português dedicado a Tex WillerComo critérios de selecção das personagens a publicar, foi tido em conta aspectos como: a popularidade de cada um, a qualidade dos argumentos e o potencial interesse para os portugueses.
Duas curiosidades relativamente a este ultimo aspecto: Tex nunca antes havia sido publicado em Portugal, mas apesar disso, não deixa de ser uma das personagens mais apreciadas pelos amantes portugueses da BD.
A segunda curiosidade é que tanto Tex, como Dylan Dog e Ken Parker, poderiam ter feito parte logo da primeira colecção de BD lançada pelo “Correio da Manhã” (Os Clássicos da Banda Desenhada), uma vez que constaram numa lista de personagens sugeridos aos responsáveis.

Outras personagens Bonellianas publicadas em Portugal

Zagor nº 1 - Edição portuguesaEm 1978 foram publicados em Portugal duas personagens da SBE: primeiro Zagor e depois Mister No. O número 1 de Zagor saiu em Agosto de 1978 e curiosamente coincidiu com a saída do número 1 da editora brasileira Vecchi. A história intitulada “O Bom e o Mau” corresponde a parte do número 7 da colecção da Vecchi.
As edições portuguesas apenas possuíam 48 páginas, com 4 tiras por página, equivalente a 64 páginas das edições brasileiras. A colecção portuguesa de Mister No iniciou-se em Dezembro do mesmo ano, no mesmo formato (22×15cm), numero e tiras por página.

Apesar das histórias publicadas nas duas séries, possuírem óptimos argumentos e desenhos, na sua maioria a cargo da dupla Nolitta&Ferri, as duas séries tiveram uma vida editorial muito curta: Mister No doze números e Zagor dezasseis. O número 1 de Mister No, corresponde a parte do número 1 italiano.
Resta dizer que ambos foram publicados pela Editora Portugal Press, sem autorização da casa Bonelli.

Zagor nº 1 - Edição portuguesa - 1ª páginaMister No nº 1 - Edição portuguesa
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Em 1981, a revista “Sioux” coloca nas bancas, várias histórias retiradas da “Storia del West”; histórias como “Álamo”, “Comancheiros” ou “O Grande Rio”, tão bem conhecidas dos leitores brasileiros, também foram publicadas em Portugal. Outro personagem da casa italiana de sonhos de papel, Judas, também conhecido por Chacal, igualmente em 1981,foi publicado na revista “Façanhas do Oeste”. Não consegui apurar se estas publicações foram devidamente autorizadas.

SiouxO facto destas personagens terem sido publicadas em Portugal revela que os editores portugueses estavam atentos ao que se passava em Itália, o que não se percebe é quais foram as razões que os levaram a optar pela publicação de personagens desconhecidas dos portugueses, quando poderiam ter optado por Tex, personagem de maior sucesso da editora e sobejamente conhecido entre nós através das edições da Vecchi, que eram distribuídas em Portugal desde os primeiros números.

Acredito que existir em circulação uma revista mensal do Ranger, tenha sido uma das principais razões para que não tenham considerado Tex nessa altura. Se pensarmos que Zagor e Mister No foram publicados sem autorização, a repetirem o processo com Tex, entrariam em concorrência com uma editora autorizada, o que não aconteceria com as personagens referidas, pois infelizmente e com muita tristeza minha, estas edições brasileiras nunca vieram para Portugal.
Apesar de já terem passado quase trinta anos, penso que ainda seria interessante saber o porquê das opções dos editores.

O Tex português

Contra-capa do Tex PortuguêsVoltando à histórica edição portuguesa de Tex, a história seleccionada “Tex contra Mefisto” é uma história clássica da personagem italiana, em que ele enfrenta pela segunda vez o seu pior inimigo. Esta aventura publicada pela primeira vez em 1963, apesar de ser uma óptima história que mistura o western com o sobrenatural e que possui a assinatura dos criadores, não foi na minha opinião a melhor opção para apresentação de Tex aos “leigos”.

Para os fãs do Ranger, todas as histórias seriam uma boa escolha para abrilhantar a primeira e única edição portuguesa até aos dias de hoje, mas para os apreciadores de BD que pretendiam completar a colecção, “Série Ouro – Os Clássicos da Banda Desenhada” e não conheciam Águia da Noite, muito dificilmente esta história foi capaz de cativá-los a acompanhar a personagem.

Rui Alves, José de Freitas, José Carlos Francisco e João Miguel LameirasNão nos podemos esquecer em que condições esta história foi produzida: Galep desenhava Tex nos seus tempos livres, à noite, com prazos apertadíssimos e em condições de trabalho muito longe das ideais. Também a colorização não favoreceu muito a edição. Reforço a ideia: para nós os seguidores desde 1971, esta edição foi um prémio e o facto de ser a cores em muito valoriza o prémio.
Devemos estar muito agradecidos a quem tornou esta edição possível, nomeadamente: José de Freitas, Rui Alves, João Miguel. Lameiras, José Carlos Francisco e Júlio Schneider (os quatro primeiros na foto acima à direita).

Mas então qual seria a história ideal? Como todas as selecções é difícil escolher uma que gere consenso, assim, a história seleccionada teria que premiar os leitores “jurássicos” e ao mesmo tempo ser apelativa, para ao primeiro impacto, ser capaz de angariar novos leitores da personagem. Apesar da dificuldade, penso que existem inúmeras histórias que poderiam cumprir estes requisitos, no entanto, a melhor opção teria sido a publicação de duas histórias curtas (cerca de 100 páginas): uma primeira história obrigatoriamente dos criadores, com uma narrativa dinâmica e desenhos mais elaborados, por exemplo: “Forte Apache”. A segunda história, uma história recente com a assinatura dos actuais artistas. Por exemplo, qualquer história retirada da série “Almanacco del West”.

As histórias seleccionadas deveriam ser publicadas como o foram originalmente em Itália, de preferência histórias a preto e branco, pois foi desta forma que Tex obteve sucesso.
Compreendo que houve uma série de limitações que condicionaram a selecção, principalmente presumo eu, financeiros. O facto de esta história ter sido usada na colecção italiana da “Panini”, também teve muito “peso” na decisão, uma vez que todo o material se encontrava digitalizado, paginado e colorido, apenas havia que traduzir e legendar.

O futuro

Editorial de Sergio Bonelli relativo ao nascimento de Tex em PortugalA questão que coloco agora é: Para quando uma nova edição portuguesa? Será que os coleccionadores terão de esperar mais 30 anos? Esta histórica edição portuguesa, não passou despercebida a Sergio Bonelli, pois ele próprio dedicou-lhe um editorial em Tex Nuova Ristampa, número 148.

É irrealista pensar que o mercado de BD em Portugal possa aguentar uma revista mensal, pois existem diversos problemas que inviabilizam esta opção. Se pensarmos num livro, com uma boa encadernação e papel de qualidade, as hipóteses de sucesso aumentam drasticamente.
No Brasil, apesar do excelente trabalho da Mythos Editora que tem conseguido não só manter, mas aumentar o número de publicações, apesar da crise que a Banda Desenhada atravessa nos últimos anos, a verdade é que à editora têm faltado alguma inovação. As publicações são maioritariamente em formatinho, com mais ou menos páginas e capa cartonada ou não.
As excepções são o Tex Gigante herdado da Globo e o Tex e os Aventureiros, que infelizmente terminou após seis edições, a última das quais, também em formato menor.

Os excelentes álbuns publicados em Itália pela Mondadori, não têm paralelo no Brasil. A Mythos nunca apostou nos livros, ou por impossibilidade de meios técnicos, ou por falta de interesse em atingir esse segmento do mercado, apenas a editora poderá responder. Parece-me que existe aqui uma lacuna que poderia ser aproveitada por uma editora portuguesa. Fazer o papel que a Mondadori faz em Itália: publicar aquelas que são consideradas as melhores histórias de Tex, em livros de boa qualidade e transportar o personagem para as livrarias, atingindo assim outra gama de coleccionadores.

Tex's gigantes e coloridos editados pela MondadoriO mercado português poderá não ser suficiente para este empreendimento, poderá ser necessário alargá-lo, aumentá-lo, tal como faz a Mythos com o mercado português. Portugal funciona para a Mythos como mais um Estado brasileiro, um sector na sua distribuição sectorizada, reduzindo assim o encalhe nas vendas.
Uma editora portuguesa que partisse para este projecto, para obter sucesso teria obrigatoriamente que considerar o mercado brasileiro como parte integrante do português. Penso que tanto a SBE, como a Mythos Editora, veriam com bons olhos uma parceria nesse sentido.

A edição seria produzida em Portugal e a Mythos seria responsável pela venda no mercado brasileiro. Considerando que existem cerca de 20.000 coleccionadores brasileiros e que cerca de vinte por cento adquiria o livro, adicionando cerca de 5 centenas de exemplares para o mercado português, atingimos os 4500 exemplares. Quantos livros publicados actualmente ultrapassam estes números na primeira edição?
É claro que tudo o que aqui foi escrito nos dois últimos parágrafos não está fundamentado e carece de uma análise aprofundada por quem conhece, quer o mercado de BD portuguesa quer o brasileiro. Como leitor e coleccionador não me compete a mim pensar nestes aspectos, apenas gostaria de ver outras histórias do “Ranger” publicadas no meu País e parece-me, pelo que aqui expus, que existe condições para que “Tex contra Mefisto”, afinal não fique… singelo.

NOTA: Dedico esta peça a todos os que colaboraram na produção e edição de “Tex contra Mefisto”, a todos eles o meu muito obrigado.


[1] Coleccionador de Tex desde 1980.

Fontes:
http://www.texbr.com
https://texwillerblog.com
http://www.sergiobonellieditore.it/

(Para aproveitar a extensão completa das imagens acima clique nas mesmas)

6 Comentários

  1. Nossa, que “notícia” brilhante!Isso nos faz encher de esperanças, pois uma edição Portuguesa seria o mesmo que uma edição brasileira, haja vista a língua ser a mesma, com pouquissimas diferenças, além do mais seria um sonho de muitos leitores e Tex e principalmente um sonho particular meu, por que meus meninos não conseguem gostar de Tex por ser em preto e branco, já as edições coloridas eles lêem todas as edições e até gostam das histórias.
    Há alguma dada estipulada para este sonho se realizar ou ainda esta apenas no papel?
    Wellington Verdan

  2. Caro Wellington. Até aos dias de hoje apenas existe uma edição made in Portugal e que eu saiba, não está em estudo uma nova edição. A última parte do texto é apenas uma possibilidade que eu gostaria de ver concretizada, eu apenas levanto a hipótese. Gostaria no entanto de “ouvir” a opinião de outros leitores e também de editores, porque eles melhor do que ninguém, poderão dizer se a ideia têm “pernas para andar”.
    Sérgio Sousa

  3. Antes de mais nada, parabenizo o pard Sérgio Sousa por mais este excelente (e importante) texto que aborda um momento único na vida do nosso Ranger em Portugal.

    De seguida, digo, que foi com muito orgulho que recebi o convite para colaborar nesta edição histórica do Tex e ver no resultado final, o meu nome ao lado dos míticos G. L. Bonelli e Galleppini, foi dos momentos mais gratificantes de toda a minha vida de coleccionador de Tex.
    Já agora e a propósito do texto, dizer que aquando do ínício do projecto, o editor italiano Sergio Bonelli, pediu-me para eu sugerir algumas histórias de Tex, mas que teriam que se encaixar no pressuposto que os volumes desta colecção teriam 208 páginas. Destas teria que se descontar:

    2 de rosto créditos
    2 possíveis de entradas
    5-7 de artigo sobre a série
    2 de entrada da história

    Ou seja, um total de 9 a 13 páginas… e ainda tinha que se atender a que não deveria ser uma (ou mais) história que tivesse saído há pouco tempo em Portugal ou que viesse a sair passado pouco tempo da edição portuguesa e baseado nesses factores eu sugeri:

    – A história clássica “El Muerto” – 1976 – 185 páginas de Galep 1 história curta e colorida.

    – Uma das 5 histórias coloridas – Tex 100, 200, 300, 400 ou 500 – 110 páginas uma história das antigas a preto e branco (“Forte Apache” – 1965 – 81 páginas de Galep)

    – Duas histórias de dois Almanaccos (“L’ucciore di indiani” – 1996 – 94 páginas e o Almanacco Glorieta Pass” – 1998 com 94 páginas(o primeiro tinha sido publicado há muitos anos pela Globo e o segundo nunca chegou a ser distribuído em Portugal).

    Sergio Bonelli agradeceu as sugestões, mas disse-me que tinha sido decidido publicar a história que saiu na similar colecção italiana a partir do momento em que foram dadas mais páginas à edição de Tex, dos que as 208 inicialmente previstas e deste modo o volume de Tex acabou por ser aquele que teve mais páginas em toda a colecção portuguesa.

    Terminando este comentário, acho a ideia final do Sergio muito interessante e que seria do agrado de leitores portugueses e brasileiros, mas muito sinceramente creio que isso seria considerado um risco que creio não estar ao alcance de nenhuma editora de BD em Portugal (a realidade é cruel: vende-se cada vez menos BD no nosso país, por todos os motivos. Principalmente, porque há cada vez menos ou nenhum dinheiro disponível para gastar em BD, e porque é, hoje em dia, quase impossível ter o produto em exposição no ponto de venda), mas quem sabe se não estou enganado… eu não me importaria, até porque ver um novo Tex “made in Portugal” seria mais um momento fantástico e que julgo ser do inteiro merecimento de todos os leitores e coleccionadores portugueses do Ranger!

    José Carlos Francisco

  4. Excelente matéria.
    A edição portuguesa é belíssima… E a história pode não ser a melhor de Tex, porém, eu gostei, mesmo não compreendendo tão bem o universo texiano como vocês, Pards!

    Porém concordo que a História poderia ser outra, podia ser pego uma historia de algum Texone, opino o de Galep ( A Marca da Serpente) ou o de Kubert (que agora foge-me o nome da história)…
    Não podendo por algum motivo a publicação dessas histórias, apostaria na historia de Nizzi,que considero a melhor já escrita por ele, e a melhor trama de Tex, Chamas da Guerra.
    Uma historia fabulosa, rica em narrativa, suspense, detalhes históricos, que marcaram as minhas várias leituras dessa obra.
    Quanto ao mercado de quadrinho e cada vez mais caindo os números de vendas, creio que a sugestão de Tex lançado, nos moldes dos Mandadori Italiano, seria um pouco inviável, para quem quer conhecer o personagem (visto que foi uma das pautas na matéria, sobre a escolha da história pra este Tex português)…
    Quem não conhece o personagem dificilmente pagaria um pouco caro por um álbum de luxo, mesmo este álbum tendo o acabamento, e o cuidado gráfico primoroso, conhecido das edições Mandadori.

    Bom, falei demais já, e fico aqui, com um forte abraço para vocês e parabéns pelo blog, que a cada dia está melhor!

    P.S: Demoro a comentar, mas sempre estou visitando…

    Abraços, Lucas

  5. Seja bem aparecido pard Lucas!
    Obrigado por nos prestigiar com a sua assídua visita e por este comentário à edição portuguesa do nosso Ranger e aos elogios ao blogue!
    Falando do artigo em si, ele fala de duas situações… primeiro que a história escolhida não foi a melhor opção para sair numa colecção de muitos outros grandes personagens da BD, onde muitos apreciadores de BD leriam o Tex pela primeira vez, o que concordo, embora esteja agradecido ao “Correio da Manhã” (assim como à Panini e Devir, seus parceiros nesta “aventura”) por ter editado o “Tex Contra Mefisto” e o segundo assunto onde se fala das edições do género da Mondadori, essas não seriam para apresentrar o Tex a alguém, mas sim para nós já coleccionadores e conhecedores do Ranger… fala-se como uma opção para ser o segundo Tex português, se bem que eu tenho mais fé, que tal volte a acontecer apenas em mais uma nova iniciativa de algum jornal português, que felizmente está de certo modo a apostar na BD como se comprova com a nova colecção patrocinada pelo jornal “O Público” que traz já no dia 4 de Junho, o primeiro número dedicado ao Tenente Blueberry e logo com uma história inédita em Portugal… esperemos que um dia “O Público”, o “Jornal de Notícias” (também com outros projectos associados à BD, no passado) ou outro, inclusive mesmo o “Correio da Manhã”, se lembrem do Tex para um novo volume, ou até mesmo uma colecção, embora o facto de não haver uma editora portuguesa por trás do Tex, complique as coisas, mas vamos a ver o que o futuro nos reserva…

  6. Olá, meu caro amigo!!
    Tenho 44 anos e fui introduzido nessa paixão que são os gibis do Tex Willer por um irmão meu já falecido, que no início da década de 70 trabalhava no Banco do Brasil.
    Ler as aventuras de Tex é voltar na época da minha infância, quando com 8 a 9 anos de idade ficava ansioso ao esperar as novas publicações que eram mensais. Viajava no meu imaginário infantil…saudades daquelas aventuras que não me esqueço (Drama no Circo, Cinco Fugitivos do Inferno, A quadrilha do ás de espada, entre outras).
    Saudades do meu amado irmão que faleceu prematuramente aos 35 anos de câncer em 1985…saudades da minha infância…saudades de Tex… saudades, saudades!!
    Um grande abraço!!

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