As Leituras do Pedro: Mataré a Mandela (Le Storie)

As Leituras do Pedro*

Mataré a Mandela
Gabriella Contu (argumento)
Giuseppe Baiguera
(desenho)
Panini Comics
Espanha, 24 de Janeiro de 2019
195 x 259 mm, 120 p., pb, capa dura
ISBN: 9788491677659
16,00 €

Diversidade

Se há adjectivo que parece ter sido criado para classificar o catálogo da Sergio Bonelli Editore, ele é ‘diversidade’ – embora, durante décadas, fundamentalmente sob o signo da grande aventura. Em anos recentes, esse mesmo adjectivo volta a fazer todo o sentido quando se fala da colecção Le Storie.

Escrevo com base no pouco que já conheço – e que abre muito o apetite para mais: Sangue e Gelo, um relato de terror com base histórica, que a Levoir e o Público disponibilizaram na colecção Bonelli de 2018; Primavera del 68, que acompanha, no tempo, os efeitos da revolução social iniciada em França e seguida, também, em Itália; Lavennder, uma ficção pura que tem por base uma situação extrema com a literatura como mote; e, agora, este Mataré a Mandela, lançado em Itália há menos de um ano.

Escrito por Gabriella Contu, tem por base os últimos dias antes do encarceramento – que duraria mais de 25 anos e faria dele um símbolo vivo – de Nelson Mandela, durante o regime de apartheid que dominou a África do Sul durante décadas. Centrado em Moses, um velho que trabalha no tribunal onde Mandela será julgado e cujo filho foi morto por estar empenhado na oposição activa ao regime, o relato traça um retrato, inevitavelmente subjectivo e de posicionamento definido, da situação vivida então no país.

Mais uma vez com uma consistente base histórica que, apesar disso, surge aos olhos do leitor apenas como um elemento mais, para a situar e contextualizar, da narrativa, tem como ponto forte, a indefinição de Moses, dividido entre a revolta que sente contra o regime que lhe dificulta o quotidiano e lhe matou o filho, a forma como se afastou deste deste devido à sua posição política e a vontade de viver tranquilo sem se meter em sarilhos.

Os sucessivos acontecimentos a que iremos assistir, devido à evolução da situação no país e à prisão e posterior julgamento de Mandela, obrigarão Moses a repensar o seu posicionamento e a assumir uma atitude – ou mais que uma pois, o que acontece à sua volta irá influenciá-lo de diversas maneiras. E, graças a isso, manter o leitor na dúvida sobre o desfecho quase até às últimas páginas, graças à forma consistente como o protagonista está retratado.

O traço de Giuseppe Baiguera, dentro dos padrões de qualidade a que a Bonelli nos habituou, se não atinge o brilhantismo doutros relatos, é sóbrio e realista, num preto e branco de contrastes acentuados – inevitável no contexto…? – e contribui para o tom factual que Mataré a Mandela assume.

*Pedro Cleto, Porto, Portugal, 1964; engenheiro químico de formação, leitor, crítico, divulgador (também no Jornal de Notícias), coleccionador (de figuras) de BD por vocação e também autor do blogue As Leituras do Pedro

(Para aproveitar a extensão completa das imagens acima, clique nas mesmas)

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