Entrevista exclusiva: MORENO BURATTINI (autor convidado para a Exposição 70 anos de Tex, na Amadora, nos dias 29 e 30 de Setembro)

Entrevista conduzida por José Carlos Francisco, com a colaboração de Júlio Schneider (tradutor de Tex para o Brasil) na tradução e revisão.

O Clube Português de Banda Desenhada e o Clube Tex Portugal realizam, na Amadora, nos dias 29 e 30 de Setembro próximo, uma Exposição dedicada aos 70 anos de Tex e trazem o escritor Moreno Burattini ao nosso país, motivo mais que suficiente para esta entrevista do blogue português do Tex com o autor italiano.


Caro Moreno, mais uma vez seja bem-vindo ao blogue português do Tex!
Em Portugal você será protagonista de uma exposição relativa aos 70 anos de Tex, na cidade de Amadora. O que representa para si este evento, fora da Itália, que contará com a sua presença?

Moreno Burattini: Para mim, a minha viagem a Portugal é muito importante. Inicialmente porque sempre que um autor de BD é convidado ao exterior é, de algum modo, um reconhecimento pelos resultados atingidos e que, evidentemente, tiveram ecos inclusive fora das fronteiras nacionais. Depois, porque Portugal é um país com uma história antiga e uma cultura extraordinária, com muitas ligações com a Itália e com povos que se assemelham por múltiplos aspectos. Além disso, eu tenho muitos amigos portugueses que conheço por tê-los encontrado na Itália, e é um prazer visitar a sua terra, e outros que conheço apenas por email e que ficarei muito feliz por encontrar pessoalmente. Já há tempos eu colaboro com artigos meus para a revista do Clube Português de Tex, então será como participar de uma reunião de redacção. Outro motivo é a minha satisfação de poder representar não somente a mim mas a toda a Editora Bonelli ao ir à Amadora falar dos setenta anos de Tex, a personagem que mais do que qualquer outra simboliza a BD italiana no mundo: eu sinto-me convidado não tanto como argumentista mas como historiador dos quadradinhos e conhecedor do herói, por ter escrito muitos livros e muitos artigos sobre o Ranger e por poder contar como nascem as suas aventuras, visto que há trinta anos eu trabalho lado a lado com os seus autores. É como se eu fosse como embaixador. Por fim, será a minha segunda viagem a Portugal, depois de muitos anos da primeira. Eu estive em Lisboa no Verão de 1993 e, depois de alugar um automóvel, passeei por toda a região sul do país. Eu gostei muitíssimo de tudo o que vi. Depois de muito tempo, estou curioso para recuperar as sensações da primeira vez e ver as mudanças que aconteceram.

O que convenceu Moreno Burattini, autor de ressonância mundial, a aceitar um convite tão incomum mas ao mesmo tempo importante?
Moreno Burattini:
Eu poderia dizer que é o desejo de provar a cozinha portuguesa, mas na verdade foi a consciência de poder, em nome de todo o staff da redacção Bonelli, representar 70 anos de história editorial de Tex como redactor, articulista, crítico, testemunha de factos e de pessoas, mais do que como argumentista. Eu conheci Giovanni Luigi Bonelli e Aurelio Galleppini, Sergio Bonelli e Decio Canzio, Guglielmo Letteri e Fernando Fusco… tenho muitas histórias a contar. Eu não vou para falar de mim, mas deles.

Quais são as suas expectativas em relação aos 70 anos de Tex aqui em Portugal?
Moreno Burattini:
Eu espero somente encontrar leitores apaixonados como eu, que considero-me um leitor antes de um profissional da área. E sei que será assim.

Você tem algum contacto com a BD feita em Portugal? Conhece algum autor, como por exemplo E. T. Coelho, também porque morou e trabalhou por muito tempo na Itália, considerado por muitos como o melhor desenhador de BD portuguesa de sempre?
Moreno Burattini:
Eduardo Teixeira Coelho fazia exactamente o tipo de BD e de heróis de que eu gosto: guerreiros medievais, vikings, homens da fronteira. Há uma sua personagem chamada Ayak, um lobo branco, cujas histórias não só eram ambientadas em cenários semelhantes aos de Zagor (a personagem principal de que ocupo-me), como ela tinha um nome que recorda bastante o grito de guerra do meu herói preferido, facto que sempre impressionou-me. E ele morreu em Florença, a minha cidade adoptiva (eu nasci e vivi a minha infância e adolescência próximo dali, e diplomei-me em Florença). Ademais, a história da BD portuguesa começa na longínqua segunda metade do Século 19, com Bordalo Pinheiro, e chega até a experiência da Bedeteca de Lisboa, de que já ouvi falar. Mas os meus contactos com os autores dos quadradinhos lusitanos são esporádicos. Eu recordo-me da exposição Quadradinhos: Sguardi sul fumetto portoghese montada na Itália em 2014 como parte do Treviso Comics Book Festival, com um importante artigo no catálogo do evento.

Alarguemos um pouco o horizonte da entrevista: o que o convenceu a entrar para a indústria da BD?
Moreno Burattini:
Na verdade eu sempre acreditei que a dos quadradinhos não era uma indústria mas sim artesanato, e é com espírito de artesão que eu levo em frente o meu trabalho. Eu jamais pensei no que faço como um emprego ou uma profissão mas como uma paixão a ser levada adiante. O que levou-me a me dedicar à BD foi justamente o meu grande amor pela BD.

Como analisa a evolução da sua carreira?
Moreno Burattini:
Eu considero ter sido agraciado por poder realizar os meus sonhos de criança. Desde pequeno eu sonhava em ser escritor de BD e, em particular, de escrever histórias de Zagor, e consegui. O segredo da vida é encontrar alguém que lhe pague para fazer aquilo que você pagaria para fazer, e foi o que aconteceu comigo. Para o restante da minha vida nem tudo correu igualmente bem, eu tive a dose de falta de sorte que acontece de modo geral com todos, mas com relação à minha actividade profissional, eu tive de facto um destino maravilhoso. Eu sempre trabalhei com entusiasmo ao dedicar-me ao que mais eu gostava de escrever e alcancei metas importantes.

Como avalia o seu trabalho de hoje em comparação ao passado?
Moreno Burattini:
Eu tenho consciência de ter crescido profissionalmente, mas o meu relacionamento com o que faço continua a ser o mesmo: eu gosto de fazê-lo, reconheço-me nele. Eu sou muito tranquilo em relação ao mistério do nascimento das ideias: no início em perguntava-me se conseguiria sempre encontrar sugestões para novas ideias, de modo a poder escrever por toda a vida, e realmente eu não sabia como poderia fazer. Hoje eu sei que as ideias chegam por magia, e que as histórias a contar vêm de algum lugar (eu nunca soube de onde) e apresentam-se sozinhas. Não sou eu que saio à caça de ideias, são elas que ficam emboscadas e saltam sobre mim quando passo pelo seu caminho.

Como se forma um escritor do seu nível?
Moreno Burattini:
Não sei qual seria o meu nível, mas sei como se forma um escritor. De um só modo: com leitura.

O que Tex representa para si e qual é a importância de Tex na sua vida?
Moreno Burattini:
Tex representa a segurança de uma presença: ele sempre esteve e sei que sempre estará. Uma espécie de tio que dá bons conselhos e sempre sabe o que fazer, que queremos ser como ele, que consegue tomar as decisões certas e reconhecer de imediato quem está certo e quem está errado. Também representa o máximo do profissionalismo para argumentistas e desenhadores: um produto bem feito e sem quedas de qualidade, uma garantia. E depois, ver toda a colecção na minha estante me faz repassar com a memória os anos da minha vida: eu vivi quando Galep desenhou a capa do Supertex (n.t.: Tex italiano n° 100), edição colorida que eu comprei no quiosque com a minha mesada, eu vivi quando saiu o primeiro Tex Gigante, quando Claudio Villa tornou-se o capista…

Para concluir, gostaria de deixar uma mensagem aos seus admiradores que estarão em Amadora?
Moreno Burattini:
Eu não creio que atrairei muitos admiradores, visto que as histórias de Tex com a minha assinatura são, por ora, muito poucas – e não sei se em Portugal há leitores das revistas de Zagor da Mythos. Os que irão à Amadora são admiradores do Tex e não meus: ficarei feliz de encontrar o mais possível! E se alguém desejar, poderá ter também um pequeno esboço desenhado: o meu ofício é escrever histórias e não ilustrá-las, mas um pequeno desenho engraçado, uma caricatura, um esboço cómico eu consigo fazer, como sabem os amigos portugueses que vieram à Itália e viram-me à obra!


(Para aproveitar a extensão completa das imagens acima, clique nas mesmas)

Um comentário

  1. Burattini é sempre de uma cordialidade ímpar, de fato esse será um grandioso encontro por tê-lo presente. Lembro-me da vez em que esteve no Brasil e o Zé Ricardo pôs-me ao celular com ele, foi um momento indescritível e, como sempre, ele foi pura gentileza.

    Abraços,

    Sílvio Introvabili

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