Entrevista com o fã e coleccionador: Felipe Alves

Entrevista conduzida por José Carlos Francisco.

Para começar, fale um pouco de si. Onde e quando nasceu? O que faz profissionalmente?
Felipe Alves: Bom, vamos lá. Nasci em Março de 1995, na cidade brasileira de São Paulo, que é onde resido actualmente. Este ano formei-me no segundo grau e concluí o curso técnico de Mecatrônica, sendo que para o ano que vem pretendo arrumar um trabalho e continuar estudando.

Quando nasceu o seu interesse pela Banda Desenhada?
Felipe Alves: Recordo-me que com 8 anos de idade já me interessavam os quadradinhos. Comecei com Turma da Mônica, depois vieram Disney e os heróis da Marvel e DC Comics. Até hoje fico admirado comigo mesmo sobre como pude desenvolver esse gosto intenso pela leitura de quadradinhos, quando o que se espera de uma criança do século XXI é uma adoração desmedida pelos aparatos tecnológicos, mas no meu caso essa tendência não foi confirmada. Nunca fui um grande fã de videogames, mas sempre apreciei uma boa história.

Quando descobriu Tex?
Felipe Alves: Lembro-me como se tivesse sido ontem! Era Dezembro de 2006, um belo dia em que, acompanhando minha mãe numa dessas lojas que vendem de tudo, o meu olhar caiu numa prateleira que continha diversas revistas de culinária, corte e costura, actualidades, etc, e no meio delas avistei um punhado do que me pareciam revistinhas de alguma personagem de faroeste, um tal de “Tex”. Os livros estavam lacrados em sacos plásticos, impossibilitando que os folheasse, mas a espessura dos volumes, a beleza das capas e sobretudo o preço atractivo (estavam em promoção) fizeram-me comprar um para ver se gostava. Era o Tex Coleção 224, “O Laço Negro”. Chegando em casa, fui abrir o pacote e começar a devorar a nova revista, quando tive uma desilusão: os desenhos eram em preto e branco! Isso fez meu ânimo arrefecer, afinal, até então só havia tido contacto com quadradinhos coloridos. Ao começar a ler, outra surpresa desagradável, a história era uma continuação do número anterior. Mas apesar destes inconvenientes, comecei bravamente a leitura, e devo confessar que o realismo dos belos desenhos de Letteri e o roteiro incrivelmente cinematográfico causaram uma impressão inteiramente nova para mim: parecia estar assistindo um filme de papel! No dia seguinte, não dei outra. Retornei à loja e comprei mais revistas daquele Tex, que antes mesmo de ter acabado de ler as primeiras vinte páginas,  já havia me cativado. Foi assim que tudo começou.

Porquê esta paixão por Tex?
Felipe Alves: É difícil explicar em palavras, mas Tex representou para mim desde o primeiro momento a imagem de um sujeito acima de tudo humano, cujo único super poder era o talento com os revólveres, mas que possuía um carácter descomunal, um senso de justiça inabalável, uma autoconfiança de fazer inveja e um carisma impossível de resistir. Por que a paixão por Tex? Talvez por Tex ser o que é, pela qualidade enorme de suas histórias, pelo talento gigantesco dos artistas que o produzem, enfim, pela áurea mágica que envolve o universo texiano.

O que tem Tex de diferente de tantos outros heróis dos quadradinhos?
Felipe Alves: Como citei acima, Tex é um herói de carne e osso, não tem as cuecas por cima das calças e nem está sujeito a situações insólitas como precisar esconder a sua identidade, se valer de poderes extra humanos para vencer os seus adversários ou recorrer a atitudes polémicas para manter a popularidade. Não, Tex não precisa de nada disso. O Tex de 1948 é o mesmo Tex de hoje, salvo algumas mudanças de estilo inevitáveis após tantas décadas. Tex conta apenas com seus punhos e suas armas para enfrentar seus inimigos, eventualmente dá demonstrações de uma intuição e uma sagacidade extraordinárias, mas nada que fuja das suas limitações humanas, e sempre foi assim. Tex é uma personagem com o qual o leitor se identifica, por vezes copia a maneira de agir, mas acima de tudo é uma personagem que poderia muito bem ter existido de facto. E quem de nós não gostaria que nos dias de hoje houvesse um Tex circulando por aí, dando uns merecidos tabefes em patifes da pior espécie, ou combatendo o crime que assola a nossa sociedade?

Qual o total de revistas de Tex que você tem na sua colecção? E qual a mais importante para si?
Felipe Alves: De Tex apenas, possuo cerca de 500 revistas. Somando Tex, Zagor e demais personagens Bonelli que também colecciono, o montante vai para pouco mais de 700 livros. Como é uma colecção “jovem”, ainda espero que este número dobre e triplique nos próximos anos. Quanto à importância individual, destaco que se tratando de uma colecção, todos os volumes possuem igual importância, mas o Tex Especial Civitelli (com a moldura dourada) e o Tex Gigante 27 têm para mim um valor especial, por terem sido autografados pelo grande desenhador durante a sua vinda ao Brasil em 2010 e em 2012. O Tex em Cores 1 e o póster de divulgação da série colorida também são exemplos de itens de grande valor pessoal por terem sido presenteados por amigos do fórum TexBR.

Colecciona apenas livros ou tudo o que diga respeita à personagem italiana?
Felipe Alves: Oficialmente, colecciono tudo que se relacione a Tex, mas no Brasil não há comercialização de nada fora revistas e livros, então fora isso os únicos itens que tenho por aqui são pósteres e desenhos com dedicatória, além do DVD Tex e o Senhor dos Abismos.

Qual o objecto Tex que mais gostava de possuir?
Felipe Alves: São muitos… mas creio que realmente gostaria de ter a Collezione Storica a Colori completa. Já que a sua publicação por aqui anda a passos lentos e inseguros pelas mãos da editora Mythos, um dia ainda tenho o sonho de importá-la da Itália. O que com certeza faltará é o espaço para guardar aqueles livros enormes (…risos…).

Qual a sua história favorita? E qual o desenhador de Tex que mais aprecia? E o argumentista?
Felipe Alves: Creio que não existe uma história favorita, mas sim uma lista não tão pequena de aventuras memoráveis. Só para citar algumas: O Passado de Kit Carson, A Grande Intriga, Rumo ao Forte Apache, PatagôniaOs Fanáticos do Tigre Negro, Caçada Humana, El Muerto, Missão em Great Falls, Os Sete Assassinos, A Grande Invasão, O Bairro Chinês, Chamas de Guerra, Terra PrometidaO Presságio, Sequestro Nas Colinas do Vento, Flechas Pretas Assassinas. Épicos incontestáveis. Quanto ao desenhador favorito, bem, há algum tempo atrás, para mim Villa e Civitelli estavam um degrau acima de todos os demais, e Ticci era o melhor da velha guarda. Mas actualmente, com essa nova geração de artistas talentosíssimos, meus novos favoritos são Piccinelli, Frisenda, Venturi, Ginosatis e os irmãos Cestaro. O argumentista é Mauro Boselli.

O que lhe agrada mais em Tex? E o que lhe agrada menos?
Felipe Alves: O que me agrada mais: a psicologia da personagem, que foi admiravelmente bem construída por G.L.Bonelli, fazendo com que Tex se tornasse não só um herói como uma referência de conduta. Confesso que, não poucas  vezes em minha vida, me vi perguntando para mim mesmo em uma situação complicada: o que Tex faria em meu lugar? Também gosto do carácter didáctico de muitas histórias. Posso afirmar inclusive que aprendi mais sobre a história e a geografia da América do Norte lendo Tex do que na escola (…risos…).
O que me agrada menos: o autoritarismo de Tex para com seus parceiros, em alguns momentos. Tudo bem que seu génio é forte, mas em determinadas situações forma-se a impressão (soberbamente ironizada por Carson) de que Tex é um chefe e seus amigos, subordinados.

Em sua opinião o que faz de Tex o ícone que é?
Felipe Alves: Para mim Tex é um ícone justamente devido à questão que já citei anteriormente, de o leitor se identificar com o herói. A forma de Tex resolver os problemas sem precisar de nenhum tipo de poder extraordinário torna-o credível e coloca-o na mesma realidade que o seu fã. Isso, aliado aos princípios morais defendidos pela personagem, tão em falta hoje em dia, torna Tex um modelo magnífico de pessoa, um exemplo a ser seguido, um homem que sempre sabe o que é certo e o que é errado, que é forte quando é preciso ser, generoso com os amigos e implacável com os adversários, defensor absoluto da justiça, justiça essa que faz acontecer nem que para isso precise destruir uma cidade inteira de bandidos ou enfrentar um exército sozinho. E é claro, com certeza o grande nível de suas histórias e o talento de seus artistas também contribuíram para esses mais de sessenta anos de sucesso.

Costuma encontrar-se com outros coleccionadores?
Felipe Alves: Embora já tenha me encontrado anteriormente com outros coleccionadores em eventos como o FestComix, não é algo habitual. Porém, a Internet é um mar de oportunidades de relacionamento, e o meu contacto com outros fãs ocorre frequentemente através do fantástico fórum TexBr, do qual tenho a felicidade de participar há 4 anos.

Para concluir, como vê o futuro do Ranger?
Felipe Alves: Temos que ser realistas. Não posso negar que todas as evidências apontam para o fim da publicação da personagem italiana, pelo menos no Brasil, dentro de poucas décadas. O número de leitores cai mês após mês, os veteranos morrem em proporção maior do que novos fãs são arregimentados, e ainda há a ameaça digital, que promete transformar a venda de livros impressos em arquivos virtuais. Bem, esse é o lado negro, mas temos que ressaltar também o lado positivo. Tex tem um público extremamente fiel, já superou crises financeiras de toda espécie e continua ininterruptamente firme e forte nas bancas, e eu mesmo sou um exemplo (embora que raro) de que muitos jovens ainda podem se interessar pelo bom e velho Tex. O que falta muitas vezes é acesso às revistas. De que maneira isto pode ser resolvido? Divulgação. Aí já entra em cena a parte editorial, mas retornando à questão, apesar dos obstáculos, pelo menos para mim Tex tem potencial de sobra para durar pelo menos mais 60 anos.

Prezado pard Felipe Alves, agradecemos muitíssimo pela entrevista que gentilmente nos concedeu.

(Para aproveitar a extensão completa das imagens acima, clique nas mesmas)

8 Comentários

  1. Gostei da entrevista pard.
    Concordo com suas opiniões em relação aos personagens, inclusive nos pontos negativos.
    Parabéns pela coleção admirável.

    Abraços!

  2. Bom ver fãs com essa idade, pois é disso que Tex precisa para sobreviver, mas sei que é difícil encontrar fãs nessa mesma faixa etária, e é por isso que pergunto ao Felipe:
    Quantos amigos dele leem Tex?

  3. Agradeço à todos as gentis palavras, e sobretudo ao Zeca, pelo espaço que me concedeu. Respondendo à pergunta do pard A. Moreira, infelizmente não há de fato nenhum amigo meu que leia Tex.

  4. Parabéns pard, belíssima coleção em tão pouco tempo e como você disse os jovens hoje preferem outras mídias, mas acredito que com a coleção colorida do ranger que a Mythos vem lançando, uma parcela dos jovens que gostam de quadrinhos resolvam experimentar as aventuras de Águia da Noite. Vida longa a Tex.

  5. Amigo Ferreira, tenho certeza que não são as cores que atrapalham Tex, pois se assim fosse os Mangás, que são em preto e branco, não venderiam tanto no Brasil.
    O tema é que não atrai aos jovens, convertidos que foram aos super herois Marvel/DC.

  6. Acho que o maior problema hoje em dia é que a juventude não se interessa por nenhum tipo de quadrinhos raras são as exceções. Preferem video games, TV, etc., mas enquanto houver novos leitores Tex irá ser longevo.

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