As Leituras do Pedro*
Tex Edição Especial Colorida #15: Forca para um inocente
Claudio Nizzi (argumento)
Rodolfo Torti (desenho)
Mythos Editora
Brasil, Agosto de 2020
160 x 210 mm, 160 p., cor, capa mole
R$ 31,90
Choque formal
Acho que será pacífico afirmar que, entre as várias colecções que a Sergio Bonelli Editore dedica a Tex – e que a Mythos replica no Brasil – esta é aquela em que os leitores estão mais sujeitos a surpresas.
Por outras palavras – que até já utilizei a seu propósito… – a (no original) Color Tex de certa forma é um laboratório onde são experimentados caminhos, se não novos ou inovadores, pelo menos diferentes, para o ranger.
Mesmo quando, como no presente caso de Forca para um inocente, se trata de um western puro e duro, de matriz tradicional, ou não fosse ele assinado por Claudio Nizzi, um dos mais produtivos escritores de Tex, que aqui assinala o seu regresso após uma licença sabática.
Bem ao seu estilo, uma vez que é cultor do Tex decidido e implacável, partidário do mote que diz que tudo se resolve melhor – e de forma mais definitiva…! – de colts na mão, esta história começa com a prisão de Kit Willer por ter morto a tiro o filho do tiranete que domina a cidade de Holbrook.
A entrada em cena de Tex – de forma a protegê-lo até ao julgamento – desencadeará sucessivos confrontos que têm por objectivo uma vingança ‘dente por dente’, com emboscadas, e vários tiroteios que, com muita acção e adrenalina, ocupam uma parte significativa do relato.
A inovação que citei no início, desta vez surge a nível gráfico, com a estreia nas aventuras do ranger de Rodolfo Torti, desenhador regular de Martin Mystère, informação que seria desnecessária para os que seguem as duas séries da Bonelli, pois o estilo evidente logo nas primeiras páginas ‘denuncia-o’ claramente…
Possuidor de um traço fino e (bem mais) caricatural do que é norma(l) nas aventuras de Tex Willer, estou convencido que o trabalho de Torti nesta edição vai desagradar aos fãs mais empedernidos do ranger uma vez que nele ‘verão’ sempre o (lado mais caricatural) do Detective do Impossível.
Paradoxalmente, é esse mesmo desenho que, nas primeiras páginas, se coaduna às mil maravilhas com a cena introdutória, em que Tex e Kit Carson capturam um traficante de uísque, destruindo a sua carga, pois aporta à situação um tom rocambolesco que realça a postura provocadora e zombeteira dos dois rangers.
No entanto, com o avançar do relato – e da assumpção de um registo mais duro e violento, de acordo com as sucessivas situações criadas – da tentativa de linchamento público de Kit às emboscadas aos quatro pards – apesar de alguns ajustes pelo artista, ficam sempre resquícios caricaturais – especialmente ao nível dos rostos mas também da postura física dos intervenientes – que, acredito eu, aos olhos dos fãs (mais) tradicionalistas, irão de certa forma despojar os protagonistas do seu lado mais rígido e severo, e provocar um certo choque entre o estilo e o tom da obra. E, já agora, entre o estilo do miolo e o da capa (mais realista) de Claudio Villa…
Nota final
Trabalhando regularmente como tradutor, sabendo o quão difícil pode ser por vezes encontrar o tom e/ou o termo, adequados, evito geralmente comentar as opções feitas. No caso presente, parece-me que a Mythos – no seu próprio interesse comercial – não foi feliz no título escolhido, já que o original italiano – Un capestro per Kit Willer – é muito mais chamativo e provocador, uma vez que dá um nome – com impacto… – ao ‘inocente’ do título brasileiro – pese embora o tom cadavérico dos dois Kit…
*Pedro Cleto, Porto, Portugal, 1964; engenheiro químico de formação, leitor, crítico, divulgador (também no Jornal de Notícias), coleccionador (de figuras) de BD por vocação e também autor do blogue As Leituras do Pedro
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Excelente as observações e narrativas.
Concordo com a observação em relação à localização do título. Também já me questionei algumas vezes sobre certas escolhas de tradução da editora.
Em relação ao desenhista, gostei muito do traço de Rodolfo Torti e espero que retorne para novas histórias do ranger.