Tex Série Normal (Itália): Oltre il fiume

Tex 596 – “Oltre il fiume“, de Junho de 2010 e Tex 597 – “Il ponte di roccia“, de Julho de 2010. Argumento de Claudio Nizzi, desenhos de José Ortiz e capas de Claudio Villa. História inédita no Brasil e Portugal.

Ukasi, antigo aprendiz junto de Nuvem Vermelha dos Navajos, consegue convencer Cão Amarelo a tomar o poder junto dos Utes e regressar aos trilhos da guerra. Outrora chefe desta tribo, fora vencido e humilhado por Tex depois de um combate onde tentou usar meios desleais, levando à sua expulsão da tribo para a solidão das montanhas, onde foi revivendo amargurado os feitos do seu passado. Prometendo a Ukasi o ouro dos Navajos, Cão Amarelo vai conquistar o poder juntos dos Utes, atacando desde logo algumas aldeias navajo e levando consigo mulheres e crianças como reféns, com o objectivo de atrair Tex para o combate da vingança, desde há muito, ansiada.

Dando provas de um tempo onde o cansaço de tantos e leais anos dedicados a Tex se sobrepõe à imaginação, Nizzi segue o caminho que vem marcando algumas das últimas aventuras texianas, a de recuperar figuras e mitos da série, sobretudo bonellianos, como forma de reconquistar alguma alma perdida, mas também ressuscitar algum do sentimento vivido então por muitos dos leitores. Mas se noutros autores este artifício poderá funcionar como um revivalismo que surte efeito, em Nizzi ele assume-se mais como uma prova da sua fraqueza actual, porque o autor nunca consegue desenvolver a contento tramas e personagens.

A recuperação de Cão Amarelo vem sublinhar esse facto, revelando que afinal não basta reinventar figuras que marcaram a série e o imaginário dos leitores, surgindo sempre mais como um desejo do autor em trazer algo que possa mudar o caminho do facilitismo em que Nizzi foi gradualmente caindo. No fundo, Cão Amarelo surge como mais uma prova desse facilitismo, nunca se assumindo como a personagem bonelliana que foi capaz de permanecer no imaginário dos leitores. Este Cão Amarelo está velho, não tem carisma e foge à primeira contrariedade. Por outro lado, sublinhando ainda mais o facilitismo e a falta de chama em Nizzi, atente-se na sua insistência em utilizar sempre os mesmos artifícios para unir as pontas do argumento.

Exemplo disso mesmo é o facto de Tex e Nuvem Vermelha terem ambos um pesadelo com o agora chefe dos Utes antes do ataque deste à aldeia navajo. Trata-se de algo já visto, por exemplo, quando o autor recuperou Mefisto num último combate com Tex, sinal que o autor não consegue imaginar algo mais elaborado, onde a capacidade dramática possa sobrepor-se ao ridículo de infelizes coincidências. Ou seja, Nizzi continua a escrever a aventura pela aventura, enredos puros e lineares, mas sem capacidade de idealizar situações coerentes e compor personagens carismáticas capazes de disputar o protagonismo com Tex. Nizzi não consegue explorar e desenvolver a fundo as suas ideias, boas ou más, optando sempre por trazer situações previsíveis e que apenas vão servindo para encher as páginas. Ataques, emboscadas, disparos, galopes ou fugas, caracterizam o puro western, mas aqui surgem numa amálgama que acaba por distorcer uma aventura e tornar tudo banal.

No capítulo do desenho, perdoem-nos, mas este Ortiz já não é o mesmo autor que entrou e soube pegar de estaca na série. Um autor que conseguia aliar o seu próprio estilo à personagem e seus ambientes, que jogava muito com os contrastes, um estilo algo porco, mas capaz de criar atmosferas poeirentas e reviver o ambiente sempre grandioso de um western eterno.

Este Ortiz já sofre, muito naturalmente, do peso dos anos, deixando aqui um trabalho que não faz justiça ao enorme autor que o espanhol sempre foi. A aventura reflecte uma perda de qualidade que já vinha fazendo sentir-se de modo gradual nos seus últimos trabalhos, acentuada agora com cenários e ambientes pouco expressivos, salvando-se eventualmente alguns enquadramentos nas cenas de maior acção. Também as personagens estão envelhecidas, com especial realce para Carson, os índios assemelham-se muito entre si, enquanto que Tex, para além de se distinguir pouco do filho Kit em várias sequências, deambula sempre entre a composição ticciana, alguma caracterização ortiziana e outras onde o herói surge mesmo mal caracterizado.

Por fim, ainda há tempo e espaço para algumas falhas primárias, como por exemplo ver Carson sentado ao lado de Tex no final da página 54 (1ª parte) para desaparecer na página seguinte.

Texto de Mário João Marques

2 Comentários

  1. Um texto crítico e necessário.
    Não li esta história ainda.
    Mas pelo andar da carruagem, trazer de volta Cão Amarelo tinha de ser algo grandioso dentro da série. Cão Amarelo “deu trabalho”. Foi um inimigo ferrenho de TEX e seus pards em sua passagem anterior. É uma das aventuras que mais releio, pois há muita ação e a batalha no desfiladeiro é fantástica, remetendo-me agora neste momento á aquela batalha final no Texone Patagônia. A escolha de Nizzi/Ortiz creio que não foi feliz para o momento. Pelos poucos desenhos acima, mostra que o Grande Ortiz está “cansado”, ou seja, já se nota que a qualidade vem declinando. Mas Ortiz é Ortiz, há qualquer momento pode produzir uma obra-prima, mas na série é isso que vejo. E Nizzi está escrevendo por escrever. E como diz o texto: “…sem capacidade de idealizar situações coerentes e compor personagens carismáticas capazes de equivaler ao protagonista“. Hoje conta muito personagens secundários que às vezes se sobreponham ao protagonista em alguns momentos. Creio que era uma missão para Boselli/Frisenda. Coloco este comentário, não desqualificando Ortiz, mas querendo que o mesmo seja preservado e nos venham à lembrança sobre a série de TEX com o Mestre: Caçadores de Fósseis, Ouro dos Confederados, Rumo a Forte Apache, etc.

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