As críticas do Marinho: Il Riccato di Slade – (Tex italiano 647 e 648)

Por Mário João Marques

De certa forma, alguns leitores receberam uma nova história de Tex escrita por Tito Faraci com algum receio, conhecendo de antemão a qualidade dos seus recentes trabalhos na série. Já o sublinhámos noutras ocasiões, apesar dos seus argumentos partirem de boas ideias, o posterior desenvolvimento privilegia a construção de cenas de acção capazes de criar um certo impacto junto do leitor, em detrimento de uma maior espessura e densidade de personagens e situações ou de diálogos mais elaborados. Numa primeira abordagem, Il Riccato di Slade parece levar o leitor a concluir que pouco ou nada mudou, mas apesar de se manterem as principais características que o autor vem evidenciando, esta aventura encerra algumas qualidades que importa sublinhar.


O bando de Tom Slade dedica-se a assaltar e a roubar, não hesitando em matar quando é necessário não deixar rasto. Durante um assalto a uma diligência, o bando depara-se com um cofre que parece conter algo mais do que uns quantos dólares, algo muito importante e que não pode ser revelado sob pena de comprometer alguém poderoso. Algo tão importante que leve Madison, um governador local, a auxiliar Tom Slade a evadir-se da penitenciária onde se encontrava a cumprir pena, depois de entretanto ter sido capturado por Tex e Carson.  Os dois rangers desconfiam de todos estes acontecimentos e acabam por ir no encalço de Tom Slade.

Slade é um facínora, um fora da lei, um assassino que não hesita em recorrer à chantagem para escapar à sentença proferida pela lei, a pena de morte. Já o político Madison recorre ao poder que o cargo de governador lhe confere para preservar o seu estatuto e a sua posição política. Ou seja, o argumento repousa nesta premissa muito concreta: na ausência de valores morais e éticos, os homens não recuam perante nada, não hesitam em recorrer ao que quer que seja para defenderem a sua posição ou para ganharem vantagem. Em lados opostos, com objectivos diferenciados, as duas personagens da aventura de Faraci encontram-se unidas por esta característica.

Apesar de preenchida por muitas páginas plenas de tiroteios, cavalgadas, fugas e muita tensão, assim como por determinadas cenas que ficam na retina do leitor (por exemplo, todo o início da aventura está muito bem construído, a cena do mosteiro é muito clássica e plena de suspense, ou mesmo a cena da emboscada na ponte), desta vez parece existir uma dose equilibrada e certa dos ingredientes: a trama é sólida, as personagens têm um papel concreto e sempre coerente na acção e existe uma cumplicidade evidente entre Tex e Carson, bem patente nos deliciosos diálogos que vão trocando, remetendo o leitor para a época clássica das aventuras bonellianas.

No final, feitas as contas, tudo parece levar-nos a concluir que Faraci terá feito um esforço evidente em sintonizar-se com Tex, o que, naturalmente, seria um motivo de regozijo para todos os apaixonados. No entanto, a acreditar em alguns relatos, Faraci terá escrito este argumento há já alguns anos, pelo que Il Riccato di Slade poderá não ser o seu mais recente trabalho e, desta forma, a aventura não deve ser lida e interpretada como uma tentativa do autor em aproximar-se do espírito da série, nem uma alteração na tendência que vem revelando nos seus últimos trabalhos, o que não o impedirá, mesmo assim, de vir a colher aqui algumas características que o auxiliem para futuros trabalhos.

Nascido em Génova, Giovanni Bruzzo trabalhou na SBE para Mister No e Brad Barron, antes de chegar a Tex, assinando agora a sua segunda aventura na série. É notória a evolução do desenhador relativamente ao seu trabalho anterior em L’Uomo di Baltimora, também escrita por Faraci, onde já nos tinha deixado boa impressão. Bruzzo tem um estilo clássico, muito elaborado e com grande atenção na composição da fisionomia das personagens.

Se estas duas aventuras texianas têm vindo a revelar um desenhador dotado e com um estilo muito próprio, o seu Tex parece ainda muito decalcado do modelo ticciano. Numa primeira fase parece-nos ser uma estratégia natural e adoptada por quase todos os desenhadores da série. O Tex de Venturi, de Ortiz ou de Monti é assumidamente ticciano, Piccinelli e Ginosatis parecem ter sido influenciados por Villa e mesmo o Tex de Civitelli, que se revela com um cunho muito pessoal do autor, foi numa primeira fase inspirado em Ticci.

A questão é que nestes desenhadores houve uma contínua evolução, souberam a partir de determinada fase adaptar a personagem às suas características gráficas, dando-lhe o seu cunho pessoal. Bruzzo parece ainda inconstante na forma como apresenta o ranger, já que, na mesma aventura, o leitor parece deparar-se com um Tex claramente ticciano e outro que começa a moldar-se ao cunho pessoal do desenhador.  Quando Bruzzo firmar a sua própria personalidade e definir claramente o seu Tex, acredito estarmos em presença de um grande desenhador da série.

2 Comentários

  1. Belos desenhos e bela crítica! Quem ainda não leu esta história, fica ansiosamente à sua espera…
    Abraços e parabéns ao Marinho pelas suas crónicas, que se lêem sempre com prazer e proveito.

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *