Jack Tigre e as minorias dos quadradinhos, no Jornal de Notícias: 9 de Agosto de 2011

Texto da secção Cultura, de 9/08/2011
F. Cleto e Pina

Imensas minorias aos quadradinhos

* Criação de Homem-Aranha negro de origem hispânica volta a colocar a questão étnica na ordem do dia na BD

Se há semanas o anúncio da morte do Homem-Aranha mereceu grandes atenções mediáticas um pouco por todo o Mundo, a sua substituição por um negro de origem hispânica não lhe fica atrás. E, assim, a questão étnica volta ao território da banda desenhada.

Convém esclarecer que esta mudança, contudo, não diz respeito ao super-herói original, mas sim ao da versão da revista “Ultimate“, que transpunha a sua origem para os nossos dias. Nela, depois da morte de Peter Parker, o protagonismo está entregue a Miles Morales, descendente de africanos e de latinos. A sua origem será contada em Setembro, em “Ultimate  Comics Spider-Man #1“, onde, segundo o argumentista Brian Bendis, surgirá “como um Homem-Aranha do século XXI, um reflexo da cultura e diversidade norte-americanas“. Esta ideia estava em cima da mesa desde que Obama foi eleito para a Casa Branca.

Sendo verdade que a opção permite uma nova e diferente abordagem em termos narrativos — desde logo mostrando o novo Homem-Aranha como vítima de racismo —, possivelmente, por detrás desta mudança tão radical estarão apenas objectivos de marketing. Que resultaram quando o Homem-Aranha morreu às mãos do Duende Verde, com as vendas da revista a triplicarem, fruto também da mediatização do facto, tal como acontece agora.

Para já, resta aguardar pela reacção dos fãs, sendo certo que Miles Morales poderá conquistar novos leitores junto das comunidades negra e hispânica, uma vez que os quadradinhos norte-americanos (e não só) não têm sido pródigos na entrega de papéis de primeira grandeza a representantes de minorias.

Quase sempre secundários

Na verdade, presentes desde os clássicos da BD até ao presente, negros, latinos e outros raramente ultrapassaram papéis secundários, como ajudantes ou contraponto cómico do herói branco, bem parecido e com capacidade de decisão, como no caso de Mandrake, o mágico, que tinha como auxiliar Lotário, o hercúleo e musculado negro, que até era monarca de uma nação africana!

No campo dos super-heróis, durante anos, o companheiro de aventuras do Capitão América foi outro negro, conhecido como Falcão.

Blade, o caçador de vampiros; Pantera Negra e Luke Cage também são negros, sendo que a Cat Woman, o Lanterna Verde, Nick Fury, a X-Woman Tempestade e mesmo o Capitão América, o Super-Homem e a Super-Girl, estes num universo paralelo, já tiveram versões negras.

O western é um género em que os exemplos abundam: dois cowboys galantes, Cisco Kid e Jerry Spring, geralmente faziam-se acompanhar por mexicanos de nome Pancho, grande perímetro abdominal e o jeito para o disparate, tal como o seu compatriota Chico, ajudante regular de Zagor. Numa outra criação Bonelli, Tex, em muitas histórias, o ranger não dispensa a sombra de Jack Tigre, pele-vermelha, como Tonto, o amigo do Lone Ranger, e Comanche, a patroa de Red Dust, menos protagonista do que este apesar da série ter o seu nome.

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Álbuns de Tintin politicamente correctos

O retrato paternalista que Hergé traçou dos negros congoleses em “Tintin no Congo”, em 1930, valeu-lhe diversas acusações de racismo e, aos detentores dos direitos das suas obras, o processo que actualmente corre nos tribunais belgas. Essa imagem seria contrariada quase três décadas mais tarde, em 1958, quando o repórter e o capitão Haddock combatem um grupo responsável pelo tráfico de negros, em “Carvão no porão”. Apesar disso, ao longo dos anos, nos sucessivos melhoramentos que Hergé introduziu nos álbuns de Tintin, ao nível do desenho ou da cor, nalguns casos pontuais, negros, índios ou árabes foram substituídos por brancos, para atenuar o impacto das imagens originais, como é possível verificar comparando as duas versões disponíveis no mercado português de “Tintin na América”, a normal e o fac-símile da edição de 1945, recentemente lançado.

Copyright: © 2011 Jornal de Notícias; F. Cleto e Pina
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2 Comentários

  1. Na realidade, creio mais na manobra da Marvel para a venda junto as ‘minorias’ que não são a minoria da população, e sim, a grande maioria, quando somada no todo da pluralidade humana, frente a política cultural, até então vigente, do herói hollywoodiano e que tem como inimigo sempre, o diferente, quer sejam asiáticos, africanos ou os
    latino-americanos (Hispano-americanos e Brasileiros), até recentemente, afinal: yes nós temos bananas e temos a capital em Buenos Aires e tod@s, tem sobrenome, DaSilva! (vejam o Roberto DaCosta – Novos Mutantes ou a Flama da LJA).

    Essa alteração, ao meu ver, é ridícula, visto que o Peter Parker original – essa linha, aliás, me fez parar com o Aranha -, sempre ter tido a seu lado, chineses ou eram coreanos, vamos depois à coleção do HA -, uma afro americana, como namorada inclusive, e latinos com personagem heróico, lutando lado a lado, em pé de igualdade e com respeito, ao longo de suas diversas fases, até recentemente!! ]

    Como disse, a algum tempo, naquela carta à Mythos sobre a Júlia Kendall, o que temos por fazer, é dar voz aos diversos grupos humanos, creio que possam criar, personagens com a cor que quiserem, mas o que importa, é o ‘poder’, e a palavra/verbo que é a vida, é o poder máximo!! Queremos, personalidade nas quais, a diversidade seja contemplada, e isto, independente da cor ou etnia que seja o personagem!!

    E, personalidade pelo jeito não falta ao Tigre – estes é um dos meus favoritos junto com o filho do ranger -, miscigenado, como toda a humanidade, como a genética vem mostrando, dia após dia!!

  2. Pra mim, se o personagem foi idealizado originalmente como branco é assim que ele deve continuar!!!

    O que vocês achariam de um PANTERA NEGRA loiro e de olhos azuis, hem?!?

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