As Leituras do Pedro: Tex Platinum #1

As Leituras do Pedro*

Tex Platinum #1 – “O Caçador de fósseis
António Segura (argumento)
José Ortiz (desenho)
Mythos Editora
Brasil, Fevereiro de 2016
135 x 180 mm, 354 p., pb, capa mole
R$ 24,90 / 9,00 €

Pode a forma sobrepor-se ao conteúdo e a discussão em torno dela fazer esquecer o que é – deve ser – mais importante?
Sim e sim.

Tex Platinium, a nova colecção da Mythos Editora, veio de alguma forma demonstrá-lo. Associando-me à discussão levantada em fóruns e blogues – com o conforto dos 7500 km de distância e a relativa ignorância da real situação editorial naquele país, em geral, e das vendas das edições da Mythos, em particular – parece-me que esta foi uma oportunidade perdida.

Actualmente, sem renegar as suas origens populares, Tex é alvo de edições cuidadas um pouco por toda a parte: na sua Itália ‘natal’, assistimos à republicação em livro de relatos clássicos e ao lançamento de uma colecção em formato álbum – forma de (finalmente!) cativar alguns autores franco-belgas?; em Portugal, a Polvo lança a colecção Romance Gráfico Tex; França e Espanha acolhem igualmente o ranger em edições similares; no próprio Brasil, a reedição a cores dos Tex Gigantes parece ser um sucesso e a nova colecção Tex Graphic Novel parece querer palmilhar o mesmo caminho.

Por isso, tudo indicava que o formato italiano seria o ideal para esta Tex Platinum que, para mais se propõe republicar (numa primeira fase?) as histórias já conhecidas de Tex Anual. Seria (mais?) uma justificação para os fãs do ranger duplicarem a edição que já possuem, agora num formato maior, mais consentâneo com a fruição da leitura, e a (melhor?) forma de chegar àqueles que, menosprezando o formatinho, são potenciais leitores das histórias do herói criado por Gianluigi Bonelli e Aurelio Galleppini há quase 70 anos.

Mais a mais, sendo uma edição experimental como de alguma forma está implícito no final da breve introdução aos autores, o risco não seria assim tão grande e os benefícios poderiam ser maiores. Escrevo eu…

Mas, para não ser réu da minha acusação inicial, vamos então a O Caçador de Fósseis, uma banda desenhada originalmente publicada em Itália, em 1997, no MaxiTex #2 – de que a edição actual herdou a capa, até agora inédita no Brasil.


Da autoria do espanhol António Segura, revela uma trama mais complexa do que é habitual em Tex, desde logo porque são vários os acontecimentos paralelos que narra.

Por um lado, há a perseguição a Four Bears, um índio educado por brancos mas que (por isso?) mantém aceso o seu ódio pelos brancos. Do incêndio no rancho onde vivia, até à sedição de parte da tribo onde nasceu, decorre um longo percurso – semeado de vítimas – sempre com Tex e Carson no seu encalço. Durante o qual, conhecemos a sua história – os seus  motivos e a justificação para ser quem é?

Por outro, há a competição, nada saudável, entre os grupos de Edward Cope e Charles Sutter, paleontólogos apostados em descobrir fósseis de dinossauros em território índio. Para além da nota distintiva que acrescenta à trama principal, o cruzamento entre ambos os relatos, embora necessária para o desfecho da primeira, acaba por ser pouco mais que tangencial. Na verdade, facilmente Segura poderia ter separado as duas e ter escrito duas histórias regulares em lugar desta mais longa (350 páginas!).

A par disto, que já não é pouco, Segura introduz ainda duas personagens marcantes e relevantes para a narrativa: Salomon, o velho alcoólico pesquisador de ouro, e Red Barnum, um caçador de recompensas em fim de carreira e em busca de redenção. Referenciando quase como anedota, posso acrescentar que consegue ainda mostrar até onde chega o amor de mãe e criar uma intriga romântica!

Tudo, sem descaracterizar Tex e Kit Carson, nem o principal das aventuras do ranger: cumprir a lei, executar a justiça, exercer o direito de vingança.

Ao lado de Segura está José Ortiz, seu companheiro de muitos anos e de muitas criações gráficas, com um traço magnífico, duro e realista, assente em contrastes acentuados de branco e negro e numa planificação que sucessivamente ‘esquece’ a norma Bonelli vigente das seis vinhetas por página e que, para concluir voltando ao ponto de partida, poderia ser melhor admirado se Tex Platinum tivesse assumido o formato italiano…

*Pedro Cleto, Porto, Portugal, 1964; engenheiro químico de formação, leitor, crítico, divulgador (também no Jornal de Notícias), coleccionador (de figuras) de BD por vocação e também autor do blogue As Leituras do Pedro

(Para aproveitar a extensão completa das imagens acima, clique nas mesmas)

2 Comentários

  1. Só por ser desenhada por Ortiz já merece nota 10.
    É uma pena que esse mestre no desenho de histórias de Terror e suspense se foi.
    Ortiz sempre foi minha referência e fonte de inspiração.

  2. Concordo com tudo que foi dito em relação à forma como foi publicado esse material no Brasil. Infelizmente nosso querido editor Dorival anda muito pessimista, achando que tudo não vai vender. Uma pena, perdeu uma grande oportunidade…

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