Fanzine “A Conquista do Oeste” – Maio/Novembro 2001 – Páginas 12 a 15 – OS “COMIC-BOOKS” AMERICANOS

OS “COW-BOYS” NA BANDA DESENHADA

Fanzine “A Conquista do Oeste” - Página 12OS “COMIC-BOOKS” AMERICANOS

Eles foram os nossos ídolos e todos foram grandes exemplos para nós. Vibrávamos com as suas aventuras e, se possível, não perdíamos qualquer dos seus filmes, quer no Olympia, quer no Galo, no Salão Lisboa, no Arco Bandeira… Corríamos Lisboa à procura dos seus filmes, não esquecendo o Jardim Cinema, o cinema Paris, o Lys, o Cine Oriente, o Odeón, o Europa, o Aviz, embora os primeiros fossem aqueles que tinham mais interesse, já que apresentavam sempre sessões contínuas. E não custava nada naquele tempo, irmos para lá às duas da tarde e sairmos à noite. Assistir ás emoções de um filme de “cow-boys“, onde o nosso “herói” salvava todos, inclusive a namorada, prendendo ou matando todos os bandidos.
Talvez não fossem filmes perfeitos vistos à distância e lembro-me de ver, num dos filmes de “Zorro“, a personagem principal saltar, mais do que uma vez (sempre a mesma cena), de uma rocha para o cavalo de um dos bandidos. Isto para não falar das cenas repetidas, mais do que uma vez, ao longo das 31 partes, que os filmes tinham. Mas eram uma delícia para os nossos jovens olhos e emocionávamo-nos todas as vezes que as víamos, mesmo que fossem três, quatro ou mais vezes.

Hoje, dificilmente as gerações poderão compreender esses tempos difíceis, quase sem dinheiro, era preciso trabalhar bastante para se ganhar alguns escudos, que rapidamente “investíamos” nessas alegrias, nessas emoções. Quase não havia ladrões ou crimes e as pessoas passeavam calmamente, a qualquer hora do dia ou da noite, sem grandes preocupações e até sem grandes ambições, porque não? O nosso horizonte era limitado.
Não havia a ânsia de ter casa, carro, frigorifico, televisão ou qualquer outro electrodoméstico. Bastava-nos algumas horas de prazer a ver esses filmes e a conversar com os amigos, sobre esta ou aquela cena que nos tinha marcado mais.

Rocky LaneMas quem eram esses “cow-boys“? Chamavam-se “Buck Jones“, “Roy Rogers“, “Tom Mix“, “Gene Autry“, “Bill Elliot“, “Johnny Mack Brown“, “Tex Ritter“, “Rex Allen“, “Monte Hale“, “Ken Maynard“, “Charles Starrett” e muitos outros. Muitos desses nomes hoje desconhecidos, da maior parte dos leitores mais jovens. Esses filmes com essas personagens foram produzidos às centenas, principalmente nos anos 30 e 40, vivendo de um filão inesgotável, que eram os espectadores de todas as faixas etárias e de todas as nacionalidades e condição social.
As histórias eram muitas vezes fracas, devido à velocidade com que os filmes eram produzidos e as cenas nunca eram repetidas, corressem mal ou bem. As melhores eram aproveitadas para aparecerem no filme mais do que uma vez. O Oeste que apresentavam era falso e muitas das personagens retratadas, mesmo aquelas que faziam parte integrante do historial do Velho Oeste, eram transformadas em mitos, sendo apresentadas quase como verdadeiras lendas, praticando algumas acções que eram positivamente falsas.

E quando surgiram os “cow-boys” cantores o panorama piorou ainda mais, se possível. Todos eles de camisas bordadas, com a sua viola e voz melodiosa, a cantar para as suas amadas, muito bem vestidinhos e limpinhos. É claro que este filão de filmes, tinha que ser igualmente aproveitado para as Histórias aos Quadradinhos. Surge assim, pela primeira vez, em Setembro de 1940 a personagem “Tom Mix“.

A quem mandasse duas caixas vazias de cereais da companhia Ralston Purina, recebia gratuitamente em casa, uma revista deste “herói“. Infelizmente o artista morreria um mês depois deste lançamento. Mas apesar da revista não ser vendida, ainda conseguiria sobreviver durante doze números (até Novembro de 1942). Os desenhos pertenciam ao estreante Fred Meagher.

Gene Autry era milionário há muito tempo, já que tinha aproveitado os seus sucessos e a sua veia para os negócios, para enriquecer. Resolve entretanto promover-se a si próprio, desta vez através da produção de uma série em Banda Desenhada , no formato de página dominical com as suas aventuras e publicada nos jornais. Lançada também em 1940, não chegou a ter sucesso. Mas ele não desistiu e resolveu lançar uma revista com histórias completas, publicada pela Fawcett, igualmente com o seu nome. Editada em 1941, ficou pelo Nº. 12 (1944). Os dois últimos números já seriam publicados pela Dell Comics.
Depois de aparecer em sete números da revista “Four Color” (1944-1945), com as aventuras de “Gene Autry“, a Dell decide relançar a revista deste “herói”, em Maio de 1946. Só acabaria no Nº. 121 (Jan.1959).

Vários foram os artistas que se ocuparam desta série, a saber: Jesse Marsh, Peter Alvarado, Nat Edson, Tom Cooke, etc…

Se Gene Autry tinha resolvido aparecer em Banda Desenhada , porque não aproveitar a figura de Roy Rogers para tal também? E a Dell Comics resolve igualmente publicar as suas aventuras, em treze números da revista “Four Color” (a revista barómetro do sucesso ou não da personagem, para que por sua vez passasse a ter revista própria, consoante o êxito das suas vendas). Assim, de 1944 a 1948 “Roy Rogers” passaria a ter as suas aventuras em Histórias aos Quadradinhos. Em Janeiro de 1948 teve direito a revista própria. Duraria até Setembro de 1961, com 145 títulos publicados. Os artistas que ali colaboraram foram Peter Alvarado e Nat Edson, de novo, Albert Micale, John Buscema, Alex Toth e mais.

Fanzine “A Conquista do Oeste” - Página 13Hopalong Cassidy” era uma famosa personagem do cinema, interpretado na tela, pelo William Boyd. Em 1942, a Fawcett resolve incluí-lo na Banda Desenhada. Surge assim, na revista “Master Comics“, uma publicação de “super-heróis“. Mesmo assim, o êxito foi garantido e no ano seguinte passaria a ter revista própria. Serão 85 os números publicados (até Janeiro 1954). Quando a editora encerrou as suas actividades editoriais, seria a DC a ocupar-se da personagem por mais algum tempo, tendo a revista terminado, finalmente, no seu N°. 135 (Maio de 1959). Foi mais um sucesso destes “comic-books“, desta vez desenhados por Ralph Carlson, Pete Riss, John Giunta, Gil kane, Gene Colan e outros.
Na década de 50, estes três “cow-boys” seriam igualmente apresentados em tiras e páginas dominicais nos jornais, com relativa aceitação dos leitores. Já que os traços e os estilos eram ligeiramente melhores que os publicados nos “comic-books“. Principalmente “Hopalong Cassidy” seria o de maior sucesso, devido aos desenhos de Dan Spiegle.

Em finais da década de 40 e depois do grande êxito dos “super-heróis“, havia necessidade de se criarem novas personagens e novos géneros de ficção para a Banda Desenhada, até porque a Guerra tinha acabado e muitas das personagens existentes, estavam a ficar cansadas e desgastadas. Uma das alternativas seria o “western“. Assim, foi uma busca incessante por parte das editoras, de pioneiros, pistoleiros, índios, soldados, bandidos, cavalos, cães, etc., para serem transformados em personagens de Banda Desenhada e enquadrados no tema. A fonte era riquíssima nesse aspecto e não havia dificuldades de maior, para encontrar as figuras próprias e necessárias para atingir os fins propostos, não esquecendo os “cow-boys” que já eram conhecidos do Cinema e que poderiam ser aproveitados para encher as páginas dos “comic-books” da especialidade.

Personagens do OesteAs Dell e a Fawcett foram as editoras especializadas em trazer as aventuras dos “cow-boys” do cinema para os Quadradinhos. Esta última, apesar de deixar de publicar “comic-books” em 1954, muitos dos “cow-boys” que lançou entretanto, viriam a ter continuidade com outra editora.
Tom Mix” foi a segunda personagem a ser publicada pela Fawcett neste campo, embora em novas aventuras e desenroladas mesmo no Velho Oeste e não enfrentando nazis a japoneses, como aconteceria com as aventuras publicadas pela Ralston. O Nº. 1 surge em Janeiro de 1948, terminando no seu Nº. 61 (Maio de 1953). A maior parte das suas histórias foram desenhadas por Carl Pfeufer (lápis) e John Jordan (tinta).

Depois aparece “Monte Hale“, lançado em Outubro de 1948, embora a partir do Nº. 29, que teria alguns desenhadores a ocuparem-se das suas histórias:

Edmond Good, Pete Riss, Bob Laughlin e outros. “Monte Hale” acaba no seu Nº. 88 (1959), depois da Charlton ter publicado os últimos seis números. Ainda em 1948 é a vez de “Gabby Hayes“, o conhecido barbudo cómico do Cinema. Seu título será cancelado em 1957 (já editado pela Charlton). Em 1949 a Fawcett lança mais dois “cow-boys“. Em Maio surge “Rocky Lane” e em Junho “Lash Larue“. Ambos apareceram durante muito tempo, pois foram continuados pela Charlton. Frank X. Doyle seria um dos desenhadores destas duas séries, embora outros artistas se tenham ocupado delas, já pela Charlton e, como tal, com menos qualidade. A primeira personagem terminaria no seu Nº. 87 (Novembro 1959) e a segunda no Nº. 84 (Junho 1961).

1950 marca o ano em que a Fawcett mais títulos lançaria no mercado, de personagens de “cow-boys” criadas para o Cinema: “Bill Boyd” (23 números de 1950 a 1952), “Rod Cameron” (20 números de 1950 a 1953), “Ken Maynard” (8 números de 1950 a 1952), “Tex Ritter” (20 números da Fawcett e 26 da Charïton, de 1950 a 1959), “Smiley Burnette” (4 números em 1950), “Andy Devine” (21 números de 1950 a 1952) e “Bob Steele” (10 números de 1950 a 1952).No desejo de aproveitar ao máximo as possibilidades que o mercado oferecia, a Fawcett acabaria por inventar um novo “cow-boy“. Em Novembro de 1950 é publicada uma revista com a foto na capa de “Bob Colt“, o tal “cow-boy” que não existia, já que se tratava de um modelo profissional, vestido a rigor. A publicação circularia durante 9 números e até 1952, com desenhos de George Evans. Algum do material que a Fawcett publicou era, de uma maneira geral, de qualidade, com argumentos sólidos e bem construídos e a acção bem arquitectada, com emoção e suspenso. Com o passar dos anos, tudo se foi alterando e as suas revistas passariam a ter menor apetência e pouca diversão para os leitores, que passaram a evitá-las.

Fanzine “A Conquista do Oeste” - Página 14A Dell Comics mantendo as suas duas melhores revistas, “Roy Rogers” e “Gene Autry“, acabaria por acrescentar a estas, outras personagens igualmente famosas e de interesse. “Johnny Mac Brown” seria o primeiro, apresentado regularmente de 1950 a 1952 e depois, esporadicamente, até 1959. Jesse Marsh era o desenhador, infelizmente hoje, considerado como um artistas de segunda categoria, apesar de nos ter deixado excelentes páginas de Banda Desenhada, não só no campo dos “cow-boys“, como quando desenhou “Tarzan“. Depois será a vez de “Buck Jones” (também regularmente de 1950 a 1952 e depois, até 1957, com publicação irregular), “Wild Bill Elliott” (de 1950 a 1955) e “Rex Allen“, lançado em 1951 e cancelado no seu N°. 31 (1958). Algumas das histórias de “Rex Allen“, seriam desenhadas por Russ Manning, embora não fossem muitas.

Hopalong Cassidy e Tex RitterA Dell sempre apresentou belas capas para as suas revistas, quer em fotografias quer desenhadas, um capricho que ajudou bastante a vender os seus títulos. A Fawcett também incluía nas suas publicações capas, igualmente de boa qualidade artística, ainda que não fossem iguais às da Dell. Eles publicaram na altura outros títulos de revistas ligadas ao “western“: “Six-Gun Heroes“, “Western Hero” (Fawcett), “Four Color” Western Roundup” (Dell), etc…

Mas não foram apenas a Fawcett e a Dell, que publicaram “cow-boys” do Cinema em Histórias aos Quadradinhos, A DC publicou “Dale Evans” (24 números de 1948 a 1952) e “Jimmy Wakely” (18 números de 1948 a 3953). Tudo material de qualidade.

A Charlton publicou 6 números “Tim Mc Coy“, de 1948 a l949 e 4 de “Sunset Carson” datados de 1951. Este material era fraco.

Dom Chicote, no BrasilA Marvel tentou “Whip Wilson” em 1950, do qual saíram unicamente 3 números.

O mesmo aconteceria  com “Hoot Gibson” da Fox. Depois ainda vamos encontrar “John Wayne” em Banda Desenhada , de 1949 a 1955, editado pela Toby Press e “Buster Crabbe” editado pela Famous Funnies, de 1951 a 1953.

Mas seria a Magazine Entreprises, que melhor soube apresentar aquelas personagens, depois da Fawcett e da Dell. A primeira personagem a surgir seria “Tim Holt“, desenhada por Frank BoIle e lançada a partir de 1948. A partir do seu Nº. 42, a personagem passa a chamar-se “Red Mask“, embora continue a ser desenhada pelo mesmo artista. Termina no Nº.54 (1957).

Johnny Mack BrownEsta editora publica também “The Durango Kid” (de 1949 a 1955). Esta personagem foi interpretada no Cinema pelo artista Charles Starrett. Do N°. l ao 18, os desenhos pertencem a Joe Certa (lápis) e e John Belfi (tinta) e do 19 ao 41, os desenhos são só de Fred Guardineer. As aventuras de “White Indian” desenhadas por Frank Frazetta, pertenciam igualmente às páginas desta revista. As duas primeiras personagens acabariam por ter igualmente, as suas aventuras publicadas na revista “Best of The West“, outra revista também editada pela Magazine Entreprises.

Fanzine “A Conquista do Oeste” - Página 15Mas se nos anos 50 os “comic-books” do Far-West passam a ter sucesso, os filmes do mesmo género, deixam de o ter, face às séries de televisão que entretanto vão aparecendo na “caixa que mudou o mundo“. Acabam os filmes, mas começam as séries que, por sinal, também apresentavam algumas vezes, personagens do Oeste. Temos assim: Clint Walker em “Cheyenne“, James Arness em “Gunsmoke“, Dale Robertson em “The Tales of Wells Fargo“, Hugh O’Brian em “Wyatt Earp“, James Garner em “Maverick” e muitos outros.

Se até aqui se tinham aproveitado as figuras de “cow-boys” do Cinema, para aparecerem nas Histórias aos Quadradinhos, nada mais natural, que escolher as novas personagens das séries da TV, para os incluir igualmente, na Banda Desenhada.

Será a Dell Comics (depois Gold Key), que irá iniciar mais esse ciclo. Embora nem todo o material fosse bom, sempre foram surgindo as seguintes revistas:

Wyatt EarpCheyenne” com 25 números de 1955 a 1961. Tom Gill foi o seu desenhador. “Gunsmoke” circulou durante 33 números, de 1955 a 1961 e de 1969 a 1970, com textos de vários escritores e desenhado pelo italiano Alberto Giolitti, mais tarde substituído por Mike Sekowsky. “Wyatt Earp” cavalgou de 1957 a 1962, com a vantagem de ter tido Russ Manning a desenhar várias das suas aventuras. “Maverick” circulou de 1958 a 1962, com desenhos de Dan Spiegle. Mas a Dell não fica por aqui. Temos ainda “Bat Masterson“, “Bonanza“, “Wagon Train“, “Davy Crockett” (com desenhos de Jess Marsh), “The Range Ryder“, “Buffalo Bill JR.”, “Have Gun Will Travel“, “The Rifleman“, “Daniel Boone” e muitos mais. Todas estas publicações são um autêntico manancial de recordações, não só pelas personagens, como pelas aventuras, pelos estilos e pelas próprias histórias, de argumentos simples mas sempre interessantes. É também uma época de ouro da Banda Desenhada dedicada ao “western“.

Lash LaRueNo Brasil quase todo este material viria a ser publicado, o que já não aconteceria em Portugal, mas disso falaremos mais tarde. O material da Fawcett seria publicado pelas editoras brasileiras Ebal, Rio Gráfica e Cruzeiro. Os da Dell eram exclusivos da Ebal. Tentaremos também dar uma pálida ideia do que seriam essas edições, em outro local desta publicação. Um dicionário sucinto, mas com algumas informações sobre todas as personagens do Oeste, constará igualmente nestas páginas.

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Um comentário

  1. Esta série de artigos acerca do western está fantástica, é um manancial de informação. Ainda não li tudo mas para lá caminho.
    Neste artigo sobre os cowboys nos comics americanos vi os nomes Jesse Marsh e Davy Crockett. Por coincidência, estou a publicar no meu blog (www.afilactera.com) pranchas dos anos 50 publicadas no jornal O Primeiro de Janeiro desenhadas por Jesse Marsh. Comecei com as 20.000 Léguas Submarinas, depois seguiu-se Rob Roy e agora Davy Crockett. Tenho de agradecer ao meu pai, que as coleccionou nesses “tempos difíceis, quase sem dinheiro, (em que) era preciso trabalhar bastante para se ganhar alguns escudos, que rapidamente “investíamos” nessas alegrias, nessas emoções” e as guardou até hoje.

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