Maurizio Dotti, El Supremo

Por Sandro Palmas*

De entre os novos desenhadores de Tex, Maurizio Dotti, nascido em Limbiate na província de Monza e Brianza, na região da Lombardia, é um dos mais talentosos e com um ritmo de trabalho mais rápido.

Desde novembro de 2013, quando foi publicado o seu primeiro trabalho na série mensal italiana, o artista desenhou duas aventuras intituladas, respetivamente, El Supremo e Carovana di Audaci, a que se juntam a curta história Rio Quemado e uma história atualmente em preparação, intitulada provisoriamente Manhattan, que será provavelmente publicada em Itália nunca antes da Primavera de 2018.

Todavia, a estreia do autor em Tex ocorreu no já longínquo ano de 1995, quando ainda trabalhava para Il Giornalino[i]. Submerso por compromissos, o seu amigo Alarico Gattia pediu-lho uma ajuda na elaboração dos esboços da aventura Glorieta Pass, escrita por Mauro Boselli, e que o próprio Gattia passaria a tinta. Este trabalho encomendado por Gattia, publicado dois anos mais tarde no Almanacco del West de 1998, abriu as portas da Sergio Bonelli Editore ao jovem desenhador, ainda sem ter atingido os quarenta anos, que entretanto continuava a colaborar para a revista católica para jovens e para a qual tinha ilustrado as aventuras de Lassie, E-Team, Cheyenne e uma adaptação em banda desenhada de Os sete magníficos, escrita por Luciano Giacotto em 1995, por ocasião do centenário do nascimento do cinema.

Para a Sergio Bonelli Editore, entre janeiro de 1996 e 1998, Dotti realizou o nono álbum especial de Zagor intitulado L’angelo della morte, também com argumento de Mauro Boselli e uma aventura para a série mensal dividida em dois álbuns Gli Sterminatori e Una pallottola per Kelso, com textos de Maurizio Colombo. Posteriormente, Dotti integrou de modo permanente a equipa da então recém-nascida série de horror Dampyr, para a qual desenhou em pouco mais de doze anos um surpreendente total de 24 álbuns mensais, um Speciale e um Maxi.

Embora saibamos que as aventuras de Dampyr são geralmente auto-conclusivas, Maurizio Dotti demonstrou ser um autor muito rápido a desenhar e particularmente adaptado para ilustrar histórias épicas, tão caraterísticas em Tex, um dado não negligenciável que levou Mauro Boselli, em setembro de 2011, a confiar-lhe a extensa aventura El Supremo, 395 páginas que o artista desenhou brilhantemente em pouco menos de dois anos, com uma média mensal de cerca de 18 pranchas.

Mesmo em Carovana di Audaci, história escrita por Luca Barbieri e Tito Faraci, os prazos foram todos muito curtos. Se a história já tinha sido atribuída ao autor em outubro de 2013, Dotti começou a desenhá-la apenas em maio do ano seguinte, uma vez que estava então empenhado em concluir um episódio de Dampyr deixado incompleto por Esteban Maroto, abalado por um incêndio que devastou por completo o seu estúdio. Se Carovana di audaci foi terminado por volta de agosto de 2015, concluímos que as suas 220 páginas foram desenhadas em cerca de 16 meses, o que dá uma média ligeiramente inferior a 14 pranchas mensais.

A história curta boselliana de 32 páginas intitulada Rio Quemado, realizada para a Feira de Lugano de 2015, foi desenhada entre agosto e setembro do mesmo ano, confirmando-se assim a mesma média. Recorde-se que o desenhador teve também que desenhar mais dezasseis páginas, as quais correspondem à verdadeira conclusão desta curta aventura, publicada recentemente em Itália no Color Tex de novembro 2016.

Chegámos então à história de Mauro Boselli ainda em elaboração, a qual, tal como apenas pudemos ler, intitula-se provisoriamente Manhattan. O número de páginas ainda não está confirmado, mas provavelmente estender-se-á por três álbuns. Na Primavera de 2015 começaram a ouvir-se os rumores iniciais desta história, mas os primeiros desenhos foram feitos apenas no Outono do mesmo ano. No momento em que este artigo foi escrito[ii], Dotti encontrava-se a trabalhar nas primeiras páginas do segundo álbum desta aventura nova-iorquina, mantendo constante a sua invejável média.

Maurizio Dotti não é apenas veloz como sublinhámos, mas um dos maiores desenhadores de Tex!

Por exemplo, El Supremo não foi uma aventura fácil de desenhar. Com cerca de cinquenta personagens (a somar a um variado número de outras anónimas) e mesmo uma vintena de ambientes diversos, todos disseminados ao longo da península californiana, entre os quais a cidade de São Francisco e a fascinante Isla de la Niebla, junto ao oceano, é uma daquelas histórias monumentais (tanto do agrado de Mauro Boselli) que colocariam à prova o talento dos melhores artistas e que o novo desenhador de Tex superou plenamente. Detendo-nos nos álbuns que compõem esta palpitante aventura, realçamos a facilidade com que o desenhador deu uma fisionomia às personagens, que se revela rigorosamente adequada nos protagonistas, os quatro pards, Montales, Mike Tracy, Tom Devlin, mas também todos os simpáticos amigos do ginásio Hércules. Com Maurizio Dotti o leitor mergulha nas áridas e poeirentas planícies desérticas da Baja, nas atmosferas cinzentas de São Francisco ou na bruma das falésias íngremes da Isla de la Niebla, ambientes recriados com uma dosagem magistral de perspetivas impressionantes e uma utilização genial do claro-escuro que caraterizam a arte deste maestro e que representam praticamente uma novidade em Tex.

Aparentemente, a aventura seguinte, Carovana di Audaci, apresentou-se menos desafiante. A história, que conta o ataque de um bando de comanches, liderado pelo feroz Nevequaya, a uma caravana de pioneiros em Butterfield Trail, apresenta apenas uma quinzena de personagens (não contando com as outras mais anónimas) e situa-se num único ambiente, o Texas ocidental, onde desponta Fallen Arrow, uma ghost town, teatro dos dramáticos acontecimentos da parte principal da história. O artista foi uma vez mais chamado a desenhar numerosas cenas de grupo, seja porque o argumento coloca em cena os colonos, seja porque inclui os guerreiros comanches, mostrando assim uma vez mais a sua grande habilidade. São excelentes as cenas que decorrem na cidade abandonada debaixo do cair incessante da chuva, durante as quais, chamado a ilustrar um verdadeiro clima de terror e ferocidade humana, Dotti excede-se na recriação dos sentimentos mais elementares patente nos rostos dos protagonistas. Surpreendente é a capacidade de Dotti, nas 220 páginas que compõem esta aventura, em interpretar as personagens, particularmente as mais débeis como mulheres e crianças. Veja-se o drama da pequena Lara Roberts, cujas lágrimas testemunham o medo e o pesadelo que está a viver, repare-se na angústia da bonita Janet, prisioneira de Nevequaya, que através do seu rosto doce denuncia constantemente sentimentos de pânico e consternação, mas também o próprio líder dos raptores e seus acólitos, os scout Red e Akowa, cujas expressões revelam autênticas bestas humanas sedentas de sangue. O tema da “Fronteira” é desta forma retratado em magníficas pranchas as quais, através de uma louvável dedicação do artista, assemelham-se a autênticos frescos.

Ainda inédita em Portugal, a curta história Rio Quemado, escrita por Mauro Boselli, coloca frente a frente o tirânico latifundiário Don Augusto Rochas e o bando de peones rebeldes de Manuel Torres, em cuja pista também se encontram Tex e Carson. Mais uma aventura mexicana para Maurizio Dotti, desta vez a braços apenas com um punhado de personagens e uma ambientação que decorre desde o deserto de Chiricahua até à hacienda da atormentada família Rochas. A história decorre quase sempre de noite, permitindo ao desenhador trabalhar habilmente nos contrastes entre brancos e negros.

O branco e o negro são também as cores dominantes na aventura nova-iorquina, ainda em preparação com o título provisório de Manhattan. A história marca o regresso de personagens conhecidas, como por exemplo Nick Castle (que já tínhamos visto em ação na primeira história de Dotti, El Supremo) que, depois de o ajudar na sua evasão, vai firmar um pacto diabólico com o Maestro, histórico inimigo do ranger, para estender o seu domínio à cidade de Nova Iorque. Ainda relativamente a personagens, o simpático irlandês Pat Mac Ryan vai juntar-se a Tex e Carson, com o desenhador a confirmar-se, desta forma, ser um especialista no regresso de amigos tão caros e próximos do ranger. Do ponto de vista gráfico, a ambientação será sem dúvida o prato forte desta aventura, com os dois pards empenhados numa luta contra o tempo nos bairros mais recônditos da cidade, a Bowery, com os seus becos de má reputação e a célebre Grande Avenida com a sua curiosa ferrovia elevada, construída entre 1875 e 1878 e que só ficou inoperativa entre 1950 e 1955. Uma aventura que se anuncia como das mais importantes dos próximos anos e para a desenhar Mauro Boselli chamou Maurizio Dotti, um autor digno de confiança pelas suas qualidades e pela sua velocidade com os lápis e os pincéis. 

[i] Histórica revista italiana de inspiração católica.

[ii] No decorrer do 4º trimestre de 2016

* Texto de Sandro Palmas publicado originalmente na Revista nº 5 do Clube Tex Portugal, de Dezembro de 2016.

(Para aproveitar a extensão completa das imagens acima clique nas mesmas)

2 Comentários

  1. Com certeza, no time de Tex ele está entre os top 5, sua arte é bem limpa e detalhista, suas capas na série Tex Willer são obras de arte.

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