Entrevista com o fã e coleccionador: Sílvio Raimundo

Entrevista conduzida por José Carlos Francisco.

Sílvio RaimundoPara começar, fale um pouco de si. Onde e quando nasceu? O que faz profissionalmente?
Sílvio Raimundo: Meu nome deveria ser Sérgio, mas contrariando a vontade da minha Mãe, o meu Pai registou-me Sílvio Raimundo da Silva, há 36 anos. Nasci no bairro do Ipiranga em São Paulo, no dia 09 de Agosto de 1971.
Fazia apenas seis meses que o Ranger mais Temido do Texas tinha voltado às bancas brasileiras.
Tex's de Sílvio RaimundoAos 5 anos, mudamos de São Paulo para o interior de Pernambuco, onde passei a minha infância no sítio da minha Avó materna, brincando de ser Jack Tigre. De lá, fomos para Recife – Capital pernambucana – onde passamos um curto período e voltamos a Belo Jardim, onde resido até hoje.
Tenho Licenciatura Plena em Biologia, mas nenhuma aptidão para leccionar. Trabalhei em indústrias gráficas durante a adolescência e mais tarde, ingressei na área administrativa de uma Empresa de género alimentício, hoje trabalho em um núcleo de implantação de sistema de planejamento dos recursos empresariais – ERP.
Sou Pai – orgulhoso e coruja – de três filhos lindos, o Piño e o Gigante, respectivamente Vítor e Vinicius do meu primeiro casamento e Pedro, o Bravo, do segundo.

Sílvio Raimundo e o póster de José OrtizQuando é que teve início esta paixão pela Banda Desenhada, em especial pelo Tex?
Sílvio Raimundo: Eu creio que antes de brincar de carrinhos eu já folheava revistas de banda desenhada, pois o meu Pai era um devorador de BDs, como hoje o sou. Na minha casa sempre teve muitas revistas da Disney, do Mauricio de Souza e outros tantos editados no Brasil.
Quando eu tinha por volta de sete ou oito anos, o meu Pai voltou para casa trazendo um exemplar de uma revista diferente, para começar ele era em preto e branco, era a primeira edição brasileira do Tex 97 – Kento não Perdoa!
Fiquei encantado com aquele mundo que eu ainda criança nunca tinha visto, aquelas pradarias imensas, cowboys andando a cavalo e índios, muitos índios, com suas pinturas de guerra e armados com os seus arcos e flechas, era tudo fascinante.
Os Texone e os MaxiHoje compreendo como são as duras regras daquele mundo, mas naquele momento elas eram mais simples de assimilar do que as do meu, pois eu só conseguia ver ali liberdade, que é tudo o que uma criança quer. A partir daquele momento Tex passou a ser a BD preferida do meu Pai e minha também, discutíamos sobre cada história, falávamos da qualidade dos desenhos, ficávamos ansiosos por encontrar o exemplar que concluía uma história. Eram momentos maravilhosos entre filho e Pai e o seu melhor Amigo.

Sílvio Raimundo e os seus Tex'sPorquê o Tex e não outra personagem?
Sílvio Raimundo: Porque ele é real!
Tex é uma pessoa de carne e osso, o meu Pai poderia ter sido ele. O seu mundo é real, os seus princípios são claros a sua luta é justa.
Acho que nós, enquanto leitores, nos realizamos nos seus actos, na sua coragem.
O mundo nos faz de certa forma, covardes, pois se a injustiça não é connosco nós nos limitamos apenas a ficar tristes, enquanto que Tex vai à luta e faz a justiça acontecer, mesmo não tendo “nada a ver” com o caso. Ele faz algo para que o mundo ideal que nós almejamos seja um facto.
Os Maxi Tex e não só...Entre os meus 17 e 22 anos parei de ler Tex. Nesse período, li tudo que apareceu na minha frente, todos os heróis Marvel/DC, Graphics Novells, que naquela época começaram a ser publicadas no Brasil, BD de autor, enfim, conheci muitos bons autores que hoje continuo lendo, mas, faltava alguém importante da minha família que estava ausente já há muito tempo e precisava voltar. Certo dia ele voltou, não me pediu explicações nem eu a ele, simplesmente sentamos e ele continuou a narrar-me as suas aventuras, e sei que isso irá ainda por muitos anos. Por isso Tex e não outro.

Sílvio Raimundo e seu filho PedroO que Tex representa para si?
Sílvio Raimundo: Ele é a parcela sã do meu Pai, é aquilo que o álcool não conseguiu destruir, é o cara brincalhão, inteligente, sábio, o melhor Amigo, sempre pronto a defender-me, ensinar-me e a quem mais precisasse, a qualquer hora.
Tex é a pessoa que mesmo depois de um dia cansativo de trabalho, fazia-me um desenho. Ele é a pessoa que não morreu, que ainda mora comigo e conta-me histórias, é a pessoa que me apresentou a um mundo maravilhoso e me deu Amigos muito queridos, que já sentaram na minha mesa e comeram comigo e outros tantos, que mesmo sem os conhecer pessoalmente, sei do valor das suas Amizades. É a pessoa que me ensinou línguas para que eu o pudesse conhecer em outras culturas, que me fez conhecer outros Grandes do seu mundo que hoje dividem a sua EstanTEX e também me contam histórias. Tex é a pessoa que o meu Pai escolheu para o substituir na sua partida, é o seu legado para mim e o Pai que eu gostaria de ser para o Piño, o Gigante e o Bravo.

Colecção de Sílvio RaimundoQual o total de revistas de Tex que tem na sua colecção? E qual a mais importante para si?
Sílvio Raimundo: Não sei!
É sério, apesar de parecer brincadeira. Hoje, aqui no Brasil, eu compro regularmente duas séries: Tex mensal e Almanaque Tex. Do mensal, tenho a partir do #311, do Almanaque tenho todos. Na Itália, compro os Almanacchi, Maxi e Texoni, somando-se a estas séries àqueles que só compro quando a história me é muito importante, quer sejam brasileiros ou italianos. Os especiais, os Oscars, os Cartonados, os espanhóis, os gigantes, os coloridos, chego fácil às 400 revistas. Creio que isso faça de mim um coleccionador, apesar de não tão regular.
A BiblioTEXA revista mais importante… Essa é uma difícil tarefa, pois todas o são, principalmente aquelas ofertadas pelos Amigos, mas, como tenho que eleger uma, escolho o #435 do Tex italiano – Il prezzo della vittoria. Esse é o meu primeiro Tex Italiano, presenteado pelo meu Amigo italiano que morou durante muito tempo em Pernambuco, Mario Dalpane, num momento muito difícil da sua vida, pois ele tinha ido a Bologna, enterrar seu filho único de vinte e poucos anos, falecido num acidente automobilístico sem sentido algum e lembrou que me tinha feito uma promessa. Com este “fumetto” eu aprendi a língua da Velha Bota.

Camisa TexColecciona apenas livros ou tudo o que diga respeita à personagem?

Sílvio Raimundo: Não colecciono exactamente tudo, pois não compro todas as séries, mas, se forem lançados pósteres, eu os compro e guardo, se são lançados especiais, também. Se lançarem matérias ou livros, eu corro atrás. É que no Brasil e principalmente, na região onde habito, é muito mais difícil termos acesso a materiais diferentes das BDs, pois até estas, temos dificuldades de encontrar, mas, tudo aquilo que diz respeito a Tex e ao seu mundo interessa-me.

Tex's italianos da MondadoriQual a sua história favorita? E qual o desenhador de Tex que mais aprecia? E o argumentista?
Sílvio Raimundo: Ah, essa é muito difícil de responder, pois para quem como eu, cresceu com o personagem, escolher uma história dentre tantas que me foram contadas é quase um sacrilégio! Permita-me então escolher duas, não apenas por serem icónicas na saga do Ranger, mas por serem também muito importantes para mim:
1 – Kento não Perdoa – Tex mensal #97;
2 – El Muerto – Tex mensal especial de férias #112.
Kento foi o meu primeiro contacto com Tex e o seu mundo, posteriormente, consegui os exemplares que iniciavam a trilogia e gostei mais ainda da história, ela é fantástica. Hoje eu tenho um Oscar Bestseller da Mondadori que contém esta história. Para aqueles que acreditam,em coincidências ele foi o meu primeiro Oscar do Tex.
Edições especiais de TexEl Muerto foi o primeiro exemplar de Tex que eu e o meu Pai compramos juntos. Minha Mãe pediu-nos para comprarmos um frango para o almoço de São João (Festa típica da minha região) e ao voltarmos, passamos na banca e compramos o Tex e o #19 do Ken Parker – Um homem inútil. É interessante, mas, quando falo desse Ken Parker, consigo sentir o cheiro da tinta impressa no papel.
A história desse Tex é magistral, ela nos envolve de uma forma que a lemos de um só fôlego, o Galep deu um show de claro/escuro nas cenas do duelo. Eu sonho com o dia em que a Mondadori a lançar num Cartonato tutto a colori. Esta história merece.
Tex's espanhóisTambém no quesito desenhadores,peço permissão para ir além de apenas um. Adoro o traço do Ticci. Em minha opinião, ele é o responsável pela imagem que o Tex tem hoje. É indiscutível que o Galep é o Pai gráfico de Tex, porém, nas mãos do Ticci, Tex tornou-se outra pessoa, tanto é que muitos do Staff da SBE se inspiraram no seu traço para criar os seus TEXs, um exemplo disso é o Claudio Villa. Sem contar as suas paisagens, minha nossa, aqueles quadros são de tirar o fôlego de tão belos e reais!
O segundo melhor desenhador para mim é o Fusco. O seu traço rápido, rabiscado é muito bonito, o seu Tex é jovial, tem cara de sarcástico e pinta de quem chegou para resolver a confusão com apenas um soco, é um Tex que ocupa muito espaço. Mas estes desenhadores fazem parte da velha guarda, dos novos gosto muito dos irmãos Cestaro e do Civitelli.
Relativo aos argumentistas, gosto muito dos roteiros do Boselli, ele consegue fazer um Tex mais humano e adoro o facto dele geralmente colocar os quatro pards juntos.
O que me entristece é que geralmente os seus textos são desenhados por artistas que não me agradam.

Tex's especiaisO que lhe agrada mais em Tex? E o que lhe agrada menos?
Sílvio Raimundo: O seu carácter e a forma como se dedica ao seu filho Kit é o que mais me agrada. O que me agrada menos é o facto do Tex nunca sofrer nem sequer um arranhão nos seus embates.

Em sua opinião o que faz de Tex o ícone que ele é?
Sílvio Raimundo: Creio que a iconização de Tex se deva ao factor hereditariedade. O personagem surgiu em uma época que poucas possibilidades de diversão havia, trouxe consigo um mundo desconhecido e cativou quem o leu de forma que estes, além de nunca deixarem o personagem, o passaram aos seus filhos, sobrinhos, amigos, enfim, Tex é um membro da família e isso poucos personagens de BDs conseguiram.

Erica Roberta e Pedro, esposa e filho de Sílvio RaimundoPara concluir, como vê o futuro do Ranger?
Sílvio Raimundo: Vejo um futuro maravilhoso, pois o mundo precisa de “pessoas” que façam algo em prol dele, lute para que ele seja mais justo e melhor para os nossos herdeiros. Além do que, esse mesmo mundo ficaria uma tremenda chatice se o Ranger não fosse mais publicado!

Prezado pard Sílvio Raimundo, agradecemos muitíssimo pela entrevista que gentilmente nos concedeu.

(Para aproveitar a extensão completa das imagens acima, clique nas mesmas)

10 Comentários

  1. Sílvio, parabéns pela entrevista. Adorei principalmente a parte em que falas da humanidade do Tex e do fato de ele nunca sofrer arranhões. Isso é exatamente o que também gosto e “disgosto” em Tex.

    Nanda

  2. Pois é Nanda, quando nos tornamos “maduros” buscamos em nossos heróis valores mais condizentes com a realidade. O lado humano do Tex é fascinante e me faz crer no ser humano, mas, a sua invulnerabilidade é por vezes muito chata
    Obrigado por terdes gostado!

    Sílvio

  3. Depoimentos como o do Silvio dão aos autores e editores a sensação do dever cumprido, de objetivos atingidos. Mostram que fazer quadrinhos vale a pena.
    Julio Schneider

    • Olá Julião!

      Obrigado pelas palavras caro Amigo! Enquanto houver paixão no produzir e no ler os nossos gibis, valerá sim à pena!

      Sílvio Raimundo

  4. Eu nunca vi o Silvio pessoalmente, apesar de não estar tão distante de mim (dois dias a cavalo), mas dentro daquilo que deva ser um texiano de valor e levando em conta os papos de vários anos que convivemos através da telinha, ele se acopla muito bem como um sujeito valoroso e se ainda fosse o tempo do Rei Arthur, ele certamente seria uma cavalheiro da corte e talvez o próprio conselheiro do rei.
    Amigo, foi sempre muito bom acompanhar suas boas e más jornadas durante esses anos que passaram e lendo a sua ótima entrevista, posso assegurar que continuas um autêntico cabra-da-peste de grande valor.
    Forte abraço,
    G.G.Carsan

    • Carsan Cabra-Macho!

      Caro Amigo, também achei e continuo achando muito aprazível a sua companhia nessa jornada, vc é um dos bons e grandes Amigos que o Tex me apresntou. Como te falei, setembro se aproxima

      Obrigado pelo seu comentário!

      Sílvio Raimundo

  5. Belíssima entrevista, sem sombra de dúvida. Ela é imensamente agradável de ser lida e nos revela mais do caráter do Tex, do Pai do Sílvio e do próprio Sílvio. Parabéns!
    Gervásio, TexBR
    http://www.texbr.com

    • Grande Gerva!

      Mano, foi bom p’rá danar responder às perguntas do Zeca, sem falar que o ranger nos inspira, não é?
      Valeu pelo seu comentário!

      Sílvio Raimundo

  6. Prezado Sílvio Raimundo, sou amigo do Mario Dalpane desde que ele veio pro Brasil. Entretanto, depois que ele mudou para SP e foi trabalhar na PEIXE, perdi o contato. Faz muitos anos que tento encontrá-lo sem sucesso. Gostaria de saber como ele está. Por acaso vc tem algum contato com ele? Tem algum telefone de contato ou algo assim? Eu tinha um cartão dele com o endereço e telefones da casa da mãe dele em Bologna, mas infelizmente perdi este cartão. Agradeço qualquer informação.

    Obrigado
    Fernando Gallotta
    gallotta@gmail.com

  7. Grande Sílvio,
    aqui estou, meses depois, me comovendo com a sua entrevista, sua história. Um abraço de um amigo que aprendeu a respeitá-lo, sua simplicidade e sua cultura.

    João Guilherme

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