As críticas do Marinho: Texone #29 – “L’Orda del Tramonto”

Por Mário João Marques

Podia ter sido uma aventura de Dylan Dog ou de Dampyr, mas afinal Tex e Carson são os protagonistas de uma história escrita por Pasquale Ruju, pela primeira vez num Tex Gigante, propositadamente para o traço gótico de Corrado Roi, artista muito apreciado em Itália e um dos pesos pesados da Bonelli Editore, onde já desenhou quase tudo e todas as personagens.

Conhecedor do talento de Roi (com quem já trabalhou em Dylan Dog) para determinados ambientes e atmosferas, Pasquale Ruju escreveu uma aventura fora dos cânones da série, assumindo um risco perfeitamente definido, já que podia ir contra as expectativas dos mais conservadores. Por isso, para quem aguardava por um western clássico com muitos cowboys, tiroteios, xerifes, saloons ou extensas pradarias desiluda-se, porque o leitor vai encontrar-se perante uma aventura gótica onde não falta um conde vindo de um país balcânico, um assassino que consegue ver na escuridão, um castelo, espaços lúgubres e uma história de promessas feitas por antepassados. Parece Dampyr, mas não é, é mesmo Tex Willer e verdadeiramente não estamos em presença de um western clássico.


Constantin Florian é um nobre europeu exilado nos Estados Unidos. Decidido a reconstruir um verdadeiro feudo no Arizona, Florian serve-se da ajuda de Vladar, inquietante e perturbadora personagem, que vai semeando a desordem e o caos, para conseguir apoderar-se das terras dos rancheiros locais.

Depois de excelentes trabalhos em séries que ele próprio idealizou como Demian ou Cassidy ou em Dylan Dog, onde se mantém como um dos argumentistas, Ruju tem vindo a assumir em Tex um papel cada vez mais importante e sobretudo apreciado pelos leitores. Desta vez, insere Tex e Carson numa aventura de horror, contrapondo os dois pards a um adversário bem definido e caracterizado. Alto, forte, rápido e certeiro no gatilho, com uma notável capacidade em ver na escuridão, Vladar é um antagonista interessante do ponto de vista da construção da personagem e dos motivos que movem a sua acção, o amor e paixão por uma mulher, afinal algo que o levará à derrota final. Desenvolvendo-se em apenas dois ou três cenários bem precisos e identificados, que até nisso difere algo do habitual na série, a aventura está estruturada de modo quase perfeita, não fosse o final algo repentino, vivendo muito da incerteza e do mistério que vai envolvendo o leitor, envolvido pelo manto do mistério que se vai adensando lentamente ao longo das páginas.


Na sua prolífica carreira, Corrado Roi já forneceu a sua versão de inúmeros heróis da Bonelli Editore, os já referidos Dylan Dog (onde também assina as capas da coleção Granderistampa) e Dampyr, mas também Mister No, Júlia, Nathan Never, Martin Mystère, Mágico Vento ou ainda Brendon, cujas capas também desenhou. Com Tex (curiosamente de quem já tinha realizado uma interpretação pessoal no portfolio I Volti Segreti di Tex, publicado em 1993) chega por assim dizer ao cume, ao topo da extensa lista e, por isso mesmo, esta aventura foi precedida de muita curiosidade e de muita discussão em torno de si.

Esta deambulação entre vários heróis, tão diferentes géneros e ambientes funciona para Roi como uma busca de novos caminhos, explorar ciclicamente outros universos narrativos, uma experiência que serve para o autor nunca cair na rotina. Roi assume esta sua vontade em permanentemente tentar surpreender do ponto de vista criativo, apesar de aqui, com Tex, estarmos em presença de um herói e de um universo imutável ao longo de décadas e fiel a princípios perfeitamente definidos desde o início, o que de certa forma acaba por ser um travão às ambições do autor.

Muito apreciado sobretudo pela notável capacidade em que consegue construir ambientes de uma grande riqueza crepuscular e por um estilo gráfico inconfundível, creio no entanto que semelhantes elogios serão sempre mais justificados no Corrado Roi ilustrador do que propriamente no desenhador. As capas feitas, sobretudo para Dylan Dog, revelam um autor dotado no tratamento das cores escuras e que consegue retratar a contento personagens e ambientes, talento que não sobressai da mesma forma quando chamado a compor cenas sucessivas, onde parece faltar um certo dinamismo e onde algumas personagens se assemelham muito entre si.

Mais à vontade nos ambientes escuros e lúgubres, nem sempre o trabalho do autor assume o mesmo nível e harmonia ao longo das páginas. Por isso, toda a cena final, quando Tex e Carson enfrentam Vladar no escuro, no seu ambiente de eleição, Roi acaba por exaltar mais as suas qualidades. Mas isso não basta para mudarmos a nossa opinião sobre o autor, por mais que isso contradiga muitos. Como afirma o velho Carson, a primeira impressão é sempre aquela que conta e para nós Roi permanecerá sempre mais como um dotado ilustrador do que um artífice de páginas inolvidáveis de pura banda desenhada.

(Para aproveitar a extensão completa das imagens acima, clique nas mesmas)

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